Historiador debate a relação entre masculinidades, violência e fascismo no Brasil
|O pesquisador Durval Muniz de Albuquerque Júnior foi o convidado do Café Histórico que promoveu debate intitulado Masculinidades, Violência e Fascismo na História do Brasil. O evento, que aconteceu no fim da tarde no auditório Dom Helder Camara, foi promovido pelo diretório acadêmico de História com apoio do Cactos. A mesa foi composta pelo Prof. Dr. Walter Amaral e pela aluna Talita Oliveira, que representou do Diretório Acadêmico do curso de História da Unicap.
Bem-humorado, o professor do departamento de História da Universidade Federal do Rio Grande do Norte relacionou os temas do debate a estudos de gênero, relações de poder, conservadorismo, questões ideológicas e aspectos socioculturais brasileiros. De acordo com ele, esses aspectos são norteados por uma masculinidade tóxica.
“Os estudos de gênero estão sendo demonizados, não só no Brasil, mas no mundo inteiro porque são fundamentais para questionar a naturalização dos papéis de gênero, a naturalização dos lugares de gênero e, portanto, a naturalização dos lugares de poder. Por trás das críticas aos estudos de gênero, está o ressentimento masculino com a perda de poder no mundo. Está o ressentimento dos machos que têm cada vez menos espaço. Daí o ódio dessas pessoas, por exemplo, à cultura, à inteligência, à universidade porque é no âmbito das artes e da cultura, no âmbito da produção intelectual que mais se faz questionamentos tradicionais do masculino e do feminino”.
Muniz credita a esse tipo de masculinidade tóxica alguns elementos que deram origem ao fascismo que, em sua visão, vai além do regime totalitário italiano ocorrido entre as décadas de 1920 e 1930. “O fascismo é uma forma de se relacionar com o mundo, é um modelo de subjetividade que está dentro das pessoas e que, necessariamente, não precisa ir para dentro do Estado para existir”, disse o historiador explicando que o fascismo pode existir até em sociedades formalmente democráticas. Ainda de acordo com a análise de Muniz, o fascismo não respeita a alteridade (natureza ou condição do que é outro, do que é distinto).
Em outro momento da explanação, Durval falou que o conservadorismo está ligado ao medo de mudanças que estão acontecendo na formatação das famílias, nas relações identitárias do mundo do trabalho e do consumo e também à reação ao pensamento crítico. “Há muita gente com medo de quem pensa. Quem está no poder nunca gostou do pensamento. Os professores é quem têm essa missão difícil, que é ensinar a ler, escrever e a pensar”.
O historiador fez uma abordagem sobre o que ele classifica como sendo reação das elites a movimentos de ascensão social das classes mais pobres. “Parece risível, mas não é, que o presidente que mais fez para que o Brasil se tornasse uma sociedade efetivamente capitalista esteja preso. Lula não fez nenhuma revolução socialista, muito pelo contrário: ele incluiu as pessoas, através do consumo, do salário, da renda e isso é o básico de qualquer sociedade capitalista que mereça esse nome. Lula levou o pobre para os bancos para se tornarem vítimas dos juros, das cobranças do Bradesco, do Itaú que imediatamente tiveram de criar um Personalitè porque os pobres não podiam se misturar com os ricos”, disse Muniz ao ser interrompido pelos aplausos do público que lotava o auditório.
O professor disse ainda que as elites brasileiras operam com a lógica da distinção, “que é uma lógica pré-burguesa”. Para Muniz, a mentalidade da elite nacional ainda é senhorial e a do restante da sociedade é servil, herança do período escravagista. Ao final da palestra, ele refutou a crença de que as escolas e universidades estariam doutrinando estudantes. “Ninguém quer uma escola que doutrine. A escola não é lugar de doutrinação, a escola é lugar de discussão. Discussão-debate não é doutrinação. Aqueles que acusam a escola de doutrinação são os que fazem a doutrinação. São eles que não querem o contraditório, a troca de ideias, o questionamento, a opinião diferente. O fascista é esse, é aquele que não aceita que outro pense diferente, seja diferente dele, a ponto inclusive de querer matar o outro”.