Reitor defende educação como bem público em discurso para formandos
|Confira o discurso do Reitor da Universidade Católica de Pernambuco, Padre Pedro Rubens, na solenidade de colação de grau das turmas 2014.2, realizada no Teatro Guararapes, no Centro de Convenções:
Mais uma vez, nós da Universidade Católica de Pernambuco renovamos a gratificante experiência de colação de grau de várias turmas de estudantes, na mesma época em que estamos fazendo matrículas de novos alunos… Essa dinâmica não apenas se repete a cada ano, mas renova o sentido de nossa missão.
Os estudantes das turmas 2014.2 despedem-se da universidade, rodeados por amigos e familiares, concluindo uma etapa importante de suas vidas, ao mesmo tempo em que iniciam um novo momento. Misturam-se os sentimentos de saudades e expectativas: primeiro, a alegria de ter passado no processo seletivo, depois as dúvidas sobre o curso ou até sobre a escolha da universidade, algumas expectativas sobre sua própria capacidade intelectual, financeira ou existencial de concluir o projeto iniciado… No processo, junto com os conhecimentos novos, descobertas inéditas e relacionamentos importantes, mesclando questionamentos e sentimentos diversos… Enfim, uma experiência de vida, muito além de um mero percurso acadêmico.
Talvez algumas questões permaneçam e novas expectativas entrarão em pauta, mas, agora, a partir de uma certeza inalienável: vocês não são mais os mesmos, cada um é muito mais e muito melhor que antes. De fato, a Unicap transforma: ela transformou as nossas vidas de educadores, ela transforma gerações de estudantes.
Nós, os professores e funcionários aqui representados, fazemos a experiência de sermos transformados com cada nova geração de estudantes que chega, com cada dificuldade que exige soluções, com cada desafio que vira projeto, com cada utopia que se torna realidade. Trabalhamos com a convicção de que nosso campus é a cidade, nossa missão a cidadania e o nosso horizonte é o mundo… “De Pernambuco para o mundo”, parafraseando uma frase antiga de rádio que ecoa ainda hoje”, traduzindo os sentimentos oceânicos do povo pernambucano.
Há mais de sete décadas, portanto, a Unicap forma e transforma a vida de várias gerações de estudantes. Nossa missão é uma grande aposta que, inspirada na tradição educacional jesuíta, pode ser traduzida assim: a qualidade acadêmica que visa à excelência humana. Apostar na transformação das jovens gerações é acreditar que uma sociedade melhor é possível, uma sociedade sustentável que mereça o nome de “humanidade”.
E, dentro de uma visão humanística, queremos imprimir o diferencial de nossa universidade em tudo o que fazemos: da acolhida “portas abertas” no vestibular à colação de grau. Este ato solene, por exemplo, para além da formalidade necessária, traz a marca do carinho dos que o prepararam, nos mínimos detalhes, com alguns gestos concretos e diferenciados: o estilo já vem se consagrando tanto no culto ecumênico quanto na colação mas, hoje, de forma pioneira e única, vocês receberão o diploma oficial, devidamente assinado e não apenas um canudo simbólico e vazio, somente para a foto…
Agradeço, de coração, aos pais e familiares que, para fazer essa aposta em vocês e na Unicap, tiveram que fazer sacrifícios e renunciar a tanta coisa para chegar até este momento. Educação é um bem inalienável, por isso, creio que vocês não se arrependerão e que logo perceberão que valeu a pena, pois o tesouro que esses concluintes carregam agora não tem preço:
– o investimento feito em vocês, ninguém poderá tirá-lo;
– o conhecimento adquirido por vocês ninguém poderá apagar;
– e a experiência feita por vocês é uma “senha” para a vida toda…
Agradecendo a vocês pelo empenho feito, porém, faço questão de registrar o meu protesto contra o sistema educacional brasileiro, que não investe suficientemente no seu maior patrimônio que é a juventude e não qualifica devidamente os profissionais dos quais o nosso Brasil necessita. O maior desejo dos que fazem a Unicap é de que a educação seja, de fato, um bem público, e a nossa universidade seja acessível a todos, sobretudo aos mais necessitados. O Brasil tem avançado muito nas políticas públicas e a Católica de Pernambuco, não somente aderiu a todos os programas propostos, mas faz parte das associações que avaliam, propõem e reivindicam mais benefícios para os nossos estudantes. Ainda estamos longe de atender às necessidades daqueles que nos procuram e daqueles que nem se atrevem a acreditar que é possível assumir o desafio conosco. Não desistiremos do Brasil, nem da Educação como meio de transformação, nem da humanidade que nos habita e nos faz ter esperança.
Por isso queremos, mais que nunca, reafirmar alguns valores fundamentais, sobretudo porque vocês concluem o curso e entram em outro período da vida, profissional ou continuidade de estudos, em um momento muito específico. Vivemos um contexto de muitas incertezas no Brasil, uma crise financeira internacional prolongada e uma onda generalizada de violências. Seja nos presídios ou nas famílias, seja nas cidades, tanto nas periferias quanto no coração dos países desenvolvidos, persistem sinais da violência humana. Em Paris ou no Recife, o medo faz sombra e a capacidade humana de reinventar a violência assombra qualquer um.
Tudo isso faz pensar que a crise financeira, por mais que tenha causas e responsabilidades específicas, não deixa de ser apenas uma faceta de uma crise mais profunda, a crise de valores, a crise do sentido da própria humanidade. Enfim, as incertezas que frustram os brasileiros, desmascaram projetos de um desenvolvimento econômico que não respeita a natureza, nem a dignidade de toda pessoa, nem muito menos a fraternidade universal a partir de um valor absoluto, Deus pai de todos. Respeitando a posição de não crentes e agnósticos, ouso dizer que não se trata de uma questão de religião, mas vivemos um problema de “falta de fé”: primeiro, falta fé na vida e falta confiança no próprio ser humano; segundo, para os que creem, a fé na vida é indissociável da fé em Deus.
Longe de querer desanimá-los evocando esses traços de nossa realidade contemporânea, gostaria, na verdade, de renovar a aposta da Unicap na educação da juventude.
E, assim como vocês conseguiram vencer os primeiros desafios da experiência universitária, temos tudo para crer que vocês poderão assumir as responsabilidades que a transformação da sociedade necessita, a partir do lugar que cada um ocupará. Não se trata de impor a vocês uma sobrecarga de responsabilidade: vocês não são salvadores da pátria, mas podem contribuir muito. Desejo assim animar a todos e a cada um de vocês a guardar, junto com o diploma, uma esperança viva, criativa e atuante.
Concluo, tomando emprestado uma passagem de Paulo de Tarso, perseguidor dos primeiros cristãos, que se tornou apóstolo e seguidor de Jesus, tirada da carta aos Romanos: “os sofrimentos do tempo presente não tem proporção com o que há de vir… sabemos que a criação geme e sofre como que em dores de parto… A esperança não decepciona, porque foi derramada em nossos corações pelo Espírito que nos foi dado” (Rm 8, 18s).
Caros concluintes, educadores, familiares e amigos: apostemos na esperança que habita em nossos corações e sejamos parteiros e parteiras de um mundo novo, de uma nova humanidade (cf. Rm 8).
Pedro Rubens, SJ
Reitor UNICAP, janeiro de 2015.