Pró-reitora Acadêmica participa do Fórum Ipea/Socicom na Fundaj
|A Pró-reitora Acadêmica da Universidade Católica de Pernambuco, Aline Grego, participou sexta-feira (10), na Fundação Joaquim Nabuco, do Fórum Panorama Brasileiro das Indústrias Criativas da Era Analógica à Idade Digital, uma promoção conjunta do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea); Federação Nacional das Associações de Comunicação (Socicom) e Assessoria de Comunicação Social da Fundação Joaquim Nabuco.
A mesa da sessão de abertura foi composta pelo assessor-chefe de Comunicação do Ipea, Daniel Castro; pelo presidente da (Socicom), José Marques de Melo; e pelo chefe da Assessoria de Comunicação Social da Fundação Joaquim Nabuco, Marcelo Mário Mello, na ocasião representando o presidente da Fundaj, Fernando Lyra.
Marcelo Mello deu as boas-vindas aos presentes, em nome do presidente da Fundaj, ausente por motivo de saúde. Ele louvou a possibilidade desse evento na medida em que a Fundação Joaquim Nabuco já tem uma história de colocar como objeto dos seus seminários, dos seus trabalhos a questão da comunicação. A exemplo do seminário sobre a imprensa brasileira que vai gerar um livro, inclusive.
Já é a segunda oportunidade de trabalho junto com o Ipea, que realizou aqui o curso de economia para jornalistas e também a oportunidade de trabalhar, de nos aproximarmos da Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação, que realizará seu encontro anual aqui na Universidade Católica de Pernambuco, em 2011. A Fundação vai se integrar no Intercom.
“As necessidades comunicativas da população, do ponto de vista da cidadania e da democratização da comunicação, mesmo antes do desenvolvimento das novas técnicas das indústrias criativas, já colocam um desafio. Um desafio pedagógico também, tem o desafio profissional. Então, são vários desafios que são colocados pelo desenvolvimento das comunicações. A gente colabora em todos os sentidos, na dimensão pedagógica, da cidadania e a dimensão técnica profissional. O cruzamento desses conhecimentos todos, sem dúvida, vai colaborar para o aprimoramento dessa área importante na vida social.” Com essas palavras Marcelo Mello deu as boas-vindas aos participantes do Fórum.
O assessor-chefe de Comunicação do Ipea, Daniel Castro, representando o presidente do Ipea pontuou o fato histórico que o Ipea está completando 46 anos e nunca fez nada de fôlego na área de comunicação. O Ipea tem estudos de ponta na área de comunicações, mas não na área de comunicação. Então essa parceria com o Socicom, por meio do professor José Marques de Melo e de todas as pessoas envolvidas, que não são poucas. O Ipea acabou de fazer uma chamada pública para tornar possível a publicação do Panorama Brasileiro da Comunicação, que deve ser lançado nacionalmente em novembro e internacionalmente dia 1º de dezembro. É a primeira vez que o Ipea faz algo neste sentido, com o valor financeiro relevante, com envolvimento também relevante e com participação de gente importante da área econômica do Ipea e da Socicom.
“Então é desse aspecto que a gente abre o primeiro Fórum, serão quatro, e eles seguirão as quatro áreas dessa publicação. Então todos vocês que estão aqui farão parte dessa publicação, porque a gente vai registrar esse debate também nela e a participação de vocês é fundamental. Teremos um bom debate pela frente. O próximo vai ser em São Paulo, depois Rio de Janeiro e também Brasília. Por fim, quero registrar que o estado de Pernambuco tem uma primazia na área intelectual jornalística e tem uma grande contribuição neste país, por meio de grandes jornalistas que aqui nasceram e por aqui passaram. Então estamos no lugar ideal e com as pessoas certas para fazer esse debate”, explicou Daniel Castro.
