Promovida mundialmente pelo Pontifício Conselho para a Promoção da Unidade dos Cristãos e pelo Conselho Mundial de Igrejas, a Semana de Oração pela Unidade Cristã (SOUC) acontece em períodos diferentes nos dois hemisférios. No hemisfério Sul, o período tradicional para a Semana de Oração pela Unidade Cristã é a semana que antecede a festa de Pentecostes. A SOUC 2025, ao nos perguntar “Crês nisso?” retoma o questionamento que motivou o primeiro Concílio Ecumênico do qual se tem notícias, realizado no ano de 325 d. C., na cidade de Nicéia (atual Iznik, na Turquia). Neste ano, então, comemoramos 1.700 anos do Concílio Ecumênico da Nicéia: venha celebrar conosco! Vamos nos reunir com religiosos de várias igrejas cristãs no campus da UNICAP no Recife, quarta dia 4, às 18h na Capela, e às 19h no Auditório Dom Helder.

Na capela teremos uma celebração ecumênica e, no auditório, após um lanche compartilhado, uma roda de conversa sobre os desafios para o ecumenismo, mediada pelo professor Gilbraz Aragão. Nicéia promoveu a unidade cristã a pedido de Constantino, estabelecendo a data da Páscoa e, contra o arianismo, as doutrinas da divindade plena de Cristo (é da mesma substância de Deus Pai) e da encarnação de Cristo (Jesus é verdadeiramente Deus e verdadeiramente humano). Esse Concílio foi um precedente sobre como resolver controvérsias na Igreja: que lições essa história traz pros esforços de sinodalidade dentro e entre as Igrejas cristãs hoje?
No ano passado, encontro análogo terminou rendendo capítulo no livro Diálogos Plurais, pois a conversa levantou o (não) lugar das mulheres nas Igrejas e mesmo a dificuldade para participação recíproca na eucaristia entre católicos e protestantes. Gilbraz disse que talvez a gente devesse recorrer a uma moça judia para se deixar provocar nas dificuldades eclesiásticas cristãs: normalmente associamos o sagrado ao puro e ao belo, mas ele pode se manifestar pelo outro lado. Basta ver no Cinema da Fundação “A Paixão Segundo G.H.”, um filme brasileiro dirigido por Luiz Fernando Carvalho, adaptado por Melina Dalboni a partir do romance homônimo de Clarice Lispector (judia que viveu aqui na Praça Maciel Pinheiro e foi-se depois pro Rio), com Maria Fernanda Cândido impecável encarnando Clarice (ou G.H., que é qualquer mulher em busca de ser mais).
Então, após a demissão de sua empregada, a protagonista decide limpar o apartamento e se vê horrorizada quando encontra, e mata, uma barata no armário do quartinho onde a menina negra dormia. A barata lembra todos os seres subalternizados socialmente e G.H., ao comê-la, então (sim, ela comunga o bicho!), renuncia à linguagem (dominadora) e, em silêncio, busca uma comunhão mística e existencial com o avesso do mundo, apaixona-se por uma vida maior, com novas relações. Quer dizer, a gente achando difícil incluir as mulheres e praticar a hospitalidade eucarística, celebrar com os irmãos de outras confissões cristãs, quando nosso desafio devia ser virar companheir@ (que compartilha o pão) com os explorados e humilhados dos outros mundos, que invisibilizamos.
E fazer uma missa cósmica como ensaia Matthew Fox e como ansiava Teilhard de Chardin, para quem pão e vinho é muito pouco, porque é toda a matéria do Universo que está se espiritualizando, cristificando pela amorização. Devíamos nos deixar era interpelar pelos antropólogos e neurocientistas que descobrem a nossa fraternidade de consciência (e espiritualidade) com outros bichos e nossa inter-relação até com os fungos embaixo da terra, todo um rizoma vivo que sustenta a vida da gente sobre essa Casa Comum. Pois bem, quais serão os desafios e iluminações que a Semana de Oração vai trazer este ano para a nossa caminhada ecumênica?
Ultimamente saiu uma biografia bonita sobre Teilhard de Chardin, onde o cientista e teólogo declara em que, afinal, acredita: “Se, em consequência de alguma perturbação interior, eu chegasse a perder sucessivamente minha fé em Cristo, minha fé em um Deus pessoal, minha fé no Espírito, parece-me que continuaria acreditando no Mundo. O Mundo (o valor, a infalibilidade e a bondade do Mundo) é, em última instância, a primeira e a única coisa em que acredito. É por essa fé que eu vivo. E é a essa fé que, sinto-o, na hora da morte, além de qualquer dúvida, eu me entregarei”. Então, parece que devemos acreditar junto: se antes se dizia que “fora da Igreja não há salvação” ou “fora de Cristo não há salvação”, hoje devemos declarar que fora do Mundo, da relação e cuidado com o Mundo, nossa Casa e Causa Comum, é que não tem salvação. Claro: quando bem interpretados, Jesus e a Igreja também estão na causa. E mais: se olhamos pro Mundo com desconfiança, como resultado do Pecado Original, então a diversidade espiritual deve ser combatida; enquanto se compreendemos a pluralidade de culturas e religiões como uma Bênção das Origens, então o pluralismo deve ser acolhido com carinho…