Diagnóstico psiquiátrico, essencialismo e barbárie: considerações a partir da fenomenologia da vida

Autores

  • Stephan Malta Oliveira Universidade Federal Fluminense

DOI:

https://doi.org/10.25247/P1982-999X.2023.v23n3.p148-169

Palavras-chave:

fenomenologia da vida, Michel Henry, diagnósticos psiquiátricos, barbárie, pathos originário

Resumo

O objetivo do presente artigo consiste em utilizar a noção de barbárie, encontrada em Michel Henry, aplicando-a à psiquiatria, mais especificamente aos efeitos dos diagnósticos psiquiátricos sobre os indivíduos categorizados. Busca-se ainda discutir as funções essencialista e pragmática do diagnóstico na psiquiatria e sua relação com os fenômenos da vida e da subjetividade. Utiliza-se como metodologia a revisão não-sistemática da literatura, por meio da qual foram selecionados textos da fenomenologia da vida, de Henry, com ênfase ao livro A barbárie, e textos voltados a uma análise crítica acerca dos diagnósticos psiquiátricos e de seus efeitos nos processos de subjetivação. Os resultados mostraram que o diagnóstico psiquiátrico, ao enfatizar os aspectos objetivos dos transtornos mentais - os quais remeteriam a supostas disfunções cerebrais que, numa visão essencialista, corresponderiam à própria essência do indivíduo categorizado – e negligenciar/aplacar a dimensão da afetividade/subjetividade, tal qual a ciência moderna, aniquila a própria vida, no que se poderia denominar barbárie psiquiátrica. Por outro lado, quando este é tomado apenas em sua função pragmática, enquanto dispositivo político e tendo o pathos como o legítimo objeto do campo psiquiátrico, se coloca a favor da vida, do sujeito em sua singularidade, do humano. 

Downloads

Os dados de download ainda não estão disponíveis.

Biografia do Autor

  • Stephan Malta Oliveira, Universidade Federal Fluminense

    Possui graduação em Medicina pela Universidade Federal de Juiz de Fora (2000), residência médica em psiquiatria pelo Instituto Philippe Pinel-RJ (2003) e Mestrado em Psicologia Clínica pela PUC-RJ (2009), com ênfase em Musicoterapia de Improvisação e Perspectiva Desenvolvimentista no autismo; Doutorado em Saúde Coletiva, com ênfase em filosofia da psiquiatria, na neurobiologia, fenomenologia e antropologia da esquizofrenia - área de concentração: Ciências Humanas e Saúde - Instituto de Medicina Social - UERJ/2014. Pós-doutorado pelo Programa de Pós-Graduação em Psiquiatria e Saúde Mental - Laboratório de Estudos e Pesquisas em Psicopatologia e Subjetividade - IPUB/UFRJ -. Professor Adjunto de Neuropsiquiatria Infantil - Departamento Materno-Infantil da Faculdade de Medicina da UFF. áreas de interesse: Neurobiologia, Filosofia (Pragmatismo, Pragmática, Fenomenologia, Hermenêutica, Filosofia da Psiquiatria, Existencialismo, Filosofia do encontro, Ética da Alteridade Radical), Psicanálise; Psicologia do Desenvolvimento; Antropologia Médica, Musicoterapia de Improvisação, Modelo Social da Deficiência, Estudos Críticos do Autismo. Linhas de pesquisa: 1 - Diagnósticos psiquiátricos, cuidado, controle e processos de humanização/desumanização; 2 - Erótica, Estética Teológica, Mística e Ética da alteridade radical. Categorias de pesquisa: eficácia pragmática, dimensão não-discursiva da experiência, explicação/compreensão, medicalização, explicações multiníveis, neurodesenvolvimento, consciência pré-reflexiva de si, trauma psíquico, afetos irrepresentáveis, elaboração psíquica, musicalidade comunicativa, eficácia simbólica, "embodied experience", "symbolic healing", "spiritual healing", etnopsiquiatrias folk e profissionais, "lived experience", "lived body, diversidade/diferença funcional, complexificação/diferenciação", subjetividade/vulnerabilidade/sensibilidade/afetividade

Referências

ANTÚNEZ, A.E.A.; WONDRACEK, K.H.K. Fenomenologia em Michel Henry: Implicações na Psicopatologia e Psicoterapia. Revista da Abordagem Gestáltica, v. XVIII, n. 1, p. 3-12, 2012.