O presidente da Socicom, José Marques de Melo, começou explicando o que significa a sigla da entidade. É a Federação Brasileira de Associações Científicas e Sociedades Acadêmicas de Comunicação. Uma tentativa de organizar a área acadêmica de comunicação no Brasil. Ainda segundo o professor José Marques de Melo, a comunicação é um campo novo do sistema natural de ciência e tecnologia, apesar de ser um dos campos mais antigos da pesquisa em ciências humanas. A pesquisa sobre jornalismo no Brasil existe há uns 150 anos. Pernambuco tem um papel fundamental no desenvolvimento da pesquisa brasileira sobre imprensa e jornalismo e depois sobre comunicação.
“A Socicom abriga hoje cerca de 15 sociedades científicas brasileiras. Nós temos duas entidades principais que são a Intercom, que é a principal entidade nacional, cujos congressos, hoje, mobilizam cerca de cinco mil pessoas e que o próximo (em setembro de 2011) será aqui no Recife, comemorativo de outro evento, que são os 50 anos de fundação do curso de Jornalismo da Universidade Católica de Pernambuco. A outra entidade maior, mas não tão grande quanto a Intercom é a Compós, que reúne os programas de pós-graduação”, informa Marques de Melo.
Continuando, o presidente da Socicom disse que a área de comunicação foi se desenvolvendo com muita intensidade e criando associações de pesquisadores em cinema, jornalismo, propaganda, relações públicas, audiovisual etc. Só que do ponto de vista de participação do bolo orçamentário nacional, a área de comunicação ainda vive de migalhas. “O sistema científico brasileiro, em particular, é marcado por algumas tradições: manda quem pode, obedece quem tem juízo. Uma máxima nordestina que vigora também no mundo acadêmico. Quem já está estabelecido, como as ciências tradicionais que repartem o bolo orçamentário com muita intensidade”, enfatiza Marques de Melo.
“A área de comunicação só foi admitida recentemente no Sistema Nacional de Ciência e Tecnologia, porque durante muitos anos ela foi um apêndice da sociologia. Nós conseguimos finalmente entrar no Sistema Nacional de Ciência e Tecnologia depois de muita guerra e batalha e eu estive um pouco presente neste panorama. Para conseguir que a área de comunicação social fosse reconhecida, eu tive que entrar no conselho deliberativo do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico), que é quem toma essas decisões. Foi exatamente nessa instância mais graduada que eu consegui convencer os médicos, engenheiros, sociólogos e historiadores que comunicação era uma grande área do conhecimento e, nesse momento, saímos da rubrica da sociologia e entramos então como comunicação. Só que nós somos ainda uma área marginal, saímos das ciências humanas para as ciências sociais aplicadas. Somos uma área extremamente complexa, porque comunicação não é só ciência, não é só técnica, não é só arte. É uma área do conhecimento que envolve arte, técnica e ciência. A ciência talvez seja o filão menor. Como é uma área completa, ela precisa ter um tratamento diferenciado. O volume de pesquisa que a gente realiza neste país nos dá direito de pleitear isto. Foi com esse objetivo que nós fundamos a Socicom”, explicou o presidente da entidade.
“Só para se ter uma ideia, no CNPq, nós (área de comunicação) só temos 100 bolsas de pesquisa. O que é um absurdo para uma área que tem mais de mil cursos no país, uma população de mais de 25 mil estudantes, por ano, e quase cinco mil professores. Por esse motivo, fizemos uma proposta de parceria entre o Socicom e o Ipea de produzirmos aqui no Brasil algo típico de outros países, chamados desenvolvidos, um mapeamento da área de comunicação do Brasil, que é o Panorama Brasileiro de Comunicação”, finalizou o professor José Marques de Melo.
Indústrias Criativas: política, cultura e economia
Após a abertura do Fórum, foi realizada a mesa Indústrias Criativas: política, cultura e economia, coordenada pelo chefe da Assessoria de Comunicação Social da Fundaj, Marcelo Mello, e teve como expositores o presidente da Socicom, professor José Marques de Melo, e a pesquisadora da Universidade Estadual Paulista – Unesp, professora Anita Simis. O coordenador dos trabalhos passou a palavra para o pesquisador Marques de Melo desenvolver o tema “Indústrias criativas: o dilema brasileiro para a integração massiva popular”.
