Boletim Unicap

Pesquisadores da Católica estudam a relação entre o Dia Nacional de Ação de Graças, Joaquim Nabuco e as Noelistas

No ano em que se celebra o centenário de morte de Joaquim Nabuco, muito se discutiu a história política e abolicionista deste recifense que foi diplomata, jurista e jornalista. Mas pouca gente sabe que foi Nabuco quem iniciou a introdução no Brasil de uma data bastante comemorada nos Estados Unidos: o Dia de Ação de Graças, que este ano será comemorado na próxima quinta-feira (28). É neste feriado nacional que os americanos costumam agradecer a Deus as graças alcançadas. O assunto é o tema da pesquisa desenvolvida pelo professor Ferdinand Azevedo, da Universidade Católica de Pernambuco. O estudo faz parte do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (Pibic) e teve como participantes os alunos do curso de História da Unicap, Aramis Macedo Leite Júnior e Luisa Ximenes Santos.

Eles contam que a idéia surgiu em 1909, após a celebração eucarística do Dia de Ação de Graças americano que ocorreu na Catedral de St. Patrick, em Nova York, na qual estava presente o corpo diplomático das Organizações dos Estados Americanos, OEA. Depois da missa, durante uma recepção oferecida pelo governo dos EUA a diplomatas de países americanos, o cardeal James Gibbons expressou o desejo de que todos os países da América compartilhassem a data, o que foi endossado pelo secretário de Estado dos Estados Unidos, Philander C. Knox. O então embaixador brasileiro nos EUA, Joaquim Nabuco, estava na festa e também gostou da idéia. Ele enviou um telegrama ao Jornal do Commércio, do Rio de Janeiro, relatando as conversas. 

Luisa, Padre Ferdinand e Aramis

O jornal divulgou o material de Nabuco em 27 de novembro. O artigo foi lido pelo professor, poeta e jornalista Carlos Maximiliano Pimenta de Laet. Motivado pelos integrantes do Círculo Católico do Rio de Janeiro, foi ele quem encaminhou uma petição ao Congresso Nacional solicitando a implantação de um dia de agradecimento a Deus no Brasil. “Acreditamos que a morte de Nabuco, em 1910, impediu que o projeto fosse desenvolvido. E não temos a certeza de que a petição de Laet chegou realmente ao Congresso. Por isso, o tema ficou esquecido até 1947”, detalha Aramis.

A partir deste ano, o projeto começou a vencer a burocracia graças ao gesto do filho de Carlos Laet, o desembargador Mafra de Laet, de doar o acervo do pai ao Arquivo Nacional dirigido por Eugênio Vilhena. Estudioso da obra de Carlos, Eugênio achou nos objetos o manuscrito da petição enviada ao Congresso em 1909. Ele comentou com a esposa Lúcia, que era noelista, a importância do achado. Foi quando o Núcleo Noelista do Rio de Janeiro, liderado por Alice Isnard Távora, começou a promover um Dia de Ação de Graças no Brasil.

O movimento Noel surgiu na França, idealizado pelo Pe. Claude Allez. No Brasil, ele foi introduzido em 1914 por Felipa Brandão Uchoa Cavalcanti, conhecida por Dona Felipinha. O grupo teve como sede o Colégio Coração Eucarístico do Recife. O movimento, que fomentava a participação da mulher na vida cívica. O grupo do Rio trabalhou intensamente.

Revista noelista com foto do decreto assinado pelo presidente Dutra

Em 11 de outubro de 1948, a Comissão de Educação e Cultura da Câmara dos Deputados deu parecer favorável ao pedido das Noelistas de oficializar o Dia de Ação de Graças com comemoração na última quinta-feira de novembro. Em março de 1949, o processo chegou ao Senado. Em 17 de agosto de 1949, o então Presidente Eurico Gaspar Dutra sancionou a Lei nº 781 que instituía o Dia Nacional de Ação de Graças no Brasil, que passou a ser celebrado toda quarta quinta-feira de novembro. 

foto: arquivo pessoal
Alice Távora

Os pesquisadores explicam que o Dia de Ação de Graças ganhou cunho ideológico também na América Latina. “Durante a Guerra Fria, com o acirramento do clima de medo imposto pela rivalidade entre EUA e a antiga União das Repúblicas Soviéticas Socialistas (URSS), a data passou a ser um símbolo de proteção ao comunismo”, diz Luisa. De acordo com os relatos, Joaquim Nabuco cultivava um sentimento de panamericanismo e também queria implantar um Dia Interamericano de Ação de Graças. A data teve boa receptividade, por algum tempo, em países como El Salvador, Paraguai, Colômbia, Venezuela, Guatemala, Brasil, Equador, Honduras e Uruguai.  

Para os integrantes do grupo, mais do que um estudo acadêmico, a pesquisa representou uma experiência que resultou num estudo mais detalhado da história do Brasil e da América Latina até então quase desconhecido. “É incontestável a magnitude do fato de um grupo de mulheres nos anos 40, católicas, leigas, muito bem organizadas, terem conseguido uma vitória no Congresso Nacional. É importante saber da origem do movimento que está ressurgindo em comemorações nos últimos anos. Além disso, é muito interessante redescobrir os caminhos percorridos pelas noelistas, já que as mulheres viviam sob forte opressão naquela época”, analisam os pesquisadores.

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