BRACKEN, P.; THOMAS, P; TIMIMI, S; ASEN, E.; BEHR, G.... Yeomans, D. Psychiatry beyond the current paradigm. The British Journal of Psychiatry, v. 201, p. 430-434, 2012.

CONRAD, P. Medicalization and Social Control. Annu. Rev. Sociol., v. 18, p. 209-232, 1992.

DORIA, A.L.P. Etiquetas médicas no campo da saúde mental. 2015. Dissertação (Mestrado em Psicologia) - Instituto de Psicologia da Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2015.

FERREIRA, M.V.; ANTÚNEZ, A.E.A. Fenomenologia de Michel Henry e a Clínica Psicológica: Sofrimento Depressivo e Modalização. Psicologia em Estudo, Maringá, v. 19, n. 2, p. 309-319, 2014.

FURTADO, J.L. A filosofia de Michel Henry: uma crítica fenomenológica da fenomenologia. Dissertatio, UFPel, p. 231-249, 2008.

GONÇALVES, M.S. Os primórdios da Psiquiatria no Brasil: o Hospício Pedro II, as casas de saúde particulares e seus pressupostos epistemológicos (1850-1880). Revista Brasileira de História da Ciência, Rio de Janeiro, v. 6, n. 1, p. 60-77, 2013.

GRIESINGER, W. Tratado sobre patologia e terapêutica das doenças mentais. Rev. Latinoam. Psicopat. Fund., São Paulo, v. 10, n. 4, p. 692-695, 2007. Originalmente publicado em 1845.

HACKING, I. Kinds of people: moving targets. Proc. Br. Acad. v. 151, p. 285-318, 2007.

HENRIQUES, R. P. A Psiquiatria do DSM: pílulas para que te quero. São Cristóvão: Ed. UFS, 2015. 170 p.

HENRY, M. L'essence de la manifestation. Paris: PUF, l990.

HENRY, M. Souffrance et vie. In: HENRY, M. Phénoménologie de la Vie. Paris: PUF, 2003. p. 143-156.

HENRY, M. A barbárie. Tradução: Luiz Paulo Rouanet. São Paulo: É Realizações Editora, 2012. Originalmente publicado em 1987.

HENRY, M. Prefácio. Tradução: Luiz Paulo Rouanet. In: HENRY, M. A barbárie. São Paulo: É Realizações Editora, 2012. p. 13-20. Prefácio escrito em 2000.

JOHNSTONE, L. Time to Abolish Psychiatric Diagnosis? In: Mad In America, 2013. Disponível em: https://www.madinamerica.com/2013/01/time-to-abolish-psychiatric-diagnosis/. Acesso em: jul./2023.

LACASSE, Jeffrey R.; LEO, Jonathan. Serotonin and depression: A disconnect between the advertisements and the scientific literature. PLoS medicine, v. 2, n. 12, p. 1211-1216, 2005.

MARTINS, A.L.B. Biopsiquiatria e bioidentidade: política da subjetividade contemporânea. Psicologia & Sociedade; v. 20, n. 3, p. 331-339, 2008.

MATOS, J.P.A. Rotulação diagnóstica psiquiátrica e atribuição de autonomia. Dissertação (Mestrado em Psicologia) - Instituto de Psicologia da Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2018.

MAYES, R.; HORWITZ, A. DSM-III and the revolution in the classification of mental illness. Journal of the history of the behavioral Sciences, v. 41, n. 3, p. 249-267, 2005.