A apresentação começou com uma conceituação da sociedade midiática e, em seguida, uma análise dela no contexto brasileiro. Para José Marques de Melo, a sociedade midiática caracteriza-se pela prevalência das indústrias criativas no conjunto das atividades de produção dos bens simbólicos e se configuram dando sentido a sua identidade cultural. Ainda segundo Melo, o principal indicador do desenvolvimento da indústria midiática é, sem dúvida, o fluxo dos investimentos em publicidade. Quanto maior for a capacidade dos anunciantes para comprarem espaço nos jornais, no rádio, na televisão ou na internet, mais recursos terão os empresários do ramo para manter seus veículos, gerar empregos para os jornalistas e outros profissionais e para melhorar os produtos que difundem.
“Neste âmbito, a América Latina demonstra tendência regressiva, lamentavelmente. Apesar das recentes aplicações feitas no setor, o continente é o que menos investe em publicidade neste início do século XXI. A liderança é da América do Norte, que investe 44,2% do bolo publicitário mundial, seguido da Europa com 27,4%, da Ásia com 20,6%. Na retaguarda, encontram-se a África e o Oriente Médio com 4% e a América Latina com 3,8%. A lanterninha dos investimentos publicitários. No panorama latino-americano, apenas o Brasil e o México demonstram sinais de vitalidade. São os únicos países dessa região sociocultural incluídos no Advertising Expenditure Forecasts (previsões de despesas publicitárias) realizada por uma entidade alemã. A situação brasileira é conjunturalmente confortável, aplicando 9,2 bilhões de dólares por ano, o Brasil figura em oitavo lugar no volume de investimentos publicitários, depois da China, da Itália, da França, da Alemanha, da Inglaterra, do Japão e dos Estados Unidos. Mas, quando é feita a co-relação entre a verba publicitária e o produto nacional bruto, o Brasil pula para a segunda posição, precedido tão somente pelos Estados Unidos”, esclarece Marques de Melo.
Analisando a sociedade midiática no contexto brasileiro, o pesquisador disse que a distribuição do bolo publicitário é feita de modo paradoxal, segundo diferentes meios existentes no território nacional. Enquanto a indústria audiovisual, televisão e rádio, concentra 2/3 dos recursos; a mídia impressa, jornais e revistas, absorvem 1/5, restando uma quantia inexpressiva para os veículos emergentes como a internet e migalhas para os bolsões marginais, chamados de “folkmedia”.
Dando continuidade, professor Melo apresentou algumas questões do ponto de vista histórico. A polarização no Brasil se deu por dois sistemas, o massivo e o popular. O desafio da interação entre os dois sistemas confere singularidade à geografia comunicacional brasileira, por causa da natureza continental e a topografia acidentada do espaço brasileiro inibiu durante vários séculos a interiorização dos fluxos comunicacionais. Dessa forma, foi inevitável a constituição de culturas regionais unificadas pelo código em vista da língua portuguesa, mas diferenciadas pelos usos de costumes locais.
Para neutralizar os ruídos causados pelos confrontos linguísticos entre os nativos aculturados e os portugueses, a coroa lusitana determinava, tardiamente, a obrigatoriedade da língua portuguesa nas relações sociais. Marquês de Pombal impõe a língua portuguesa em território nacional. Esse processo desencadeia tensões acarretando a produção de idiomas do império que incorpora palavras ou expressões da língua americana. O resultado é a constituição de um código de comunicação oral empregado pelos contingentes subalternos que se distancia do código utilizado pelas elites.
“O diagnóstico incide mais complexidade quando constatamos que este espaço brasileiro, com sua natureza continental e sua geografia acidentada, inibia durante vários séculos a interiorização dos fluxos comunicacionais. Estes privilegiavam a via marítima, principalmente em direção da corte portuguesa. Se comunicava mais com Lisboa, Recife-Lisboa, Santos-Lisboa, Salvador-Lisboa, do que Santos com Recife, Recife com Salvador e Salvador com as outras áreas do litoral. Foi inevitável, portanto, a germinação de padrões culturais diferenciados, de região para região, amalgamados tão somente pelo código linguístico imposto pelo colonizador, mas diferenciados pelos usos e costumes locais. Esse arquipélago cultural permaneceu praticamente imutável até o século XX, quando foram utilizadas as comunicações por via fluvial, ou construídas as rodovias, ferrovias e desenvolvidas as aerovias. Que removeram as barreiras que obstaculizavam a circulação de mercadorias ou de bens simbólicos”, destacou José Marques.
