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Professores de Jornalismo apresentam projeto sobre o Teatro Pernambucano

No dia 7 de outubro, durante a 8ª Semana de Integração Universidade Católica e Sociedade, a sala 510 do bloco A foi pequena para a quantidade de pessoas que foram assistir à mesa-redonda Transgressão em 3 atos com o coordenador do curso de Jornalismo, Alexandre Figueirôa, e com os professores Cláudio Bezerra e Stella Maris Saldanha.

Presentes na palestra estavam a Pró-Reitora Acadêmica, Aline Grego; a coordenadora da Graduação, Verônica Brayner; muitos alunos e professores, além do cineasta Jomard Muniz de Britto, e o ator Zé Ramos, que participou da peça: “Os Fuzis da Senhora Carrar” – que foi o primeiro desdobramento teatral feito pelo projeto Transgressão em 3 atos -, protagonizado pela professora Stella Maris.

Para dar início, Stella explicou o projeto, que foi aprovado em 2008 pelo Funcultura, e que consiste em uma pesquisa, três peças de teatro, um livro e um documentário.

“Para a gente, é uma alegria estar falando da nossa pesquisa, que é o ponta pé inicial do nosso projeto”, ressalta a professora.

A proposta da pesquisa é resgatar e contextualizar o Teatro Popular do Nordeste (TPN), o Teatro Hermilo Borba Filho (THBF) e o Vivencial Diversiones, três grupos do teatro pernambucanos, que segundo os professores, fugiram dos modelos clássicos vigentes à época e deixaram uma grande contribuição artística.

“Percebemos que essas três experiências poderiam ser interligadas pelo viés da transgressão. Cada um dos grupos a seu tempo e à sua maneira tinha um histórico de transgressão, fosse ele ideológico, estético ou de costumes”, conta Stella.

Após a conclusão da pesquisa, os professores observaram que não era suficiente se deter ao papel, então surgiu à ideia de trazer a estética defendida por esses grupos para o palco.

“Nós escolhemos uma peça que tenha sido representativa na história de cada um desses grupos e vamos montá-las. Não se trata de uma remontagem, mas de um diálogo, um diretor da cena contemporânea dialogando com uma estética, com uma escritura cênica que foi defendida no passado por esses três grupos”, explica.

Cada um dos professores estudou um dos grupos de teatro: a professora Stella Maris estudou o THBF – do qual participou em sua adolescência -; o professor Alexandre Figueirôa estudou o Vivencial Diversiones; e Cláudio Bezerra estudou o TPN. O professor Cláudio foi o primeiro a fazer a apresentação dos grupos teatrais, depois da introdução feita por Stella Maris.

Cláudio Bezerra agradeceu a todos e disse que era uma honra e uma responsabilidade apresentar esse projeto para os presentes, e ressaltou que a realização do projeto só foi possível graças ao apoio do Funcultura.

“O TPN tem uma história longa, fragmentada, muito tricotada, com alguns problemas, então não é fácil contar essa história. A pesquisa só terminou oficialmente”, afirma o professor Cláudio.

O Teatro Popular do Nordeste foi criado em 1960, em uma época que Pernambuco vivia a organização das lutas populares e a eleição de Miguel Arraes para prefeito do Recife (1959). A história do teatro pode ser dividida em duas partes: a do seu nascimento, onde o TPN surge com o propósito de defender o teatro pernambucano; e a segunda, onde o teatro vive seu momento áureo, quando o grupo passa a ter sua sede própria, lugar que virou ponto de encontro alternativo, uma espécie de resistência cultural à ditadura militar.

“O TPN foi um local praticamente único na cidade, onde foi praticada uma transgressão aos valores políticos e culturais dominantes naquele contexto histórico da ditadura militar”, conta o professor.

Mas o teatro pagou caro “pela ousadia da contestação”. Teve a sede invadida por militares, perdeu subvenções governamentais, e seus integrantes foram ameaçados várias vezes pelos integrantes do Comando de Caça aos Comunistas (CCC).