MINKOWSKI, E. Breves reflexões a respeito do sofrimento (aspecto pático da existência). Rev. Latinoam. Psicopat. Fund., v. III, n. 4, p. 156-164, s/d.

MONCRIEFF, J. Psychiatric diagnosis as a political device. Social Theory & Health, v. 8, n. 4, p. 370-382, 2010.

OLIVEIRA, S.M. Os alcances e limites da medicalização do risco para a psicose: a emergência de uma nova categoria? Physis - Revista de Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 22, n. 1, p. 291-309, 2012.

OLIVEIRA, S.M. Sob a luz do amor: ética, clínica e transcendência. 1. ed. São Carlos: Pedro e João editores, 2022.

ORTEGA, F. O sujeito cerebral e o movimento da neurodiversidade. MANA. v. 14, n. 2, p. 477-509, 2008.

PINEL. P. Tratado médico filosófico sobre a alienação mental ou a mania. Tradução: Joice A. Galli Porto Alegre: Ed. da UFGRS, [1800-1801] 2007, 272 p.

RIBEIRO Jr., N. Da barbárie do discurso do mundo à fenomenalidade da vida: a linguagem (in)direta da revelação em Michel Henry. Estudos Teológicos, São Leopoldo, v. 63, n. 01, p. 19-38, 2023.

ROSENBERG, C. Contested boundaries. Psychiatry, disease, and diagnosis. Perspectives in Biology and Medicine, v. 49, n. 3, p. 407-424, 2006.

ROTELLI, F. A instituição inventada. In: NICÁCIO, F. (org.) Desinstitucionalização. São Paulo: Hucitec, 1990. p. 89-99.

SERPA JUNIOR, O.D.; LEAL, E.M.; LOUZADA, R.C.R.; SILVA FILHO, J.F. A inclusão da subjetividade no ensino da Psicopatologia. Interface - Comunic. Saúde, Educ., v. 11, n. 22, p. 207-22, 2007.

SHORTER, E. A History of Psychiatry: from the era of the asylum to the age of Prozac. New York: John Wiley and Sons, 1997.

STOLOROW, R. D. Da mente para o mundo, da pulsão para a afetividade: uma perspectiva psicanalítica fenomenológico-contextualista. Revista Brasileira de Psicanálise, v. 45, n. 2, p. 165-177, 2011.

TIMIMI, S. No more psychiatric labels: Why formal psychiatric diagnostic systems should be abolished. International Journal of Clinical and Health Psychology, v. 14, p. 208-215, 2014.

VENTURI, C. “Depressão, transtorno do pânico e fobia social são reais!”. Notas sobre essencialismo, pragmatismo e psicopatologia. Rev. Latinoam. Psicopat. Fund., São Paulo, v. 25, n. 4, p. 644-667, 2022.

WHITAKER, R. Anatomia de uma epidemia: pílulas mágicas, drogas psiquiátricas e o aumento assombroso da doença mental. Rio de Janeiro: Fiocruz, 2017. 421p.

WONDRACEK, K.H.K. Da felicidade ao pathos: uma introdução à Fenomenologia da Vida de Michel Henry. Texto baseado em palestra realizada no Encontro de Psicanálise da Sigmund Freud - Associação Psicanalítica de Porto Alegre, em 3 de setembro de 2008.

Downloads

Publicado

2023-09-28

Edição

Seção

Artigos Temática Livre

Como Citar

OLIVEIRA, Stephan Malta. Diagnóstico psiquiátrico, essencialismo e barbárie: considerações a partir da fenomenologia da vida. Revista Ágora Filosófica, Recife, PE, Brasil, v. 23, n. 3, p. 148–169, 2023. DOI: 10.25247/P1982-999X.2023.v23n3.p148-169. Disponível em: https://www1.unicap.br/ojs/index.php/agora/article/view/2464.. Acesso em: 29 abr. 2024.

Artigos Semelhantes

1-10 de 271

Você também pode iniciar uma pesquisa avançada por similaridade para este artigo.