Ainda em sua explanação, o pesquisador abordou as questões das políticas públicas. Durante dois séculos, o comportamento do estado brasileiro manteve-se opaco em relação às políticas públicas de comunicação. Em termos constitucionais, a única política transparente durante o império à república foi o controle da informação. A tendência dominante pautou-se muito mais pelo espírito depressivo do que pelo incentivo à comunicação democrática. Com a Constituição de 1988, os legisladores brasileiros enfrentaram com determinação o desafio da sociedade midiática, dedicando um capítulo exclusivo da carta magna. Sob o título genérico da comunicação social, nos artigos 220 e 224 assimilam, em grande parte, as aspirações democráticas da sociedade civil. “Mas passados 20 anos ou mais, somos obrigados a constatar que poucos avanços foram contabilizados. Se obtivemos garantias constitucionais para comunicar democraticamente, faltam-nos ainda instrumentos legais. Temos evidentemente uma grande conquista que merece reconhecimento. Nunca vivemos em toda nossa trajetória republicana conjuntura mais rica em termos de liberdade de imprensa”, explica o pesquisador.
Finalizando, professor Marques de Melo expõe que neste momento em que o país demonstra pujança democrática e altivez cultural torna-se inevitável e inadiável a formulação de políticas públicas de comunicação contemplando as demandas do século XXI.
Em seguida, o coordenador da mesa, Marcelo Mello, concedeu a palavra para a pesquisadora da Universidade Estadual Paulista – Unesp, professora Anita Simis. Ela começou a explanação dizendo que estava grata por trabalhar no projeto do Panorama Brasileiro da Comunicação, perspectivas do Século XXI. A temática que a pesquisadora atua é cinema, a parte da política cinematográfica, abordando como o estado conectado pensa a política cultural. Professora Anita falou do desmanche dessa área realizado pelo governo do presidente Collor.
“Desmanche esse, que significou dissolução de diversos órgãos como o Ministério da Cultura, que significava absurdamente apenas 10% do orçamento da União; a Fundação do Cinema Brasileiro que, além de realizar os festivais e conceder prêmios, desenvolvia pesquisa, a conservação dos filmes e a formação profissional; o Concine que era um órgão que regulamentava a atividade de cinema, desde 1936, inclusive um órgão que eu tive a oportunidade de fazer uma pesquisa mais aprofundada, e a Embrafilme, agência de produção e distribuição de filmes criada na época do regime militar”, explicou Anita Simis.
Segundo a pesquisadora, o cinema brasileiro de 1908 a 1913 teve uma produção de 963 filmes. Neste momento, o Brasil foi um país produtor, entre outros. Após a 1ª Guerra Mundial houve a hegemonia do cinema norte-americano no mundo. Atualmente, o país voltou a produzir cinema, muito, por conta da persistência dos cineastas.
“Este projeto (Panorama Brasileiro da Comunicação, perspectivas do Século XXI) é muito importante porque nós precisamos ter políticas para a questão do audiovisual. Como no caso de um dos subprojetos, o Indústria Criativa que traz a questão da convergência da informática, telecomunicações e entre linguagens de áudio, visual e da escrita”, finalizou a professora Simis.
Panorama das Indústrias Pioneiras: da imprensa à radiodifusão
A terceira mesa do Fórum Ipea/Socicom foi coordenada pelo representante do Sindicato dos Jornalistas de Pernambuco, jornalista Osnaldo Morais, e teve como palestrantes a presidente da Associação Brasileira de Pesquisadores de História da Comunicação, Marialva Barbosa, e a Pró-reitora Acadêmica da Universidade Católica de Pernambuco, Aline Grego.
