Emoção e valorização da pesquisa em comunicação marcam entrega do Prêmio Luiz Beltrão 2011
|Texto: Tiago Cisneiros
Uma noite para entrar na história. Na história do Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – Intercom, dos pesquisadores da área, das entidades que se dedicam a ela e da Universidade Católica de Pernambuco. Foi assim a cerimônia de entrega do Prêmio Luiz Beltrão 2011, realizada nesta segunda-feira (5), das 20h às 22h, no auditório G2 da Unicap. O evento, que acontece há 14 anos, dentro da programação do Intercom, marca o reconhecimento das pessoas e instituições que se destacaram no campo dos estudos da comunicação. Nesta edição, os vencedores das categorias Maturidade Acadêmica e Liderança Emergente foram, respectivamente, o pernambucano Luiz Maranhão Filho e o paulista Eugênio Bucci. A Rede Folkcom foi escolhida como Grupo Inovador, e o Programa de Pós-Graduação em Comunicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), como Instituição Paradigmática.
Como membro da mesa do evento, o presidente do Intercom, Antônio Hohlfeldt, tratou de deixar claro por que a noite e a edição deste ano eram tão especiais. Lembrou que, pela primeira (e, por um bom tempo, única) vez, o congresso está sendo realizado na “casa de Luiz Beltrão”, a Universidade Católica de Pernambuco, cujo curso de Jornalismo foi fundado pelo pesquisador, há 50 anos. Hohlfeldt mencionou, ainda, que a instituição foi o berço de outros grandes nomes da pesquisa em comunicação, como Roberto Benjamim, Gaudêncio Torquatto (homenageado do Intercom 2011) e José Marques de Melo. Este último também compôs a mesa da cerimônia, como criador e presidente de honra da Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação e ex-estudante da primeira turma de jornalismo da Unicap.
Após a exibição de um vídeo de apresentação do Prêmio Luiz Beltrão, que foi instituído em 1998, na comemoração dos 20 anos de Intercom, o presidente da Rede Folkcom, Marcelo Pires, foi convidado a receber a placa alusiva à escolha como Grupo Inovador. No discurso, ele afirmou que a premiação é importante para indicar que o caminho dos trabalhos da rede está correto e, ao mesmo tempo, para incentivar o desbravamento de novas vias. A Rede Folkcom dedica-se, segundo Pires, a estudar a Folkcomunicação, considerada uma teoria genuinamente brasileira da comunicação, postulada pelo próprio Luiz Beltrão, em sua tese de doutorado, em 1967. O seu objeto de análise é o “processo de comunicação que existe nas manifestações de cultura popular ou advindo disso”, conforme explicou o presidente da entidade.
Para Pires, a conquista do Prêmio Luiz Beltrão traz, além de um reconhecimento às pesquisas desenvolvidas pelos pioneiros no estudo da Folkcomunicação e pela Rede Folkcom desde 2002, a responsabilidade de honrá-lo e a oportunidade de divulgação. “Nós trabalhamos com uma teoria de comunicação brasileira, que ainda não é muito abordada nas escolas da área no país. Esta vitória torna a nossa atuação pública, e nós precisamos aproveitar para estimular a inclusão da folkcomunicação nos currículos”, afirmou.
O segundo prêmio da noite foi para a UFRJ, que, neste ano, obteve a primeira nota 6 entre os cursos de pós-graduação de comunicação brasileiros, na avaliação trienal da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes). Graças à conquista inédita, a instituição levou, também, o primeiro lugar na categoria Instituição Paradigmática do Prêmio Luiz Beltrão. O coordenador do Programa de Pós-Graduação em Comunicação, Maurício Lissovsky, ressaltou a importância da manutenção dos pilares “vigor teórico” e “produção teórica” ao longo dos 39 anos de curso e da tentativa de diálogo com outras disciplinas, como literatura, psicologia e história.
De acordo com Lissovsky, o recente sucesso do programa deve-se, em grande medida, à renovação estabelecida há pouco mais de oito anos, pela então coordenadora, Raquel Paiva (eleita nova diretora científica do Intercom). Ele disse, ainda, que o Prêmio Luiz Beltrão 2011 não foi recebido como uma conquista pessoal ou institucional, já que, como sinaliza o próprio nome da categoria, “o mérito do paradigma não está no que ele é, mas no que ele permite ver”. Mantendo o raciocínio, o professor afirmou esperar que, diante do exemplo dado pela UFRJ, outras escolas de comunicação possam encontrar o caminho para a obtenção de notas de excelência (6 e 7, na escala do Capes). “Se há uma vantagem em ser paradigma, não tem a ver com liderança, mas, sim, com a certeza de que jamais estaremos sozinhos.”
