Diretrizes curriculares do Ensino Religioso em debate
|As novas diretrizes curriculares do Ensino Religioso nas escolas e as conexões com as pós-graduações em Ciências da Religião foram tema de debate na tarde desta terça-feira (26) no auditório do Centro de Teologia e Ciências Humanas (CTCH). Quem falou sobre o assunto foi o reitor da Universidade São Francisco (SP) e diretor da editora Vozes, Prof. Dr. Gilberto Garcia. Ele foi convidado pelo Programa de Pós-graduação em Ciências da Religião da Unicap (PPGCR), que está completando 15 anos. “Garcia presidiu a comissão do Conselho Nacional de Educação que lançou as diretrizes curriculares nacionais para as graduações em Ciências da Religião”, disse o Prof. Dr. Gilbraz Aragão, que também fez parte da comissão, ao apresentar o convidado.
A explanação de Garcia fez um resgate histórico para contextualizar o que ele chama de “tensionamento entre a laicidade e confessionalidade” ainda presente nos dias de hoje em torno dos debates sobre o Ensino Religioso nas escolas públicas brasileiras. Desde os primórdios da educação nacional que tinha a ver com a evangelização e catequização dos povos indígenas até a votação durante uma Ação de Constitucionalidade julgada pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Para Garcia, um dos imbróglios do debate está na falta de conhecimento teórico daqueles que elaboram essas políticas públicas. Segundo ele, há uma dificuldade em fazer uma diferenciação entre Ensino Religioso e Teologia.
“A base epistemológica das Ciências da Religião é religião entendida como sistema simbólico cultural, já a base epistemológica da Teologia é a confessionalidade, a doutrina a partir de uma tradição, seja ela qual for. Então, o objetivo das diretrizes (das Ciências da Religião) recém-homologadas é formar professores para a docência do Ensino Religioso. A diretriz curricular da Ciência da Religião chamou para si a responsabilidade de formar professores para o Ensino Religioso”. No entanto, Garcia fez questão de ressaltar que as diretrizes não colocam o campo das Ciências da Religião e da Teologia “em guerra”.
“Mas por que Teologia não forma professores? Desconhecendo a história que levou esses dois rumos é que o confronto pode ser deflagrado, não de uma forma contundente, porque isso depende do grau de esclarecimento daqueles que se interessam por essas disputa, mas quanto mais conservador, proselitista, mas vinga essa necessidade de brigar. Quanto mais se pesquisa o entendimento da história dos processos, mais fica claro que não precisa ter tensionamentos entre essas áreas do conhecimento”.
O reitor da Universidade São Francisco remontou o início do sistema educacional brasileiro, quando o Império delegou a Igreja as primeira ações na educação, que naquela época se misturavam a evangelização e catequização. “Os jesuítas foram pioneiros. De escola (onde se ensinava em qualquer lugar, embaixo de árvores…), eles criaram os colégios. E o que é que eram colégios? a fixação do ensino em um só lugar físico e com séries e disciplinas: português, matemática, ciências e a catequese. Então a estabilidade fez com que o sistema jesuíta fosse muito mais veloz e eficaz do que o das outras visões religiosas”.
Garcia falou ainda das consequências para o ensino brasileiro da expulsão dos jesuítas, da laicização ocorrida com a proclamação da República e como o Estado brasileiro lidou com isso “precariamente”. Segundo ele, durante o Estado Novo, o ensino religioso era facultativo. Em outro momento da explanação, o pesquisador destacou que uma das atuais dificuldades do debate está ligada a associação a questões de gênero.
“Infelizmente, o Ensino Religioso está sendo instrumentalizado por uma outra questão e isso só piorou o problema. Se antes nós tínhamos a questão de ter que ser confessional ou não, agora não temos essa questão”. Ele concluiu recomendando “não deixar que essa seara (do embate Teologia x Ciências da Religião) migre para as áreas do conhecimento que não têm nada a ver porque elas têm as suas próprias bases epistemológicas e seus interesses de objeto de pesquisa. E que não estão necessariamente ligados nem com proselitismo, nem com ideologia de gênero”.