Congresso Publius questiona a necessidade de uma nova Constituição
|A Universidade Católica de Pernambuco, em conjunto com a Universidade Federal de Pernambuco, está realizando o VI Congresso de Direito Constitucional – Publius 2017. Esta edição tem como tema: “Processos Desconstituintes e Democracia no Brasil: Precisamos de uma nova Constituição?”
Segundo os organizadores, o objetivo do evento é reunir pessoas que se preocupam com o Direito Constitucional, com a democracia, com cidadania e que se preocupam com o que está acontecendo hoje no país, para tentar refletir sobre “esse processo de construção democrática e cidadã no Brasil, nem sempre tranquila, quase sempre acidentada e cheia de vicissitudes e problemas típicos de um país latino-americano, de jovem democracia e tudo que a gente pode eventualmente apontar nessa linha”, explica professor João Paulo Allain Teixeira, membro da coordenação do Congresso.
A sessão solene de abertura do evento aconteceu na noite desta quarta-feira (13), com a conferência “A ruína da presunção de inocência”, do professor de Direito Constitucional da Universidade Federal do Paraná, Jacinto Nelson de Miranda Coutinho. Após a conferência, foi realizada mesa-redonda sobre “Garantias Constitucionais Penais e Processuais”, presidida pela professora Karina Nogueira (Unicap) e com a participação dos professores Alfredo Copetti Neto (Unijui/Unioeste) – Garantismo Sem Garantias; Francesco Rigano (Unipv-Itália) – A criminalização da violação dos direitos fundamentais: o impacto do direito internacional sobre o processo a partir do caso Taricco na Itália; e Sandro Staiano (Unina-Itália) – O princípio constitucional da legalidade em matéria penal: erosão das jurisdições e mudança do parâmetro.
Na abertura do Congresso, o vice-coordenador do Programa de Pós-graduação em Direito da Unicap, e um dos coordenadores do encontro, professor João Paulo Allain Teixeira, cumprimentou e agradeceu a presença de todos e disse: “O Publius está na edição 2017 e tem a proposta de enfrentarmos a seguinte pergunta: precisamos de uma nova Constituição? Esse é um momento oportuno para discutir isso no Brasil, já que as coisas estão acontecendo de forma imprevisível e, sobretudo, na aproximação dos 30 anos da Constituição de 1988, a partir do próximo ano. Pelo que a gente escuta sempre por aí, alguns já defendem abertamente a necessidade de uma nova Constituição. Eu acho que esse é um tema que precisa ser enfrentado com muita cautela. Então, esse é um evento realizado anualmente em parceria com a Universidade Federal de Pernambuco, um momento raro, importante para juntos debatermos e refletirmos sobre os caminhos do Direito Constitucional do nosso país. Quero dar as boas-vindas a todos, quero desejar um bom evento, bom trabalho e muitas ideias e reflexões que saiam daqui e que resultem em muitos textos, artigos, acordos de cooperação e convênio, tudo que a gente deseja na área acadêmica”.
Em seguida, a coordenadora do PPGD UFPE e co-executora do VI Congresso Publius, professora Juliana Teixeira Esteves, frisou: “Esse convênio que a Unicap e a UFPE estão fazendo tem como objetivo unir forças e pensar o Direito como está sendo proposto, o Direito que é desejado pela comunidade acadêmica e por todos os brasileiros. Baseada no tema do evento, essa pergunta de uma nova Constituição vem questionar os vários aspectos que estão englobados ali. Estamos em um momento de várias transições, de momentos difíceis no Brasil. Vários aspectos constitucionais sendo violados e isso precisa ser discutido, debatido e pensado pela comunidade acadêmica. Então, sejam bem-vindos ao evento e aproveitem”.
A palestra de abertura foi feita pelo Doutor em Direito Penal pela Universidade de Roma La Sapienza, Itália, professor de Direito e Processo Penal da Universidade Federal do Paraná, procurador do Estado e advogado, Jacinto Nelson de Miranda Coutinho, que abordou o tema da presunção da inocência.
Ao iniciar, o conferencista agradeceu pelo convite feito pelo professor Marcelo Labanca, coordenador do PPGD Unicap e um dos coordenadores do Congresso. Professor Jacinto Coutinho ressaltou a presença, segundo ele, de um dos maiores constitucionalistas do mundo, o professor Paolo Caretti, dizendo que ficasse registrado sua homenagem e honra de poder contar com sua presença no Auditório durante o evento. “Paolo Caretti é, de fato, um dos grandes constitucionalistas do mundo, professor da Universidade de Firenze (Itália) e professor de todos nós”, afirmou o palestrante.
Em seguida, disse que era de se louvar o trabalho da organização em realizar o evento e, que no seu modo de avaliar, aqui será grandioso porque o tema é o tema do Brasil de hoje, principalmente a razão pela qual todos aprenderão nesses dias. Ressaltou ainda que a indagação do tema central sobre a necessidade de uma nova Constituição é uma coisa que coloca todos para pensar de verdade a respeito.