Entregues as premiações nas categorias institucionais, foi a vez de o professor e pesquisador Eugênio Bucci, 52 anos, subir ao palco do auditório para receber a placa alusiva ao título de Liderança Emergente. Ele também foi agraciado com uma passagem para Buenos Aires, capital da Argentina, oferecida pelo Globo Universidade, parceira no evento. Segundo Bucci, a notícia de que havia sido escolhido foi surpreendente, devido ao pouco tempo de dedicação ao ensino universitário. “Comecei a dar aula há dois anos somente, não formei sequer um mestre ainda”, contou. Depois, disse, começou a pensar que o tributo representasse a valorização das ideias que formulou ou ajudou a disseminar, sobretudo em relação à ética no jornalismo, à responsabilidade na comunicação pública e aos estudos da televisão. “Vivo um período em que me vejo colhendo alguns frutos (que é como aceito este prêmio), embora não tenha perdido o gosto pela semeadura”, afirmou, para, depois, declarar a sua paixão pela missão de educar, ou melhor, de “escrever, informar e formar”. Para Bucci, o Prêmio Luiz Beltrão 2011 é um marco na sua carreira acadêmica, porque, além de representar uma distinção entre os pares, reforça a responsabilidade de corresponder à expectativa e à homenagem.
No discurso, o pesquisador revelou sua satisfação por constatar mudanças no campo da comunicação em nome das quais sempre lutou. A primeira delas é a valorização do profissional de jornalismo, inclusive por empresas e instituições privadas. Outro destaque foi para o aumento das discussões quanto à ética. “Este debate está ganhando espaço. Se a mídia tem assimetrias e distorções, a sociedade passa a ter mais noções para cobrar”, disse. Mais adiante, classificou o direito à informação e a liberdade de imprensa como os principais direitos humanos para quem se dedica à área da comunicação e lembrou que o papel da imprensa é “revelar o que o poder quer esconder”.
A fala de Bucci foi sucedida pela exibição de um vídeo produzido por professores de Jornalismo da Universidade Católica de Pernambuco, em tributo a Luiz Maranhão Filho, vencedor do Prêmio Luiz Beltrão 2011 na categoria Maturidade Acadêmica. Na peça, há depoimentos de Valdir Oliveira, diretor de programas da TV Universitária; José Mário Austregésilo, professor da Universidade Federal de Pernambuco; e Cléo Nicéas, presidente da Associação de Empresas de Rádio e Televisão de Pernambuco (Asserpe). O destaque, no entanto, fica para a neta do homenageado, Marina Maranhão, aluna do curso de Jornalismo e estagiária da Assessoria de Comunicação (Assecom) da Unicap.
Ao término do vídeo, todos os espectadores e participantes da cerimônia levantaram-se para aplaudir a entrega da placa comemorativa ao pernambucano Luiz Maranhão Filho, que, aliás, tem “Beltrão” como segundo nome. Esta foi uma das semelhanças que ele logo tratou de mencionar, esbanjando bom humor, no início do discurso de agradecimento. A outra foi que ambos pertenciam a famílias tradicionais do estado, “que deixarem herdeiros sem dinheiro”. Ao longo de sua fala, Maranhão evidenciou a sua admiração por Luiz Beltrão, com quem trabalhou nos seus primeiros anos de jornalismo, no extinto jornal Folha da Manhã. “Fui ‘foca’ (jargão da área, que significa “repórter iniciante”) dele, num tempo muito gostoso”, lembrou. Depois da experiência no impresso, a dupla voltou a se encontrar na produção do programa de rádio “Presença”, então apresentado pelo Padre Aloísio Mosca, ex-Reitor da Universidade Católica de Pernambuco e co-fundador do seu curso de Jornalismo, em 1951.
Para Luiz Maranhão Filho, a conquista do prêmio de Maturidade Acadêmica não significa o fim da sua carreira, previsto para 2012, quando completará 80 anos de idade e 63 de trabalho. Representa, sim, uma das suas maiores alegrias profissionais (junto ao Prêmio Roquette Pinto, obtido em 1988) e o reconhecimento de que as pesquisas em comunicação são tão relevantes quanto o exercício cotidiano. “Sem teoria, não é possível ser jornalista. Sem a prática, também não”, disse, em entrevista à Assecom Unicap, sublinhando a importância de resgatar as lições e a história de Luiz Beltrão, de quem se considera o segundo maior admirador (abaixo, apenas, de José Marques de Melo). No esforço de manter viva a tradição científica no estado, Maranhão pretende lançar, em breve, os livros “Raízes do Rádio” e “Os senhores do mundo”. Neste último, a sua intenção é provar que Beltrão foi pioneiro no formato “livro-reportagem”, com a publicação de obra homônima. “É o melhor retrato do Recife nos anos 1950, nas entrelinhas da ficção”, avaliou.
No encerramento do seu discurso, Maranhão usou o bom humor para fazer uma última ode a Luiz Beltrão. “Gostaria de tomar a bênção a ele, que, lá do céu, conduziu cada um [dos jurados do prêmio] a colocar o meu nome na urna. Que viva Luiz Beltrão entre nós!”, declarou, para, novamente, ser aplaudido de pé por todos os presentes.
A última parte da cerimônia consistiu na homenagem in memoriam ao jornalista Carlos Cavalcante, que faleceu no último mês de julho, aos 62 anos, vítima de enfisema pulmonar. Além de ter trabalhado em diversos veículos de comunicação do estado, Cavalcante foi presidente da Associação de Imprensa de Pernambuco (AIP) e do Sindicato dos Jornalistas de Pernambuco (Sinjope). A placa foi entregue por José Marques de Melo e pela Pró-reitora Acadêmica da Católica e coordenadora local do Intercom 2011, professora Aline Grego, ao vice-diretor Administrativo-financeiro da AIP, Hilton Monteiro. Após o evento, foi servido um coquetel na antessala do auditório G2.