CREIO NO ESPÍRITO SANTO

UMA INTERPRETAÇÃO PENTECOSTAL DO CONCÍLIO DE NICÉIA E SEUS EFEITOS

Resumo

O Concílio de Niceia constituiu um divisor de águas para o cristianismo antigo e, posteriormente, para o cristianismo de todos os tempos; as circunstâncias da sua convocação, do seu desenvolvimento e das aplicações das suas deliberações foram complexas e, em algumas direções, jamais inteiramente esclarecidas. O objectivo primário era a definição da natureza de Cristo, que havia assumido uma urgência inusitada em consequência da agudeza da teologia ariana, que substancialmente negava a divindade de Cristo em sentido pleno e corporal; esta controvérsia relativa à relação entre Deus e Cristo continha in nuce uma outra: a da relação entre Deus, Cristo e o Espírito, que não tardou a irromper imediatamente depois. Tratava-se de esclarecer qual era o alcance da afirmação: Creio no Espírito Santo. O artigo pneumatológico era fraco e parecia inserido no Credo mais por homenagem à lex orandi do que por uma elaboração teológica significativa. A fraqueza da reflexão teológica vinha de longe, não obstante a Igreja antiga possuir memória e experiência do sopro pneumático e carismático que caracterizava o cristianismo das origens e o dos séculos II e III. Em suma, diante de uma difusa e frequentemente problemática afirmação experiencial do Espírito, faltava uma sólida reflexão pneumatológica que poderia ter melhor esclarecido tanto o sentido do experienciar o Espírito quanto a dinâmica relacional intratrinitária. As razões desta lacuna são difíceis de identificar, mas poderiam estar ligadas à prudência tanto quanto à suspeita (frequentemente à aversão) em relação à dimensão carismática da fé, que uma reflexão séria sobre o Espírito teria de facto imposto esclarecer, com repercussões eclesiológicas não desprezíveis; em suma: tratava-se (e trata-se) de compreender se ubi Spiritus ibi ecclesia ou o contrário. O facto é que, no decurso da bimilenar vicissitude cristã na história, o dissenso sempre invocou a liberdade do Espírito para justificar o seu anseio. As consequências desta lacuna manifestaram-se ao longo de toda a história do cristianismo até aos nossos tempos, chegando ao paradoxo de que no interior do maior despertar cristão dos tempos modernos (o movimento pentecostal e carismático), nascido sob a égide da afirmação poderosa e pervasiva da experiência do Espírito, tenha surgido desde as origens uma componente declaradamente antitrinitária, negadora do credo niceno-constantinopolitano. E, por isso, então como hoje, a todos os cristãos se recoloca a pergunta: o que estamos confessando quando dizemos Creio no Espírito Santo?