Boletim Unicap

Discurso do Reitor na outorga do título de Doutora Honoris Causa à professora Miriam de Sá Pereira

Maria, Mariama, Mirian…

Dom Helder Camara, Doutor Honoris Causa da Universidade Católica de Pernambuco, em uma solenidade como esta (em 22 de março de 1983), agradeceu pelo título e fez um pedido à Unicap: que fosse instituída uma disciplina chamada Justiça, que vinculasse a Universidade a uma educação libertadora e conectada com os problemas mundiais. Disse ele, na ocasião, em seu discurso de agradecimento: “Eram (como continuam sendo) tantas e tão graves injustiças em nosso tempo”, que só valia a pena pensar em uma disciplina, com este título e propósito, se ela tivesse condições de mobilizar “pessoas capazes, sensíveis e de boa vontade” para articular universidades nordestinas, brasileiras e latino-americanas para refletir sobre problemas locais, nacionais e internacionais que afetam as pessoas, “tentando ajudar o Brasil a viver, com dignidade e, possivelmente, com proveito, a hora grave que está enfrentando”.

Enfatizou ainda que “a pessoas desavisadas poderia parecer pleonasmo indicar como preocupação e preocupação prioritária da Universidade humanizar o homem”, justificando suas palavras nos mais de dois terços da humanidade que correm “o risco diário de subhumanizar-se pela miséria” e nos quase um terço restantes que correm “o risco efetivo de desumanizar-se pelo excesso de conforto e luxo”. A solicitação de Dom Helder corresponde à orientação da missão jesuíta, confirmada nas últimas congregações gerais, a saber: “A missão da Companhia de Jesus hoje é o serviço da fé, da qual a promoção da justiça constitui uma exigência absoluta, pois a reconciliação com Deus requer a reconciliação das pessoas entre si”.

Em 2009, 26 anos depois da outorga do título ao Dom da Paz, em atenção à solicitação dele, criamos a Cátedra Dom Helder de Direitos Humanos. Mas, de forma mais incorporada na matriz do curso e no ethos dessa instituição, Prof. Mirian foi atendendo a esse pedido de forma muito diversa, encarnando esse espírito em cada gesto, cada ato, cada palavra e até em seus silêncios, cuja eloquência ecoa até hoje aqui e na cidade, de geração em geração…

Fala-se no Evangelho de Maria como a mulher que sabia silenciar, aquela que guardava todas as coisas em seu coração. Mas também temos um testamento da eloquência de Maria no Magnificat:

“Proclama minha alma a grandeza do Senhor;

Alegra-se meu espírito em Deus, meu Salvador,

porque olhou para a humildade de sua serva.

A partir de agora, todas as gerações me chamarão bem-aventurada,

porque o Poderoso realizou em mim maravilhas

aquele que é poderoso e cujo nome é Santo.

Sua misericórdia se estende, de geração em geração, sobre todos que o temem.

Manifestou o poder do seu braço: dispersou o plano dos soberbos.

Derrubou do trono os poderosos e elevou os humildes.

Saciou de bens os indigentes e despediu de mãos vazias os ricos.

Acolheu a Israel, seu servo, lembrado da sua misericórdia,

conforme prometera a nossos pais, em favor de Abraão e

sua posteridade, para sempre.  (Lc 1, 46 – 55).

Dom Helder fez um belo poema à Mariama, interpretando, de maneira poética e vigorosa, o canto de Maria… Mariama, assim como Miriam, é uma variação decorrente da “vocalização” do nome Maria: MiRYaM, MaRYaM e MaRIaMa… Convido Dom Helder, nosso Doutor Honoris Causa, a vir fazer sua saudação… [neste momento, será exibido o vídeo com Dom Helder declamando o poema]

Mirian, mulher, mãe e mestra: queremos dar graças ao Senhor, todo poderoso, pelo presente que nos foi dado com a sua presença na Unicap e na vida de tanta gente. O Senhor fez maravilhas, de geração em geração, através de sua vida: seu jeito, suas aulas, sua presença manifestou a qualidade de seu belo serviço a Deus e a todos nós, pela mediação do curso de Direito. Você marcou a história de milhares de ex-alunos. Muitos dos quais presentes hoje aqui e vários deles ocupando os mais altos cargos dos Poderes Judiciário, Legislativo e Executivo ou exercendo a docência na Universidade, estimulados pelo exemplo e amor de sua mestra pelo ensino do Direito.

São quase 50 anos dedicados à Universidade. Uma trajetória ímpar, sempre marcada pelo pioneirismo, como foi dito aqui de tantas formas, das quais destaco três:

1) a partir dela, a presença feminina no curso de Direito foi ampliada;

2) foi uma das primeiras docentes a lecionar a disciplina de Sociologia Jurídica;

3) criou o Núcleo de Pesquisa Jurídica em 1992, época em que a pesquisa era incipiente nas Instituições de Ensino Superior.  Esse pioneirismo na pesquisa rendeu uma grande vitória em 2005, quando o MEC autorizou a criação do mestrado em Direito da Unicap. Esse foi um dia inesquecível na vida de Mirian e da nossa Universidade. Inesquecível como ela é e sempre será para cada um de nós. Mas essas conquistas vão se prolongando com o tempo: logo depois, veio a consagração da Graduação com a nota máxima (passamos a ser o maior e melhor curso de Pernambuco, segundo o MEC) e a aprovação do Doutorado.

Parafraseando Dom Helder em seu poema: “Que essa festa não termine aqui…” Nossa gratidão à senhora, Profª Drª. Mirian, é uma aposta na esperança em uma sociedade mais justa, em um país onde não haja pobres e ricos, opressores e oprimidos, juízes e injustiçados, mas todos irmãos no direito e na justiça.

Assim seja!

Pedro Rubens

Unicap 23 de fevereiro de 2018.

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