Marialva Barbosa começou falando que o lugar do espaço social e das barreiras de uma dada geografia da comunicação, abordada pelo professor José Marques de Melo em sua participação, existe inúmeros “pré-conceitos” históricos e uma visão “engessada” dos processos comunicacionais e que são reproduzidos nas falas das pessoas. “Se a gente considerar que tudo que do passado chega até o presente, apenas aquilo que é localizado no passado. Causa também um pouco ou muito estranhamento, a forma como a gente considera, e a gente, eu estou dizendo, nós mesmos enquanto pesquisadores, a história do nosso lugar de fala, das nossas práticas comunicacionais’, explica a professora Marialva.
“Noventa por cento dos cursos de graduação em comunicação, hoje, não têm mais disciplina de história dos meios”, explica a pesquisadora. Há um desprezo enorme pelo lugar da história. Eu costumo dizer, e não é brincadeira, talvez seja exatamente pela enorme dimensão comunicacional da história, ou seja, a história é comunicação. São os restos do passado que chegam até o presente, que são objetos do estudo da comunicação e do historiador. Portanto, são atos comunicacionais de homens que viveram nesses tempos, que a gente pode chamar de tempos idos, que são objetos dos estudos do historiador. Portanto, o historiador estuda processos comunicacionais”, defini a pesquisadora.
“Nós (comunicadores), ao contrário, ao invés de visualizarmos essa perspectiva, retiramos o olhar histórico do nosso campo de conhecimento. A meu juízo não é possível fazer diagnóstico, panorama de nada, se a gente não tem a perspectiva da especificidade da nossa própria construção, de uma especificidade que se constrói na longuíssima duração”, contrapõe Marialva.
Sobre o panorama das indústrias pioneiras, a palestrante chamou a atenção para a questão do pioneirismo. É preciso demarcar o ponto zero da história, um ponto emblemático, que se sobressaia aos demais, para se contar uma história. Quando se fala das indústrias pioneiras, dos meios impressos, se fala de um mundo da oralidade, que se está imerso e que muitos têm vergonha e pré-conceito por admitir que todos os meios de comunicação do Brasil foram construídos neste lugar da oralidade.
“É falar dos sistemas de comunicação num longo processo em que estas trocas se constituíam por ouvir dizer, por correr léguas como se dizia no Brasil de 1808 e que você tinha um complexo sistema de comunicação instalado quando aqui se instalou, primeiramente, a Gazeta do Rio de Janeiro e, logo, nos anos que se seguiram a explosão da imprensa, já há imprensa no estado de Pernambuco. Em que você tem trocas complexas entre esses atores que circulam na sociedade e que constitui não um sistema primitivo de comunicação, mas um sistema altamente sofisticado de comunicação já nesses primeiros tempos. A instauração da palavra impressa não significa a morte dos outros modos de comunicação”, complementa.
Para concluir, Marialva Barbosa falou que ao contrário do que muitos pensam sobre escravos analfabetos por meio de uma pesquisa que ela gosta muito e acabou de mandar para o CNPq, sobre os escravos letrados do século XIV. A pesquisa mostra que muitas das afirmações da história são questões de preconceito. Não reconhecer os escravos como sujeitos da sua própria história. “Eles eram analfabetos, continuavam analfabetos, mas eram leitores de segunda natureza, leitores de terceira natureza, leitores de quarta natureza e dominavam os códigos letrados. Eu vou apresentar uma poesia de Gungo Moquiche, escravo brasileiro do século XIV, que escreveu Minerva Navio Negreiro”, finaliza.
Minerva Navio Negreiro
Agora sinhô baranco
Q’outro galo já canto,
Sumcê passa p’ra trazi
-Eu p’ra flente vou !
Pois, sumcé lisencioso
Do serebiço do tição,
Acha bom, acha gossitoso
Amburi a cravidão ?! …
Pringaceza redemtôra
Tem que dá seu rhugá,
A ` princesa dictadôra
Mãi Maria do tundá
Pai Manué – imperandô
Mãi Maria Peratrizi,
O Duão será doutô
E mana Eva baxatrizi.
