Unicap presente no Quilombo dos Palmares

Por iniciativa do Instituto Humanitas Unicap, Grupo Amigos no Caminho e NEABI – Núcleo de Estudos Afro-brasileiros e Indígenas – em parceria, realizaram, nos dias 18 e 19 de novembro, uma viagem, com alunos, professores e funcionários para a Serra da Barriga em União dos Palmares – AL. O objetivo era visitar e conhecer o Quilombo dos Palmares e a região.

Estando na cidade de União dos Palmares, os estudantes universitários, visitaram o museu da cidade como também “um quilombo vivo”. Quilombo Munquém. Lá, houve um encontro com lideranças do quilombo como também com artesãos da comunidade. Foi um encontro rico em humanidade onde se pôde refletir sobre a história e o legado da luta de Zumbi.

Memória

O mês de novembro, especialmente o dia 20, é considerado o Dia da Consciência Negra. A data relembra a destruição do Quilombo dos Palmares e a morte dos seus líderes, Acotirene, Ganga Zumba, Zumbi, Dandara e tantos guerreiros e guerreiras da liberdade. Essa luta histórica remonta ao final do século XVII, precisamente no ano de 1695 acontece o massacre do Quilombo dos Palmares. Foi o maior espaço de resistência de escravos durante mais de um século no período colonial (1597-1704).

Por isso, para a maior parte dos movimentos de resistência e afirmação do povo negro, que combatem o racismo, o dia 13 de maio, data oficialesca da “libertação dos escravos” pela Princesa Isabel, não representa a memória do povo negro. Isso porque, o 20 de novembro e a figura de Zumbi expressam melhor do que qualquer coisa, a luta do povo negro, pois é a responsável pelo fim da escravidão, e não a benevolência do Império decadente. Sabemos que em fins do século XIX, a escravidão era uma atividade econômica quase impossível. Não era mais rentável manter o regime de escravidão. A generosidade da Princesa Izabel é desmascarada nos tempos atuais.  Isso reflete uma politização crescente do tema. Vemos que o imaginário histórico abandonou de vez a referência à princesa Izabel e à Lei Áurea, que sempre teve um caráter ambíguo e desmobilizador, em benefício da mensagem combativa de Zumbi dos Palmares.

A República dos Palmares promovia uma sociedade sem o trabalho escravo

Foi na região, da província de Pernambuco, no final de século XVII, hoje Estado de Alagoas, no meio de muitas palmeiras (origem do nome Palmares) que surgiram os mocambos (quilombos) dos negros que fugiam da escravidão, dos engenhos, em busca da liberdade. Zumbi surge numa época em que o açúcar era o principal produto da economia colonial. Uma produção que garantia lucros à coroa portuguesa e aos senhores de engenho no Nordeste brasileiro. A destruição da República dos Palmares (Quilombo dos Palmares) se deve porque lá se promovia uma sociedade sem o trabalho escravo, representando ameaças constantes ao sistema escravista existente no Brasil. O fenômeno da quilombagem expressava toda inteligência para resistir e lutar pela liberdade por parte do escravo.

No Quilombo dos Palmares não se incluem apenas negros fugitivos, mas também índios perseguidos, mulatos e fugitivos da polícia, em geral, brancos pobres. O local chegou a reunir até 30 mil pessoas no seu auge. Um conjunto de mocambos formava o grande quilombo. Só para ter uma ideia: o maior mocambo chegou a ter 6 mil pessoas, quase a mesma população do Rio de Janeiro à época.

A agricultura no quilombo era básica, obedecendo a um sistema coletivo de trabalho, em que o milho, a mandioca, o feijão, a batata doce, a cana de açúcar e a banana eram os principais produtos de subsistência. Com o surgimento da metalurgia, a sociedade palmarina ficou dividia em camponeses, artesãos, guerreiros e funcionários. Além da fabricação de utensílios para a agricultura e para a guerra fabricaram também objetos artísticos em cerâmica e madeira. Até hoje, o Quilombo Munquém, que fica no pé da Serra da Barriga tem essa especialidade de trabalhar com o barro.

