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O jornalista e a pesquisa científica é tema de mesa-redonda na 6ª Semana de Jornalismo

A segunda noite da 6ª Semana de Jornalismo da Católica foi dedicada a um lado menos conhecido da profissão. Os jornalistas Lydia Barros, Sheila Borges e Luiz Joaquim falaram aos estudantes sobre as suas experiências na área da pesquisa científica em comunicação e os benefícios do conhecimento acadêmico no trabalho cotidiano. A mediação da mesa-redonda “O Jornalista e a Pesquisa Acadêmica” ficou por conta da professora da Católica Fabíola Mendonça.

O encontro teve início com o depoimento da jornalista do Diario de Pernambuco Lydia Barros, que está desenvolvendo uma tese de doutorado sobre a relação entre a produção musical da periferia e o mercado fonográfico, com base no estilo tecnobrega. Segundo Lydia, a pesquisa no campo da comunicação tem se transformado em um tema relevante para discussão, diante do crescimento do número de recém-graduados nas seleções de cursos de mestrado.

A jornalista acredita que os estudos acadêmicos podem beneficiar o trabalho nas redações, já que oferece novos subsídios e referenciais teóricos, filosóficos e sociológicos para a análise dos assuntos cotidianos. E foi em busca desse olhar diferenciado que Lydia ingressou no mestrado, depois de 13 anos de dedicação às reportagens da editoria cultural do Diario, o Viver. “Eu já estava no batente há todo esse tempo e sentia que começava a entrar no piloto-automático. Então, fui atrás desse distanciamento, para melhorar a minha abordagem do campo cultural”, lembrou.

Na dissertação de mestrado, Lydia Barros tratou da produção cultural do Alto José do Pinho, na Zona Norte do Recife. De acordo com ela, a experiência acadêmica contribuiu para o “fazer jornalístico”, ao oferecer noções significativas sobre a relação entre periferia e o mercado da música no Brasil. Mas, até traduzir os novos conhecimentos na redação cotidiana, Lydia contou com a compreensão do Diario de Pernambuco, que lhe concedeu duas licenças para aprofundar os estudos. A última delas durou sete meses e terminou há duas semanas. Embora tenha sentido falta do dia a dia no jornal, Lydia não hesita em afirmar que a experiência deve render bons frutos.

Isso porque a experiência foi bem diferente. Desde o início. Lydia enviou um e-mail para um professor de comunicação de uma universidade canadense, explicando o conteúdo da sua pesquisa sobre a música e a periferia. Para a sua surpresa, recebeu uma indicação do especialista para fazer uma espécie de intercâmbio em uma instituição de ensino em Montreal, uma das principais cidades do Canadá. De volta ao Recife, Lydia só pensa em colocar em prática os conhecimentos adquiridos durante a viagem. “Foi uma experiência riquíssima de contato com novos autores, pensamentos e teorias, mas eu já estava ansiosa para retomar o trabalho”, revelou.

A aplicabilidade na vida profissional também marcou a experiência de Luiz Joaquim, crítico de cinema da Folha de Pernambuco formado na Católica há dez anos. No início da carreira, o jornalista foi convidado para assumir a curadoria do Cinema da Fundação Joaquim Nabuco, ao lado de Kléber Mendonça Filho. Incomodado com o ritmo do trabalho, mais lento do que o das redações de jornal, Luiz Joaquim decidiu voltar às salas de aula.

A princípio, o jornalista pretendia fazer um mestrado em cinema no Rio de Janeiro ou em São Paulo, mas mudou de ideia diante do desejo de levar os novos conhecimentos para a prática, algo que só seria possível no cargo de curador do Cinema da Fundação. Terminou cursando na Universidade Federal de Pernambuco. O projeto de conciliar aprendizagem e trabalho se concretizou definitivamente em 2003, quando Luiz Joaquim recebeu o convite para se tornar crítico de cinema da Folha de Pernambuco. Mas ele garante: empregos e salário não estavam
entre as motivações para buscar a pós-graduação. “O importante é ter interesse pelo assunto, porque o estudante vai passar dois anos casados com um tema, que pode se confirmar ou virar de cabeça para baixo”, afirma.

Hoje, Luiz Joaquim não tem dúvidas sobre o acréscimo de qualidade conferido pela experiência de pós-graduação. “Quando releio os textos antigos, percebo uma certa ingenuidade. A disciplina e o olhar aguçado que obtive na época da pesquisa, aliados aos dez anos de profissão, permitem que minha produção atual seja mais profunda”, avalia.

Repórter sênior da editoria Política do Jornal do Commercio, Sheila Borges tem uma carreira considerável na esfera acadêmica. Formada na Católica, ela ocupou, por dois anos, o cargo de professora substituta da Universidade Federal de Pernambuco. No currículo, traz, ainda, cursos de especialização e mestrado em História Contemporânea e Comunicação. Atualmente, é doutoranda em sociologia, também pela UFPE. Como ela arranjou tempo para tudo?

Sheila não esconde que é difícil conciliar a pesquisa acadêmica e o “fazer jornalístico”, mas alega que, com disciplina, é possível caminhar bem e ter sucesso nos dois campos de atuação. “É preciso ter muito jogo de cintura, mas, depois, conseguimos ver que o nosso texto melhora bastante. Deixamos de lado alguns termos inadequados ou pesados, por exemplo.”

De acordo com a jornalista, as barreiras entre os comunicadores de academia e de redação têm sido superadas nos últimos anos. Ela própria é um exemplo disso, como comprova o método que criou, durante a fase como professora da UFPE, para vincular os processos de elaboração de um projeto científico e de uma pauta. O raciocínio se fundamenta nas ideias de que, tanto nas reportagens, quanto na academia, os fatos só existem com a participação do observador (repórter ou pesquisador). “O indivíduo percebe, interpreta, classifica e compreende os fenômenos a partir de um conhecimento prévio”, destacou.

O método estabelecido por Sheila Borges parte da adoção de um roteiro, que possa imprimir mais precisão à apuração e ao texto final de uma reportagem especial, de modo semelhante ao que ocorre com um anteprojeto científico. Para elaborar tal guia, o primeiro passo é a escolha do tema e a sua defesa ante o editor, com a comprovação de sua viabilidade e do seu valor para a publicação. Em seguida, deve-se delimitar a pesquisa, para não desperdiçar tempo da apuração. A terceira etapa consiste na demonstração dos objetivos da matéria. A quarta refere-se à decisão quanto aos procedimentos metodológicos, isto é, as ferramentas que o repórter utilizará na montagem do texto, inclusive com a
identificação das fontes e do tipo de produto final. O último ponto é a construção de um cronograma, com a divisão das fases de apuração, produção e edição.

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