Victo, que é fahapo
Pode sê inbaixandô:
Pedro tem consurhado
E é Jorge senhandô !
Pois, sumcê licencioso
Da famia do tição …
Dirheitinho, abre zóio
P’ra não leva bofetão ?!
Dando cumplimento di óridi de maiorá , mandô primi berrhiço que sitá crito ni quaquê com bléma di nabio qui nosso transipotô para tèra di baranco, onde nosso ficou si cravo até 13 di Maio do 1888. Acaay-acay amollorum. Chuta di Zambezy, 3 di Marhiço do anno di centenaio di Bassitia di 1889 – Libredade –
Gungo Moquiche, zi crivinhandô.
Dando continuidade à terceira mesa do Fórum Ipea/Socicom, a pesquisadora e Pró-reitora Acadêmica da Universidade Católica de Pernambuco, Aline Grego, apresentou o tema História da Televisão em Pernambuco. Antes de introduzir o tema, a professora Aline Grego comentou que ficava muito a vontade com as colocações da professora Marialva Barbosa e, antes do professor José Marques, do próprio Marcelo e Anita, porque nós estamos num estado onde a produção, o pioneirismo, a imprensa, a produção audiovisual, sempre teve espaço. E mesmo estando em “arquipélagos culturais”, termo utilizado por José Marques, o estado de Pernambuco, de alguma forma, tentou resistir e produzir cultura, seja impressa, oralmente e virtualmente.
“Quando Anita fala de cinema, a gente tem o Ciclo do Recife, importante no início do século XX; temos outro momento importante da cinematografia que é o Super 8 e temos agora uma participação bastante significativa da retomada do cinema brasileiro. Então, esse é um estado que respira, digamos assim, a produção audiovisual. Apesar de termos entrado tardiamente na televisão”, explica.
Aline Grego comentou sobre a fala da Marialva, quando disse que “Noventa por cento dos cursos de graduação em comunicação, hoje, não têm mais disciplina de história dos meios”. E disse que fica muito orgulhosa porque o curso da Universidade Católica de Pernambuco há os estudos de história, por meio da disciplina História da Comunicação, e dentro das disciplinas de Rádio e TV, a história do Rádio e da TV. “Bem, aquela mania que pernambucano tem de que tudo é mais, que o Rio Capibaribe e o Rio Beberibe se juntam para formar o Oceano Atlântico. Então a gente tem a primeira rádio e a mais antiga em funcionamento do País (Rádio Clube de Pernambuco), Luiz Mariano não está aqui hoje para defender veementemente essa verdade, mas é uma verdade. E temos também o jornal mais antigo em circulação da América Latina e o mais antigo em circulação em língua portuguesa (Diario de Pernambuco), segundo Luis Humberto Marcos, diretor do Museu Nacional da Imprensa, do Porto, em Portugal”, comenta.
“Bom, na televisão nós não fomos pioneiros, muito pelo contrário, nós começamos com bastante atraso. Começamos 10 anos depois da implantação da TV no Brasil, na década de 60, mais especificamente em 1960. Nós vamos ter simultaneamente a instalação de duas emissoras, a TV Rádio Clube, que era a TV Tupi, e vamos ter a instalação da TV Jornal do Commercio, que era do Grupo F. Pessoa de Queiroz. O Grupo F. Pessoa de Queiroz já detinha um sistema de comunicação, possuia cinco rádios, tanto no Recife como no interior do estado, e possuia dois jornais, o Jornal do Commercio e o Diário da Noite, que era um jornal vespertino. Ele tinha uma estrutura de comunicação e preparou uma televisão para ser de fato uma emissora de televisão. O prédio, a gente pode fazer uma aproximação bastante audaciosa, mas era um Projac (Projeto Jacarepaguá – Central Globo de Produção) nos anos 60. Ele foi pensado para de fato funcionar como uma emissora, não só para exibir e retransmitir, mas sobretudo para produzir o material. Do ponto de vista produtivo, foi a TV Jornal do Commercio que deu o pontapé inicial em Pernambuco”, explica.