Na conferência, o professor Jacinto Coutinho fez uma análise do momento que estamos vivendo, a partir de Gramsci. Questionou a razão pela qual a situação de negação das leis e negação da Constituição, em que a população brasileira está vivendo.E dessa forma, questionar se é preciso mesmo mudar a Constituição. Para descrever o momento pelo qual o país passa atualmente, o conferencista usou Gramsci e a noção de interregno, a ideia de que “o velho morreu e o novo não nasceu ainda”, ou pelo menos “o velho está morrendo ainda e o novo não consegue nascer”. “Esse período de hiato, um interregno, cria um monte de situações complicadas. Uma delas, por exemplo, é esse ódio de graça na sociedade. A sociedade tem um ódio que a impressão que você tem é que se você riscar um fósforo explode. De repente, você pergunta por que está acontecendo isso, e não se sabe dizer, mas também, não se sabe dizer para onde isso vai. Cada vez que se faz a pergunta onde se vai parar, não se sabe responder. Então, perguntar o que sempre teve, que dá liga para nós, que é a Constituição, mas ela não basta. Por que ela não basta? Ela não basta porque ela não serve ou ela não basta por que não a estão cumprindo? Se você quiser decência, você precisa cumprir o que está lá, mas por que não estão cumprindo? Por isso, eu, particularmente, acho que para algumas coisas há um interregno, mas no geral ele não está. Eles estão criando uma ideia de interregno para poder, dentre outras coisas, retirar o que se tem de conquista democrática, dentre elas, os Direitos. Isso, nós estamos vivendo dentro do Congresso Nacional, já fizeram isso com o trabalho, vão fazer isso com a previdência, ou seja, tirar direito do povo, é isso que os interessa. Só que isso é uma questão econômica, que tem dois bolos e se saiu de um bolo vai para o outro. Então, se você tira de alguém, isso vai para alguém. Não tem jeito, isso é sempre dessa maneira”, explicou o professor Jacinto Coutinho.
O coordenador do PPGD Unicap, professor Marcelo Labanca, falou da importância da temática da conferência de abertura do Congresso Publius. “A palestra do professor Jacinto Coutinho foi bastante importante, principalmente, numa época em que estamos discutindo processos erosivos em garantias penais e o tema da palestra dele foi a “ruína da presunção da inocência”.
Congresso Publius
O evento é realizado desde 2014 e foi criado por três professores da Universidade Católica de Pernambuco, Marcelo Labanca e João Paulo Allain Teixeira, coordenador e vice-coordenador do Programa de Pós-graduação em Direito – PPGD Unicap, respectivamente, e Gustavo Santos, coordenador nacional da área de Direito da Capes. O Congresso Publius, que faz parte do Grupo de Pesquisa REC – Recife Estudos Constitucionais, e é realizado anualmente, é uma marca importante no debate jurídico no Nordeste.
“Publius era o nome utilizado por Alexander Hamilton, James Madison e John Jay, os “Founding Father” (pais fundadores) dos Estados Unidos, na campanha federalista. Durante o processo de convencimento em torno da importância da constituição americana, quando eles sairiam de uma confederação para uma federação, Hamilton, Jay e Madison assinavam os artigos federalistas como Publius. Portanto, a palavra tem uma carga simbólica do ponto de vista do que ela invoca para o debate na área do Direito Público e do Direito Constitucional por conta dessa lembrança do processo de construção da constituição dos Estado unidos, que é uma referência para o debate constitucional mundial”, explica professor João Paulo Allain Teixeira.
O tema de 2016 foi voltado a discutir o Marco Hermenêutico (interpretativo) da Constituição de 1988, olhando para a atividade dos juízes e tribunais no processo democrático brasileiro. “Nesta edição, a gente está tentando discutir o papel das reformas e mudanças constitucionais, naquilo que a gente caracterizou como processos erosivos, ou seja de destruição do espírito constitucional de 1988, a partir de mudanças, algumas formais, a partir de processos de emendas constitucionais, como por exemplo a Emenda 95, que simplesmente suspendeu a Constituição. Eliminou a possibilidade de pensar um estado social no Brasil, com o congelamento de investimentos na área da educação, saúde, etc. E mudanças que são informais, a partir de um processo de interpretação e reinterpretação da Constituição pelos tribunais, particularmente, o Supremo Tribunal Federal, que relativiza direitos, como a questão da presunção de inocência. Tudo isso que vai na contramão do que foi o espírito da Constituição de 1988, que é marcadamente uma Constituição pós-autoritária, porque marcou um processo de redemocratização do País e uma esperança muito grande do que viria ser esse novo projeto de Brasil. A gente está com quase 30 anos de 1988 e a grande pergunta que o Publius faz esse ano é o seguinte: precisamos de uma nova Constituição? O título do evento, inclusive, provocativamente adota o questionamento” finaliza professor João Paulo.
Acesse a programação completa no site https://congressopublius.com.br/