MAGIA NEGRA CRESCE EM PERNAMBUCO?!

 

Devil, Wikipedia

Ainda estamos no Congresso da SOTER, discutindo mobilidade religiosa e espiritualidade pós-religiosa, em torno dos dados do censo, quando somos informados de mais um crime associado à religiosidade em Pernambuco. Um menino de nove anos, na Zona Rural de São Domingos, distrito de Brejo da Madre de Deus, no Agreste, que saiu para trabalhar com frete e desapareceu desde o dia 1º, foi encontrado na tarde desta terça (10), com mãos e pés amarrados, calça abaixada e cabeça decepada, ladeado por garrafas de bebidas, ossos, velas e “bonecos de vodu”, em uma estrada do Sítio Olho D’água.

Um casal confessou o crime à polícia e mais três pessoas foram presas como suspeitas – incluindo um “pai de santo”, que teria organizado o “ritual de retorno”, relacionado à “magia negra” (veja aqui e aqui as notícias).

Segundo policiais a criança teria sofrido abuso sexual, antes de ter “o seu pescoço apertado por um torniquete de madeira e corda até a cabeça se separar do corpo”. Aproximadamente 5 mil pessoas se reuniram em frente à delegacia da cidade, na tentativa de linchar os suspeitos. Seis residências dos supostos envolvidas foram invadidas e queimadas por populares, que afirmaram ter encontrado ”fotos de corpos esquartejados”, “imagens de pornografia infantil” e “santos de macumba e catimbó”. (Tudo isso junto?!).

Sete terreiros de Umbanda e até um centro do Vale do Amanhecer, em São Domingos e na vizinha Santa Cruz do Capibaribe, foram invadidos e saqueados pelo povo (veja aqui a galeria de fotos). Compreende-se a revolta pelo crime bárbaro, mas culpabilizar a Umbanda e o Vale do Amanhecer, que não sacrificam nem uma pomba nas suas celebrações, é muito preconceito. Reprovar criminosos/abusadores é uma coisa (e eles existem, também, nas religiões, quaisquer que sejam), mas outra é acusar a religião do outro como desumana. Para conter o clima de comoção pública e caos social, foram enviados à região dois helicópteros da Secretaria de Defesa Social, reforço policial da Companhia Independente de Operações e Sobrevivência na Área de Caatinga, Grupo de Ações Táticas Itinerantes, Companhia Independente de Operações Especiais e da Tropa de Choque. Quase uma operação de guerra, né? Mas quem é mesmo o “inimigo”?

Todo estudioso das religiões conhece um lado sombrio do fato religioso, notadamente quando se busca poder (magia) não com os outros mas às custas de outro e/ou contra um outro (transformado em “bode expiatório”). Religião é para terapeutizar as nossas loucuras humanas, mas sói acontecer do nome dos deuses servirem como travestimento precisamente pra psicose e perversão mais vil. Inclusive essa não é uma versão restrita aos grupos religiosos marginalizados e a casos pessoais, manifestando-se mesmo em grandes religiões – que abençoam solenemente armas e dinheiros, instrumentos de uma “magia” social mais complexa, mas não menos possessiva e predatória.

Também é muito conhecida a associação entre o sagrado, objeto de toda experiência religiosa, e o prazer erótico, que é a primeira pulsão da nossa vida – e, nesses casos sombrios, manifesta-se numa lascívia mórbida e perversa, potencializada e liberada pelo sentimento de poder que um ritual qualquer proporciona. Isso é bem comum e a gente tem estudado nas demonologias por aí. O que chama atenção no Recife e no estado, todavia, é o aparente aumento agora desses fenômenos de crimes conotados sexualmente e executados em rituais.

Em abril passado foram revelados casos de suposto canibalismo religioso de um grupo pseudo-cristão (“seita Cartel”) em Pernambuco e todo ano somos sacudidos no Grande Recife por notícias de mortes relacionadas (muito nebulosamente) à “magia negra” e vinculadas a pessoas de terreiros afro-brasileiros ou movimentos neopagãos (grupos que têm pouca institucionalização para defender os seus autênticos representantes e as suas próprias crenças). No último semestre, o Fórum Inter-religioso do nosso Mestrado em Ciências da Religião da UNICAP discutiu o tema quente do Sacrifício nas Religiões, mas preocupado com a questão da administração e interpretação da oferenda ritual de animais. Seria o caso agora de uma nova edição, pra debater justamente sobre o sacrifício de gente na religião?! “Minha Nossa”!!!