“Em 1968 nós vamos ter outra experiência pioneira. A instalação da primeira TV Universitária do Brasil. Ela funciona até hoje. Ela pertence à Universidade Federal de Pernambuco e ela passa a funcionar em novembro de 1968. Havia uma intenção, obviamente por trás, do Governo Militar que era a do direcionamento da produção audiovisual brasileira, desse novo veículo emergente que era a televisão de ser utilizado como processo e ferramenta educativa. E aí a gente vai ter essa situação até o final dos anos 60 e começamos o que eu chamo de alfabetização do nosso olhar eletrônico, que a gente começa a usar comparativo, visualmente falando. Então, esses seriam os primeiros passos nossos na linguagem televisiva. Quando chega a década de 70, vai ter um dado bastante diferencial aqui, que é a instalação da Rede Globo Nordeste, exatamente a última quinta emissora da Rede Globo. Você sabe que cada rede no Brasil só é permitido ter até cinco emissoras e a do Recife é uma das que integra a Rede Globo, ou seja, nós não somos afiliadas”, complementa.
“O Rádio, ele tem uma influência significativa na TV em Pernambuco, como quase em toda televisão do Brasil. Ao contrário, por exemplo, dos Estados Unidos onde a influência foi do Cinema para a TV. Nós saímos da oralidade para a oralidade com a imagem. A Rádio Clube que é a primeira rádio comercial em funcionamento e a Rádio Jornal já possuíam, na verdade, um elenco e um pessoal técnico e artístico que dava conta de assumir esse novo desafio que era o desafio da televisão. Então, muitos desses profissionais migram para suas emissoras. Tinha um dado curioso que a distância do eixo Rio e São Paulo acabou nos desafiando a essa produção local também. Nesse sentido, a gente vai ter então, primeiro o staff do artista, staff da técnica e, sobretudo, staff para novas ideias. Então, a criatividade é possível de ser semeada porque as pessoas estavam aprendendo e descobrindo este novo veículo, contudo, é uma aprendizagem que repetia alguns modelos que já existiam no que era exibido nas emissoras do Rio e São Paulo. Então, a gente percebe que ao longo dessa estrutura da televisão pernambucana muitos dos programas apesar de serem exibidos aqui, eles, mais ou menos, repetiam já uma estrutura existente no Rio e São Paulo. Um ou outro elemento que destoava e que tinha uma produção local, a exemplo do humor e até da novela”, apresenta.
“A gente vai ter a construção do repertório. E nesta construção a gente vai ter alguns gêneros que vão marcar profundamente a televisão em Pernambuco, sobretudo, na primeira década. O humor, o teleteatro, os programas de auditório, o noticiário e as novelas. As novelas e o jornalismo em particular, eles foram determinantes no que eu chamo a cartilha do audiovisual. Quer dizer, a população aprender a ver a imagem, a trabalhar e a entender essa imagem. E aí como a gente já era conhecido como celeiro artístico tanto do ponto de vista popular, quanto do ponto de vista intelectual, passamos também a ter alguns talentos sendo revelados para a televisão. Pernambuco chegou a produzir novela ‘A moça do sobrado grande’ que não foi exibida só aqui, ela foi também exibida na TV Bandeirantes”, destaca.
“A gente vai ter dois pontos muitos importantes da nossa televisão. Um jornalismo, que inicialmente o telejornalismo engatinhava que era o daqui o Jornal Pirelli, que era na Tupi, e o Repórter Esso que era na TV Jornal, que obviamente tudo isso tem a ver com publicidade. E vamos ter, a partir de 1972, o que a gente começa a identificar como os problemas regionais. É quando se passa a ter as transmissões ao vivo, as produções não são mais realizadas localmente, bastavam se fazer Rio e São Paulo e exibir para o resto do país. Mas o problema não era só produção, é porque a publicidade também foi para o eixo Rio e São Paulo apenas. Então as emissoras locais começam a enfrentar uma série de dificuldades e passam a ter dificuldades, inclusive, para se manter. E aí quais são as consequências básicas dessa mudança, que tecnologicamente era muito bom, o satélite ao vivo nos traz grandes elementos, mas em contrapartida se a gente for pensar do ponto de vista regional, isso não é caso só de Pernambuco e menos ainda só do Nordeste, há um retrocesso na produção audiovisual que estava sendo realizada. A gente então tem uma nova ruptura. A gente passa, não só, da tela grande para a tela pequena. A segunda ruptura que a gente chama de as imagens estranhas à nossa narrativa e ao nosso cotidiano. Então a gente começa a ver um Brasil que a gente não via. A gente começa a ver um Brasil da Zona Sul Carioca ou o Brasil da Avenida Paulista de São Paulo e os temas locais começam a perder destaque” enfatiza.
