Boletim Unicap

Católica celebra missa em memória da professora Amparo Caridade

A Universidade Católica de Pernambuco celebrou nesta segunda-feira (05) missa de sétimo dia em memória da professora Amparo Caridade. Ela faleceu no último dia 30 de junho, aos 68 anos, em decorrência de complicações causadas por um câncer no pâncreas. A missa foi presidida pelo Reitor da Unicap, Padre Pedro Rubens.
 
Durante a homilia, Padre Pedro lembrou que caridade e amparo são sinais da presença de Deus. “O que é a misericórdia de Deus senão a sua extrema caridade pelos mais pobres e miseráveis? O que é a piedade senão o amparo que todos buscam em Deus(…)?”, explicou o celebrante.
Em outro trecho, ele lembra que a professora Amparo se entregou confiante à vida além da morte, experimentando uma cura interior, mais profunda que qualquer cura física.
Veja na íntegra o texto da Homilia:
 
Amparo Caridade:
Testamento de amor para quem quer mais da vida
Nossa colega de trabalho, amiga e familiar encontrou o “amparo” no amor
de Deus que é pura “caridade”. Amparo Caridade entrou na vida amparada
no amor de seus pais; saiu dessa vida, amparada pelo amor de familiares e
amigos, colhendo o que plantou, multiplicando ainda mais a dádiva do seu
próprio viver. Deixou o testamento de uma história de paixão por tudo o que
fazia e carinho pelos que amava. Gostava muito de escrever e o fazia com
alma, inclusive para não perder a intensidade do vivido ou por não conter a
força de seus sentimentos. Nem mesmo diante da morte anunciada, deixou-
se abater por esses grandes desejos e paixões. Assim, espreitou a morte,
vencendo-a, antes de ela ser consumada, pelo desejo maior de vida: “quero
muito mais”, repetiu em seu testamento intitulado “Viver”, de 20 de junho, 12
dias depois do internamento. Esse desejo de viver atravessou a doença, o
tempo, cada um de nós e ganhou asas, primeiro na poética de suas palavras,
depois na imensidão do amor infinito de Deus.
Repetimos no salmo: “Misericórdia e piedade é o Senhor”. Mas o que é
a misericórdia de Deus senão a sua extrema caridade pelos mais pobres
e miseráveis? O que é a piedade senão o amparo que todos buscam em
Deus, para além de suas próprias forças? Assim, poderíamos ter rezado,
simplesmente: “Caridade e amparo são sinais da presença de Deus”.
No evangelho de hoje, que não foi escolhido especialmente para essa ocasião,
mas é proposto pela Igreja Católica para as comunidades cristãs do mundo
inteiro, vem ao nosso encontro com dois episódios entrecruzados, ambos
ligados a pessoas que buscaram a Jesus em momentos de aflição e fé: o
primeiro para fazer reviver sua filha recém-falecida; a segunda, para curar sua
doença. Dois testemunhos de fé na vida para além de qualquer evidência.
O primeiro testemunho de fé na vida foi de um chefe que veio ao encontro
de Jesus e disse: “Minha filha acaba de morrer. Mas, vem, impõe tua mão
sobre ela e ela viverá”. O segundo testemunho foi a de uma mulher que sofria
de hemorragia há doze anos que veio e apenas tocou na barra do manto
de Jesus, dizendo: “Se eu conseguir ao menos tocar no manto dele, ficarei
curada”. E as duas pessoas foram atendidas: uma foi curada e a filha do outro
Mas o que isso toca a nossa vida ou a situação de Amparo: ela não foi curada,
O testamento de Amparo Caridade responde a essas questões, de outra forma.
Primeiro, ela atesta que foi “curada” de várias formas e até mesmo,
abençoando a doença que a transformou: “Bendita doença que me possibilitou
essa revolução”. Amparo expressa, com várias palavras, com diversas
metáforas, uma experiência nova que deu um olhar totalmente novo diante
da própria vida e de todas as coisas, desde a cidade até a própria doença: “A
luz tomou conta e se apossou da treva, passou da treva para a luz. Até ali
desconhecia aquela força de beleza encantadoramente nova Devia ser um
êxtase”. Essa cura interior, essa forma de êxtase, é mais intensa e profunda
do que qualquer curativo físico: “Longe de qualquer conceito, ou pensamento.
Era simplesmente Amparo. Atravessado por algo intenso, desconhecido.
Falando de “eternidade”, Amparo responde à nossa segunda pergunta:
Por que ela não voltou à vida, do jeito da menina curada por Jesus?
Simplesmente, porque foi diferente, como ela própria fez a experiência e a
manifestou: “Não quero mais ser a mesma; não posso mais ser a mesma”.
Ela não quer e nem pode voltar mais à vida de antes porque se tornou outra,
sem deixar de ser mais plenamente ela mesma: “Outra Amparo busca agora
dimensões ainda não sentidas… não percebidas”. “Outra Amparo se aninha
num viver cuja busca de dimensões ainda não foram sentidas”; “outra Amparo
se aninha no meu existir.” A imagem do “ninho” como casa e do “aninhar-se”
como atitude reflete esse novo momento, novo “nascimento” e nos remete ao
mundo dos passarinhos e das aves de arribação. Isso faz pensar: Amparo
precisava dar voos mais altos; precisava voar, sem fronteiras, para além
dos limites, muito além de seu próprio corpo, do tempo vivido e dos espaços
até então ocupados. Amparo precisava de outras dimensões da liberdade.
Por isso, ela não pode mais ser a mesma e, com razão e paixão profetizou
seu desejo mais profundo: “Quero muito mais”. Mas, afinal, em que consiste
esse “muito mais” da vida depois da morte? Ela mesma nos responde: “Quero
muito mais… Invadida, envolvida, tomada pela força da vida entreguei-me”.
Entrega total, eis a forma como ela abraçou a morte, apostando nesse desejo
de quem quer viver muito mais, isto é, viver para além da morte. Porém, não
queria nem podia mais ser a mesma. A “visão” ou experiência que ela teve
da vida para além da morte fica como um belo testamento de fé, para além
daquilo que os nossos olhos, saudosos e em lágrimas, podem enxergar.
Os olhos dela também precisaram mudar o foco: “Meus olhos sentiam.
Acostumados ao ordinário, agora querem mais, querem intensidade, beleza
sem ponto final. Delas – beleza e intensidade – não quero mais me perder”.
Assim entregou-se confiante, não à morte, mas a vida para além da morte,
ao viver que nos ultrapassa e nos arrebata. Por isso, ela bem poderia, diante
da cura interior que experimentou, escutar do próprio Jesus: “Coragem,
filha! A tua fé na vida te salvou”. Nós também podemos escutar de Jesus
algo semelhante ao que ele disse à multidão alvoroçada diante da morte
daquela filha do chefe: “A menina Amparo não morreu, mas está dormindo…”
Amparo não morreu, está adormecida, mas acordará apenas diante daqueles
que têm a mesma fé na vida que ela testemunhou. A menina Amparo não
morreu, ressuscitou na capacidade de sonhar e de brincar com as palavras.
Amparo apenas dormiu para despertar em nós sentimentos de amor à vida
através de sua poesia, de sua existência e, enfim, de seu desejo de querer
Amparo: rogai por nós. Amém!
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