 

Gilbraz.
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O que você pensa: Esses crimes são mesmo motivados por religião? O que está acontecendo em Pernambuco, para provocar o aumento de assassinatos ritualizados? E por que são associados à magia negra?!

4 comentários Adicione o seu

  1. Marcelo Barros disse:

    Sobre os feitiços e ritos secretos.
    Toda violência choca, mas o assassinato de crianças inocentes como, há poucos dias, ocorreu no interior de Pernambuco, quando um menino de nove anos foi assassinado, provoca uma justa revolta na sociedade. Ao procurar o que está por trás disso, uma das suspeitas comuns é a de sacrifícios satânicos e rituais de religiões negras. Sacerdotes de cultos afro são perseguidos. Na semana passada, em Brejo da Madre Deus, incendiaram sedes dessas comunidades. Sempre na história, preconceitos se voltaram contra minorias pobres e desarmadas. Na Idade Média, diante de qualquer tragédia ou epidemia, mulheres eram acusadas de bruxarias e queimadas. Hoje, no Brasil, as vítimas mais frequentes do preconceito são os cultos afrodescendentes. Há mais de 20 anos, como teólogo e padre, frequento cultos afro-descendentes. Sou amigo de pais e mães de santo. Aprendi que nenhuma religião de origem afro tem rituais violentos, ou aceitam sacrifícios humanos. Essas tradições espirituais não creem em um espírito do mal que a tradição judaica e cristã chamou de demônio. Nunca lhe prestariam culto. Nos tempos da escravidão, um escravo ameaçava com um despacho a um senhor que quisesse abusar de sua filha menor. Esse ritual era a única arma que lhe restava. Por isso, esses despachos de Vodu (não de Candomblé) eram justos. Hoje, Mãe Stella de Oxossi, yalorixá do Opô Afonjá, em Salvador, ensina: “Uma pessoa que quer fazer mal a outra corre o risco desse mal se voltar contra si mesma”. Religiões negras têm segredos, como no Cristianismo primitivo, quando os sacramentos eram chamados de mistérios. Diante de crimes como esse, devemos nos revoltar sim e condenar tal violência. Mas, não confundir distúrbios mentais com expressões religiosas. Quem é espiritual defende a vida de todos, principalmente de crianças inocentes. E luta por uma sociedade mais justa e igualitária. Deus é amor. Só pode ser encontrado, quando nos relacionamos amorosamente.

    Marcelo Barros, monge beneditino, assessor nacional das comunidades de base e de movimentos populares, membro do Observatório das Religiões do nosso Mestrado em Ciências da Religião da UNICAP, membro do Comitê da Diversidade Religiosa do Governo Federal, será agraciado no próximo 8 de agosto, em Brasília, “pelo seu trabalho ecumênico durante 40 anos”, com a Comenda da Ordem do Mérito Judiciário (TST).

  2. Seu Amor disse:

    Bom dia,

    Aproveito para dizer que achei bem legal o assunto.

  3. Altair José disse:

    Eu não sou intolerante, não tenho preconceito nenhum com religiões de matrizes africanas mas é notório que práticas macabras envolvendo sacrifícios de crianças vem de pessoas que tem algum vínculo com seitas não -monoteístas. É óbvio que essas seitas não nada a com o candomblé! Mas quando se chama de “culto afro” o que se distingue? Nada! Sei que o cristianismo fundamentalista tem fomentado esse ódio com todo tipo de religião que é de inspiração afro (Candomblé, Umbanda, Jurema, Catimbó, Tambores de Minas, e de novas doutrinas tipo Vale do Amanhecer e Santo Daime).
    Como deísta, não gosto de religião, vejo que todas tem um viés sectário, dogmático e ritualístico, mesmo afirmando que não tem nada disso.

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