A Deus, Pe. Ferdinand!
|Agradecemos a presença e a solidariedade de todos; estamos reunidos para fazer uma travessia de fé, diante de um acontecimento que nos entristece, seja pelo sentimento de perda de alguém querido, seja pela memória de perdas que toda cerimônia fúnebre desperta. Inclusive, temos acompanhado tantas mortes trágicas, por conta de enchentes, no Rio, ou por conta da violência em cada recanto de nosso país e do mundo. Mas queremos fazer desse ato uma celebração da vida, para além da morte. A Palavra de Deus vem em auxílio de nosso silêncio e de nosso pesar.
– Por um lado, a confiança de que a vida dos justos está nas mãos de Deus, segundo o livro da Sabedoria: Pe. Ferdinand era um justo ou teve uma vida ajustada.
– Por outro lado, a figura de Tomé, conhecido como o apóstolo das dúvidas e dos questionamentos: não sabemos o que aconteceu com Pe. Ferdinand, nem como, nem por quê.
Quando a morte se torna um enigma, antes mesmo da elucidação do acontecido, cabe-nos testemunhar o mistério da vida. A única coisa que sabemos é que ele viveu 72 anos de uma forma que nos parecia coerente e justa com as opções que ele foi fazendo ao longo de sua existência.
Independentemente de qualquer resultado da perícia e do laudo sobre a causa mortis, desde já, apesar da dor e do choque com a notícia e circunstâncias, nós podemos e devemos testemunhar a vida de Pe. Ferdinand: um homem que viveu entre nós e dedicou toda a sua vida aos outros. Ele deixou seu país, sua família e sua cultura para vir para o Brasil e, desde 1975, dedicava-se, especificamente no apostolado intelectual, como pesquisador e historiador.
Acreditamos que Pe. Ferdinand descansa nas mãos de Deus, tendo sido um padre de missa diária, um jesuíta disponível a quem foram confiadas várias funções e um homem abnegado. Quem o conheceu de perto sabe que ele merece todo o nosso empenho em buscar a verdade sobre a sua morte, mas, sobretudo, Pe. Ferdinand merece todo o nosso respeito, precisamente pela vida que levou.
Na tradição bíblica, a Deus somente cabe o julgamento; aos investigadores caberá elucidar o acontecido; aos amigos, companheiros e conhecidos, cabe-nos testemunhar a vida para além da morte. Jesus, no Evangelho, fala de muitas moradas na casa do Pai: acreditamos que o filho de Deus, cristão, padre e ser humano Ferdinand Azevedo repousa nas mãos do Senhor, pai de todos. As circunstâncias da morte podem nos ter provocado sentimentos diversos e questões: Tomé somos todos nós! Porém, o contexto do acontecimento foi a disposição deliberada e livre de estar mais perto de Deus, através da oração. Até mesmo a oração de Jesus foi ocasião de muito tormento, até de suar sangue. A última oração de Pe. Ferdinand não sabemos como foi, mas ela suscita a nossa oração, por ele, pelo seu repouso e pela vida nossa de cada dia. O testamento de quem parte, por mais enigmático que possa parecer, não deixa de ser um grito de vida e um recado de cuidado com a vida, com a saúde, com a segurança, com os outros. A pergunta de Tomé não ficou sem resposta: Jesus revelou-se como caminho de vida verdadeira e coloca-se diante de nós como convite de humanização. Isso incluiu até mesmo enfrentar a morte, apostando em uma esperança ainda maior. Que as nossas saudades se traduzem em esperança!
Pe. Ferdinand: descanse em paz, nas mãos de Deus, pai de misericórdia!
Pe. Pedro Rubens, Reitor
Capela da Unicap, 18 de janeiro de 2011.