“Uma outra preocupação é a construção do repertório. A gente começa a ter um exercício de sedução mais forte da televisão dos anos 90, início dos anos 2000, mas com um diferencial, as emissoras voltam a produzir, em termos de Pernambuco, também localmente, inclusive teledramaturgia. Tanto a TV Jornal quanto a TV Globo local passam a desenvolver esse material. Hoje a situação aqui é, mais ou menos, a seguinte: nós temos nove emissoras na Região Metropolitana do Recife, tínhamos 11, duas foram extintas a Tupi em 80 e Manchete em 99, e no interior do estado nós temos sete, sendo três em Caruaru, duas em Fernando de Noronha, Vitória de Santo Antão e a de Petrolina. Eu não destaquei as repetidoras, estou destacando as que de fato tem condições de fazer produções”, ressalta.
Bom, o Sérgio Matos, um colega nosso querido, pesquisador e historiador da Bahia, ele gosta de trabalhar o desenvolvimento da televisão no Brasil no que ele chama de seis fases. E aí eu tentei, digamos assim, puxar as emissoras pernambucanas nas fases identificadas pelo Sérgio. A primeira fase, ele chama de elitista, que é de 1950 a 64 e aí vocês vão ver que a TV Jornal e a TV Tupi, elas surgem ainda nessa fase. Porque que ela é chamada de elitista? Porque nem todo mundo tinha condições de ter um aparelho de televisão. Para se ter uma ideia quando o Brasil começou a ter transmissões televisivas, apenas 200 aparelhos de TV existiam. Para se ter uma noção de como tudo muda tecnologicamente, no dia em que a TV Digital no Brasil foi ao ar já existiam 650 mil aparelhos adquiridos. A fase populista, quando a programação televisa tenta atender mas essa população da classe C e B, de 64 a 75, e aí a gente vai ter aqui o surgimento da TV Universitária e a Rede Globo. Depois vem a fase do desenvolvimento tecnológico, de 75 a 85, e nós vamos ter a inserção da Rede manchete e da TV Tropical, que é uma TV do estado, que depois passa a se chamar TV Pernambuco, e da TV Golfinho, em Fernando de Noronha. Vem a fase transição e expansão internacional, de 85 a 90, nesse período nenhuma emissora é instalada em Pernambuco. A fase da globalização, de 1990 a 2000, e a de convergência e qualidade digital, de 2000 a 2007, vai coincidir na verdade com uma forte internalização da Televisão em nosso estado. O dado mais interessante, a maioria retransmite a programação Globo, SBT, Record e Bandeirantes, mas todas elas, todas que estão elencadas, elas têm condições de viabilizar a produção local e muitas o fazem”, finaliza a Pró-reitora da Universidade católica de Pernambuco, Aline Grego.
O fórum ainda apresentou o Panorama das Indústrias Ascendentes: do audiovisual à cibercultura com coordenação da pesquisadora da Folkcom e da Socicom, Betânia Maciel, e exposição dos professores da Universidade Federal de Pernambuco, Alfredo Vizeu e Marcelo Sabatini. Em seguida, o bolsista do Ipea/Socicom Alexandre Kieling apresentou seus comentários. Após o encerramento realizado por Daniel Castro (Ipea), Anita Simis (Socicom) e Marcelo Mello (Fundaj), os participantes foram convidados pela Fundaj para um coquetel.