“Mas enquanto existiu, o TPN foi uma página vigorosa e marcante do teatro local, formou plateias e toda uma geração de novos atores e diretores, alguns deles vivos até hoje. O TPN é uma parte importante do teatro pernambucano e brasileiro. Outra coisa que nos motivou a escolhê-lo é que, apesar de sua importância, quando alguém escreve qualquer coisa sobre ele, é apenas uma citação”, finaliza.

Em seguida a professora Stella Maris retomou a palavra para falar sobre o Teatro Hermilo Borba Filho (THBF). Assim como Cláudio, explicou o contexto histórico e as transgressões pelas quais o grupo passou, mas com a diferença de ter sentido tudo na pele.

“Vou tentar não falar tão apaixonadamente do THBF. Lá foi onde passei grande parte da minha adolescência. Costumo dizer que lá era o respiradouro da gente, vivíamos em um momento com tanta falta de perspectivas, de liberdade, que quando precisávamos respirar era pra lá que nós íamos”, confessa Stella.

O Teatro Hermilo Borba Filho nasceu, oficialmente, no dia 8 de maio de 1976, tendo como fundador o diretor Marcus Siqueira. Surgiu como uma extensão do Teatro Novo do Recife, também criado por Siqueira, e cuja estreia se deu em 4 de outubro de 1968, no Anexo do Palácio Episcopal dos Manguinhos.

Na época do Teatro Novo, a cidade vivia uma fase de ardências políticas, mobilizações culturais e proliferação das estéticas de vanguarda. Assim como o TPN, o Teatro Novo também teve sua sede invadida pelos integrantes do Comando de Caça aos Comunistas (CCC).

“Eram tempos de tortura, assassinatos e repressão política. Os integrantes do CCC chegaram a metralhar toda a frente do teatro”, contou a professora Stella Maris.

Desde a sua estreia, ainda com o Teatro Novo, até a data da sua extinção, em 1981, o THBF colocou-se como resistência à ditadura militar vigente à época no Brasil, e isso fez do grupo importante referência do teatro pernambucano.

No plano estético, as montagens se caracterizavam pela prevalência do menos. O diretor notabilizava-se por soluções cênicas que superavam a escassez de recursos.

“O teatro de Marcus Siqueira rompia com os limites de um estilo clássico de teatro, considerando clássico um teatro que apenas buscava se aperfeiçoar dentro dos parâmetros vigentes. Propunha desarrumações que valorizassem uma arte de ideias. Era um teatro combativo, provocador, comprometido com a causa social, mas também militante do lúdico, do poético, do libertador, da organicidade do fenômeno cênico”, destacou Stella.

E por último, o coordenador do curso de Jornalismo, Alexandre Figueirôa, fez sua exposição sobre o Vivencial Diversiones.

O grupo surgiu, em 1974, dentro da Igreja do Amparo, em Olinda, a partir do trabalho de evangelização desenvolvido pela Associação dos Rapazes e Moças do Amparo (ARMA), ligado aos monges do Mosteiro de São Bento.

“Nossa pesquisa tem vários pontos que acabam convergindo, mas meus colegas que me desculpem, mas para mim o Vivencial foi o mais transgressor de todos os grupos”, relata Figueirôa.

A primeira peça, Vivencial I, foi uma colagem de textos de caráter polêmico que acabou inviabilizando o vínculo do grupo com os beneditinos. Em 1978, o Vivencial construiu sua sede no Complexo de Salgadinho, em Olinda, dentro de uma das comunidades mais pobres do Grande Recife. O espaço se chamava Vivencial Diversiones e funcionava como uma espécie de café concerto eclético, onde eram apresentados espetáculos teatrais, musicais e recitais.

De postura anárquica, o Vivencial Diversiones usava a linguagem teatral para provocar o regime militar e o autoritarismo político e moral imposto no país. Em suas peças, o grupo abordava de maneira ousada e irreverente as questões que inquietavam os seus jovens integrantes, sobretudo, as relativas à liberdade sexual, ao uso do corpo e ao homoerotismo.

“Você sempre era surpreendido, o Vivencial era um teatro performático, irreverente, debochado; muitas pessoas se assustavam com a provocação que ele causava. Era uma verdadeira festa, tudo era teatro, tudo era possível. Após assistir a uma apresentação deles, você saía mexido na sua maneira de ver o mundo”, ressaltou o professor Alexandre Figueirôa.

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