O nosso Observatório Transdisciplinar das Religiões no Recife promove estudos sobre a diversidade religiosa e assessora atividades sobre o diálogo entre tradições espirituais, sempre articulando fóruns civis de Direitos Humanos e comissões religiosas de ecumenismo. Pensamos que as pessoas e instituições religiosas devem se encontrar, não para ficar admirando mutuamente suas crenças, mas para descobrir causas comuns nas quais se envolver, como a justiça socioambiental. Por isso, desde o ano 2000 somos parceiros da Coalición Religiones, Creencias y Espiritualidades en Diálogo con la Sociedad Civil, coletivo de religiosos e estudiosos que tem agido como grupo organizado da sociedade civil, sobretudo junto à Organização dos Estados Americanos (OEA).
Em espaços intergovernamentais como este cresceu a presença de atores que posicionam vozes tradicionalistas de matiz religioso, que se opõem aos avanços modernos dos direitos trabalhistas e ecológicos, que desrespeitam a diversidade sexual e cultural. Confrontando-os, a Coalizão articula religiosos progressistas e estudiosos das religiosidades no continente, para o fortalecimento da democracia e da laicidade do Estado, a defesa da liberdade religiosa e dos Direitos Humanos, começando pela proteção aos grupos vulneráveis – o que deve ser princípio espiritual e humanizante (veja por aqui, a propósito, o relatório “Freedom of religion or belief and Gender Equality”, do Conselho de Direitos Humanos da ONU).
Fruto dessa parceria, o Observatório da UNICAP já se envolveu em projeto de comunicação e também em publicações conjuntas, além de marcar presença em eventos e discussões virtuais promovidas pela Coalizão sobre fés e sociedade nas Américas. Na Assembleia da OEA em 2021 colaboramos online, porém ativamente, na discussão sobre liberdade religiosa. E, agora, o professor Gilbraz Aragão, coordenador do Observatório, foi convidado para compor a delegação de estudiosos das religiões na 52ª Assembleia Geral da OEA e nos eventos paralelos promovidos pela Coalizão em Lima (Peru), de 3 a 6 de outubro de 2022.
No dia 5, das 9 às 13 horas, no Centro de Convenções de Lima, ocorreu a principal atividade do coletivo prevista na Assembleia: o “Diálogo dos Chefes de Delegação, o Secretário Geral da OEA e os Representantes das Organizações da Sociedade Civil“, onde foi apresentada uma Declaração da Coalizão, em vista do aprofundamento das Resoluções sobre Liberdade Religiosa. Propugnamos que esse conceito e legislação não degenerem em apologia do proselitismo das Igrejas e justificação de submissões de gênero e de raça e dos pobres em geral, mas firmem-se como salvaguarda do respeito à diversidade de crenças e convicções – que devem se reconhecer no serviço à Casa Comum e no louvor à Bênção Original, que nos cria e desenvolve na diversidade de sexualidades e culturas, crenças e espiritualidades. Mas, além disso, Gilbraz também participou no “Encontro Ampliado de Coalizões sobre Estratégias Interseccionais de Laicidade na OEA” e no evento público “Liberdade Religiosa e Democracia na América Latina”, que ocorreram durante o dia 4 no Lyz Business Hotel.
O tema da 52ª Assembleia da OEA no Peru foi “Juntos contra a desigualdade e a discriminação”, que reflete os desafios humanistas e democráticos de inclusão em vários níveis, dos empobrecidos e dos marginalizados, sendo que os espaços religiosos promovem respeito à dignidade humana, mas por vezes são também fonte de violência a grupos discriminados em nossas culturas. No âmbito desses fenômenos, o conceito de liberdade religiosa desempenha um papel central no quadro de uma disputa de significado que serve a cada um desses casos: ser um elemento que pode levar à promoção do respeito irrestrito pelo direito de pertencimento, bem como um instrumento político-jurídico para legitimar práticas discriminatórias em nome de uma crença particular excluindo os outros. Por essa razão, é necessário um amplo debate sobre o significado da liberdade religiosa em termos de direitos, em seus sentidos mais fundamentais, como liberdade mesmo, como inclusão e proteção (veja por aqui, pg. 177, como ficou a resolução 2022 da OEA sobre liberdade religiosa).
Enquanto embaixadores discutiam políticas públicas compartilhadas com especialistas e observadores na Assembleia da OEA, que é o mais antigo sistema institucional internacional, com base nos fundamentos da segurança e desenvolvimento integral, democracia e Direitos Humanos, os grupos cristãos fundamentalistas desfilaram pela cidade de Lima (veja mais fotos do evento aqui no Face) com faixas dizendo que “a América é pró-vida: fora OEA”, “a mulher é definida pela biologia e não pela ideologia”, “a OEA é ateia e te quer sem Deus e sem família”. O trabalho da nossa Coalizão no Peru foi um exercício que reuniu vários atores do campo religioso para confrontar essa ideologia teológica reacionária, aprofundando os sentidos de espiritualidade, de vida e de liberdade (veja por aqui a Declaração da Secretaria-Geral da OEA sobre a promoção e proteção da liberdade de religião ou crença, fruto de nossa militância). A caminhada segue!
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