Mais de cem anos após o fim do regime de escravidão, a desigualdade entre negros e brancos é gritante e vergonhosa

A luta dos negros e negras pela sua verdadeira libertação, porém, não terminou aí. Findada a escravidão, a população negra foi marginalizada e estigmatizada pelo racismo.  Mais de cem anos após o fim do regime de escravidão, a desigualdade entre negros e brancos é gritante e vergonhosa. Dados recentes provam isso. A população negra é alvo preferencial da violência policial nas periferias das grandes cidades. As mulheres negras são as que mais sofrem a violência machista, e a média salarial de negros e negras continua sendo muito inferior a dos demais trabalhadores.

Vivemos em um país que envolve o destino de 54% da população brasileira. Neste ano de 2017, aconteceu um episódio que não deve passar em branco. A mobilização contra o racismo ganhou um elemento explosivo a partir do escandaloso “Coisa de Preto” de Willian Waack, que escancarou a hipocrisia da democracia racial no Brasil. A TV Globo, sua principal fortaleza ideológica, foi questionada pela sociedade. Já não é mais como antes. O zap deu conta de espalhar a notícia de um crime cometido por um profissional de um grande meio de comunicação do país.

O reconhecimento do Quilombo e a Zumbi dos Palmares é uma forma de combater a discriminação racial e valorizar a cultura afro-brasileira em todas as suas expressões

Qual a mensagem que fica, finalmente das homenagens prestadas a Zumbi dos Palmares? Certamente, é continuar firme na resistência e combater todo tipo de descriminação. No Brasil, a visão de um país voltado para o desenvolvimento humano foi substituída por programas de arrocho batizados de austeridade. A recordação do passado ajuda a enfrentar os desafios do futuro. Um povo não pode verdadeiramente enfrentar o seu futuro sem ter uma visão do seu próprio passado.

A iniciativa da UNICAP vem em um momento em que casos de racismo estão se acirrando. Depois da visita ao quilombo, avaliou-se que o reconhecimento deste bem cultural é uma forma de combater a discriminação racial e valorizar a cultura afro-brasileira em todas as suas expressões.

Por fim, nossa homenagem a Dom José Maria Pires, que foi um dos grandes bispos proféticos da Igreja brasileira. Era negro e sempre defendeu a causa dos afrodescendentes. Foi-se mais um dos bispos proféticos que tanto nos faltam nos dias atuais. Se estivesse vivo presidiria uma missa na UNICAP, no dia 20 de novembro de 2017.   Ele também foi o grande animador da Pastoral afro-brasileira e do movimento dos padres e bispos negros que ganhou espaço e amplitude na vida da Igreja do Brasil e também da América Latina e do Caribe, através do CELAM.

Com a ida, ao Quilombo dos Palmares, os estudantes universitários, juntamente com professores e funcionários da UNICAP, perceberam que a formação deve mobilizar todas as dimensões do ser humano. O atual Padre Geral dos jesuítas, Artur Sosa, ao passar pela UNICAP, lembrou que “somente uma mística profunda pode ajudar cada ser humano em sua integridade, no meio de uma sociedade fragmentada, dispersa e plural”.

Artur Peregrino*
* Doutorando em Ciências da Religião pela UNICAP e Mestre em Antropologia pela UFPE; Licenciado em Filosofia pela UNICAP; Bacharelado em Filosofia pela UNICAP e Bacharelado em Teologia pelo Instituto de Teologia do Recife – ITER; Especialista (SENAC) e docente (UNICAP) em EaD; prof. do Curso de Teologia na UNICAP e integrante do Instituto Humanitas – IHU UNICAP; prof. Extensionista; pesquisador do Grupo de pesquisa UNICAP/CNPq Religiões, identidades e diálogos, na linha de pesquisa Diálogos inter-religiosos; membro do Grupo de Peregrinas e Peregrinos do Nordeste – GPPN. Email: arturperegrino@gmail.com

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