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Cientistas reforçam posição contra ensino religioso nas escolas públicas

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Foto: UnB Agência

A antropóloga Débora Diniz Rodrigues, pesquisadora do Instituto de Bioética, Direitos Humanos e Gênero, diz que a ciência deve ser o principal fundamento da razão pública de um Estado laico

Em audiência pública realizada nesta segunda-feira, 15, no Supremo Tribunal Federal (STF), em Brasília, cientistas reforçaram posicionamento contrário ao o ensino religioso nas escolas públicas. O debate foi mediado pelo ministro Luís Roberto Barroso, relator da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4439 – que questiona o ensino religioso confessional ou crença religiosa no ensino público.

A ADI foi ajuizada pela Procuradoria Geral da República (PGR), em 2010. A Ação, motivada pelo acordo entre o Brasil e Vaticano, chamado Santa Sé, defende que o ensino religioso deve ser ministrado de forma laica, sob um contexto histórico e abordando a perspectiva das várias religiões.

Na audiência que ouviu cerca de 30 instituições, a antropóloga Débora Diniz Rodrigues, professora na Faculdade de Direito da Universidade de Brasília (UNB) e pesquisadora do Instituto de Bioética, Direitos Humanos e Gênero, voltou a defender um Estado laico. Ela entende que a confessionalidade é um ato de fé resistente às formas de organização e ao pensamento científico, e que “a ciência deve ser o principal fundamento da razão pública de um Estado laico.”

Para a especialista, a estabilidade do princípio da laicidade do Estado brasileiro depende da regulação não confessional da disciplina Ensino Religioso nas escolas públicas. Conforme disse, a “estabilidade da laicidade” é a garantia dos princípios da igualdade e da não discriminação, além do valor democrático da justiça religiosa.

“Somente com forma e conteúdo não confessionais a disciplina Ensino Religioso é capaz de manter o compromisso constitucional da educação pública como um direito social”, avaliou Débora.

Débora lembrou que o artigo 33 da Lei de Diretrizes Básicas da Educação (LDB) veda qualquer forma de proselitismo. Mesmo assim, acrescenta a cientista, o ensino religioso é a única matéria, no conjunto de todas as disciplinas oferecidas na escola pública do Brasil, sem qualquer regulação, seja do material didático, seja do critério de qualificação do professor.

Dessa forma, Débora afirma haver uma renúncia das políticas públicas da educação à anterioridade do fato religioso. “É como se religião não se submetesse ao acordo político sobre o que deve promover a cidadania na escola pública. O ensino religioso se movimenta protegido por um salvo conduto do Estado ou por estar isento de respeitar a laicidade e dos regimes de avaliação de qualidade do material didático e habilitação do professor.”

Proselitismo dissimulado

Reforçando tal posicionamento, Luiz Antônio Cunha, representante do Observatório da Laicidade na Educação, disse que o proselitismo é adotado de forma “dissimulada” nas escolas públicas. Ele entende que a existência da disciplina ensino religioso na Constituição Federal é um retrocesso na construção da República.

Cunha revelou dados da Prova Brasil de 2013 que considerou “eloquentes” quanto à obrigatoriedade do ensino religioso no país. Revelou que 70% das escolas públicas de ensino fundamental ministravam aulas de ensino religioso, das quais 54% confessaram exigir presença obrigatória nas aulas. Enquanto que 75% dessas escolas não ofereciam atividades para alunos que não queriam assistir a aulas de ensino religioso.

No entendimento de Cunha, o ensino religioso deve ser não confessional, sem qualquer caráter proselitista, oferecido como disciplina e não como tema transversal, apenas no último ano do ensino fundamental. Destacou, ainda, a necessidade de alternativas para os alunos que não queiram frequentar essas aulas.

Opinião do governo

Já o representante do Conselho Nacional de Educação (CNE) do Ministério da Educação, Luiz Roberto Alves, afirmou que o artigo 33, da Lei das Diretrizes Básicas da Educação (Lei nº 9.394/96) que estabelece o ensino religioso, é parte integrante da formação básica do cidadão, assegurado o respeito à diversidade e vedada quaisquer formas de proselitismo.

Para o diplomata Luiz Felipe de Seixas Corrêa, que, na condição de embaixador do Brasil junto à Santa Sé chefiou a missão brasileira que discutiu o acordo ratificado pelo Decreto 7.107/2010, disse, em nome da Arquidiocese do Rio de Janeiro, que o documento manteve os princípios constitucionais da separação igreja-Estado e da liberdade religiosa. Corrêa declarou que o texto, em vez de limitativo, é garantidor da liberdade religiosa e da não discriminação, que pode inclusive ser usado pelas demais denominações religiosas como padrão para o reconhecimento de prerrogativas análogas, conforme relatam dados do Supremo Tribunal Federal.

Gilbraz Aragão
Professor Dr. Gilbraz Aragão

Em outra frente, o representante do Comitê Nacional de Respeito à Diversidade Religiosa da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, Gilbraz Aragão, doutor em Teologia, afirmou que o ensino religioso, em um estado laico como o brasileiro, se justifica “pela necessidade de formação de cidadãos críticos e responsáveis, capazes de avaliarem as notícias religiosas em seu contexto, sem imposição de doutrinas e, portanto, de natureza não confessional”.

No encerramento da discussão, o ministro do STF, Luís Roberto Barroso, afirmou que o debate proporcionou grande enriquecimento intelectual. “Pessoalmente saio daqui muito mais capaz de equacionar as questões tratadas no processo do que antes da audiência”, afirmou, sem fazer previsões sobre o julgamento da ADI.

(Viviane Monteiro/ Jornal da Ciência)

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