Aconteceu de 10 a 13 de julho na PUC-Minas, em Belo Horizonte, o 30º Congresso Internacional da SOTER, com o tema “Religiões em Reforma: 500 anos depois”. Cerca de seiscentos pesquisadores e estudantes de ciências da religião e de teologias estiveram reunidos para aprofundar a questão da Reforma Protestante, na comemoração dos seus 500 anos, buscando analisar causas e consequências do ideário democrático de “sacerdócio universal dos crentes” e do caráter simbólico dos ritos e mitos cristãos, que foram recuperados por gerações de luteranos e aderentes. O debate envolveu a controvérsia sobre tradicionalismo e progressismo nas religiões e deu relevo à tendência de secularização e/ou pluralização da religiosidade nos tempos modernos.
Para certos cristãos, esse quadro enseja uma volta para o cristianismo “real” dos tempos pré-modernos, porque a modernidade, envolvida pela metanarrativa protestante que laicizou mesmo o catolicismo no Vaticano II, seria uma visão herética da fé cristã, cuja consequência, seja através da teologia liberal ou, por motivos opostos, através do fundamentalismo popular pietista/pentecostal, é a falta de norma e fundamento religioso comum e o niilismo capitalista – que ganha inclusive uma aura espiritual, de substitutivo religioso.
Ao passo que um crescente e ecumênico grupo de seguidores de Jesus defende que a modernidade é fruto autêntico do cristianismo, e não uma espécie de filha bastarda ou órfã, e que precisamos ativar o que restou da antiga imagem metafísica de Deus na cruz de Cristo, o Espírito (“Onde dois ou três estiverem reunidos em minha memória amorosa, estarei no meio deles”), com o objetivo de emular teologias e práticas políticas e simbólicas para além dos fundamentos absolutistas deste mundo: finanças, espetáculo e vigilância. É o caso, então, de articular Igrejas em saída, sempre em reforma, para humanizar o mundo e defender a integridade da Criação.
O protestantismo teria sido um momento necessário, ainda que em negativo, em antítese, como o capitalismo, para atingirmos uma religiosidade “materialista” – e uma sociedade “comunitarista”? Se não, como acham os conservadores e pietistas em todas as Igrejas, devemos recuperar o espiritual pré-moderno e ortodoxo, a “coisa em si”, o ser metafísico, além, que, acolhido nos sacramentos e através de autoridades, humaniza a pessoa e suas relações. Ou, pelo contrário, devemos avançar na apreensão heterodoxa da “coisa em relação”, na experiência de descentramento que encarna o mistério espiritual entre a gente, na luta para cuidar, materialmente, do ambiente e dos outros.
Mas esse debate sobre a Reforma cristã diz respeito igualmente às outras religiões: qual o impacto da modernidade cultural sobre as diversas tradições espirituais? O professor Gilbraz, do nosso Observatório, colaborou então no Congresso nos painéis sobre Religiões em Transformação, que articularam discussões sobre reformas análogas entre e com budistas e umbandistas, judeus e muçulmanos. Além do professor, vários estudantes do grupo de estudo do Observatório das Religiões da UNICAP também participaram do Congresso, como Ana Paula, Thaís, Rafael, Miri e Cícero. Eles colaboraram principalmente nas Sessões Temáticas e especialmente (como se vê nesta foto menor) na do Grupo de Pesquisa que constituímos, com os colegas Roberlei e Cláudio Ribeiro, sobre Espiritualidades, pluralidade e diálogo.
Ao fim e ao cabo, um olhar atento a 1517 fez perceber que houve um contexto histórico, social, político, religioso e teológico que desencadeou a Reforma. Hoje, 500 anos depois, tem-se outro contexto, que leva a repensar estruturas, mentalidades, determinações institucionais e questionam o futuro de cada tradição religiosa, bem como sua incidência na sociedade. Podemos aprender com a história a superar os esquemas reducionistas de tradição sem reforma ou de reforma sem tradição, tanto quanto de adaptação sem verdade ou de verdade sem inculturação. Mas o certo é que ou as religiões mudam com as pessoas, ou as pessoas…
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