Boletim Unicap

Pesquisador do PPGCR faz pós-doutorado sobre conservadorismo e progressismo católicos brasileiros

As transversalidades entre o progressismo e o conservadorismo católicos brasileiros durante o Concílio Vaticano II serão o tema de pesquisa a ser desenvolvida pelo Prof. Dr. Newton Darwin de Andrade Cabral, do Programa de Pós-graduação em Ciências da Religião e da graduação de Licenciatura em História da Unicap. Ele vai abordar os posicionamentos e atuações de dois bispos católicos que foram ícones dessas correntes distintas de pensamento: Dom Helder Camara e Dom Geraldo de Proença Sigaud. Além de formas antagônicas de atuação, uma coincidência destacada pelo Prof. Newton chama a atenção: os dois bispos nasceram em 1909 e morreram em 1999.

Em entrevista especial para o Boletim Unicap, o Prof. Newton explicou que fará pesquisas documentais na Cúria Arquidiocesana de Diamantina (MG). O estágio de pós-doutoramento terá a supervisão do Prof. Dr. Rodrigo Coppe Caldeira, do Programa de Pós-graduação em Ciências da Religião da PUC-MG. Ele é autor do livro Os Baluartes da Tradição: o conservadorismo católico brasileiro no Concílio Vaticano II, que fará parte da bibliografia consultada. As treze cartas conciliares escritas por Dom Helder, as próprias sessões conciliares e as ações nos intervalos entre uma sessão e outra também serão objeto de análise. Newton planeja fazer também, entre os próximos meses de setembro e outubro, um workshop na PUC-MG para apresentar os resultados dos estudos. A região escolhida não foi ao acaso. Dom Sigaud foi bispo de Jacarezinho (PR), mas atuou durante muitos anos como Arcebispo da Arquidiocese de Diamantina (MG). Confira abaixo os principais trechos da entrevista.

Boletim Unicap – Como o senhor vai estruturar esse estudo a partir de pensamentos distintos de dois “baluartes” do catolicismo brasileiro? 

Dom Sigaud

Newton Darwin – Eu conheço muita coisa do pensamento de Dom Helder e o meu supervisor do estágio de pós-doutoramento conhece bastante do pensamento de Dom Geraldo Sigaud. A gente vai estabelecer essas transversalidades, aproximações, distanciamentos, os principais temas abordados durante o Concílio, nas articulações que eles tentavam fazer durante o Concílio, os grupos fora do Concílio mas que se aglutinavam em torno dos grandes temas conciliares. E tanto Dom Helder quanto Dom Geraldo participavam de grupos numa linha e na outra. Eles eram representantes de linhas bastante distintas dentro do catolicismo. Mas é interessante saber que ambos tinham uma preocupação social muito grande, partindo de metodologias diferentes. Acho que Dom Helder na linha do que fazer para reverter situações e conscientizando as pessoas.

Talvez Dom Sigaud investisse menos na linha da conscientização. No entanto, não deixou de investir em múltiplas atividades de promoção social. Interessante também é saber que, além de ele ser Arcebispo em Minas Gerais, ele era Arcebispo numa cidade que era um dos polos do Vale do Jequitinhonha, tão pobre quanto o Nordeste brasileiro. Esse aspecto aproxima eles dois que foram dois grandes Arcebispos atuantes no Concílio Vaticano II, em linhas distintas, que a gente pode se identificar mais com uma do que com outra. No entanto, ambos foram aguerridos na defesa daquilo que eles acreditavam.

B.U – Essa distinção marcou algum embate direto entre eles ou apenas na questão metodológica?

N.D – Houve embates entre os dois pessoalmente numa época em que havia acusações sobre Dom Helder de que ele seria comunista. Dom Sigaud, junto com o então Bispo da cidade de Campos, no Norte Fluminense, chamado Antônio de Castro Mayer, os dois faziam parte desse grupo que dizia que Dom Helder era comunista. Lembro inclusive de uma ocasião em que uma jornalista perguntou a Dom Helder o que ele achava de o fato de dois bispos, tão bispos quanto ele, tão católicos quanto ele, tão romanos quanto ele, chamarem-no de comunista. Ele respondeu que aquilo que ele queria para a sociedade civil valia também para a Igreja: o desejo que ele tinha de que as pessoas pudessem pensar o que quisessem pensar e mais ainda, manifestar o seu pensamento.

Dom Helder

Aquilo que não existia na sociedade civil naquele momento e ele lutava para que isso existisse, ele queria também que existisse também na Igreja Católica, portanto ele disse: ‘Eu reconheço o direito desses dois irmãos meus do episcopado pensarem de mim o que quiserem pensar e falarem, expressarem que pensam determinadas coisas a respeito de mim’. Havia de fato embates entre os dois, mas não abertamente no Concílio, no Concílio eram linhas de pensamento diversificadas.

B.U – Dom Helder poderia ser identificado com causas tidas como alinhas à esquerda. E quanto a Sigaud, que tipo de ‘cartaz’ ele empunhava?

N.D – Ele se distinguiu muito por uma luta anticomunista. A bandeira do anticomunismo é um dos elementos muito fortes na vida desse Arcebispo da cidade de Diamantina.

B.U – Essa pesquisa que o senhor vai desenvolver tem ligação com o que senhor tenha pesquisado no seu mestrado ou no seu doutorado?

N.D -Tem, de alguma forma, com o meu doutorado sim porque na minha tese de doutorado eu estudei experiências alternativas de formação para os ministérios ordenados ou não dentro da Igreja Católica. E essas experiências existiram durante e com o respaldo de Dom Helder aqui no Regional Nordeste 2 da Conferência dos Bispos do Brasil (CNBB). Elas encontraram sua razão de ser em um determinado modelo de Igreja e nesse modelo de Igreja Dom Helder era um dos baluartes.

print
Compartilhe:

Deixe um comentário