Católica recebe cineasta Kleber Mendonça Filho
|A especialização em Estudos Cinematográficos da Unicap recebeu, na noite desta quinta-feira (14), no anfiteatro do bloco G4, o cineasta Kleber Mendonça Filho. Ele conversou com alunos, professores e convidados sobre o seu novo filme Aquarius. O longa-metragem, estrelado por Sônia Braga, concorreu à Palma de Ouro do Festival de Cannes, na França. Entre os críticos de cinema, houve uma grande expectativa de que ela ganhasse o prêmio de melhor atriz.
“Além de produtor e programador, um dos grandes nomes do momento do cinema nacional. É uma honra recebê-lo”, disse o professor Cláudio Bezerra ao apresentar o convidado, ressaltando a experiência de crítico de cinema no Jornal do Commercio e da revista Continente e de programador do Cinema da Fundação Joaquim Nabuco.
No começo da conversa, Kleber relembrou um pouco de sua trajetória enquanto cineasta. “Aquarius é o meu segundo longa de ficção. A minha formação foi fazendo curtas. Passei 20 anos fazendo isso”, disse mencionando o seu primeiro longa O Som ao Redor (2010).
O diretor relembrou também um dos primeiros trabalhos no audiovisual. O curta Paz a esta Casa (1994) “apresenta vários elementos que estão de volta em Aquarius“. O que há em comum aos dois trabalhos é o tema da demolição. “É algo extremamente forte, violento. As pessoas viveram, amaram naquele espaço. Aí vêm questões de mercado. O dono pode ganhar mais dinheiro derrubando um prédio e fazendo um estacionamento na área. Isso está cada vez mais comum nas cidades brasileiras”, afirmou.
Aquarius conta a história de Clara (Sônia Braga), uma proprietária de um dos apartamentos do edifício de mesmo nome que vive a ameaça de ser demolido para atender às pressões do mercado imobiliário. Kleber disse que o filme não derivou do vídeo Paz a esta Casa. “Só percebi que Aquarius trazia elementos de Paz quando finalizei o filme e revi o curta depois de muitos anos”.
A degradação por qual passa as cidades brasileiras e a relação com os hábitos do cinema também foram abordadas durante o encontro. De acordo com Kleber Mendonça Filho, o Cinema São Luiz, no Centro do Recife, chegou a atrair entre 20 mil e 30 mil espectadores por semana nas décadas de 60 e 70. “O São Luiz foi o único que conseguimos salvar. Em São Paulo, por exemplo, nenhum cinema antigo foi preservado. Ou se transformaram em igrejas, supermercados ou simplesmente foram demolidos. Essa arqueologia é também uma ideia que está por trás de Aquarius“.
Kleber foi perguntado sobre a construção dos personagens. “Não é interessante criar regras para os personagens. Eles precisam ter vida própria. Você não pode impor muita coisa”.
Sobre a participação de Sonia Braga em Aquarius, ele disse que até então não havia pensado nela para viver a protagonista. “As pessoas responsáveis pelo elenco e o fotógrafo Pedro Sotero conheciam alguém ligado a ela e enviaram o roteiro. Em menos de 48 horas, ela respondeu aceitando fazer o filme”, contou Kleber ressaltando que o que fez a atriz aceitar o papel foi justamente o entusiasmo pelo roteiro.
Protesto em Cannes – Na semana em que Aquarius foi exibido no Festival de Cannes, o Brasil vivia o ápice da crise política que culminou no afastamento da presidenta Dilma Rousseff. A equipe do filme se posicionou contra. A repercussão foi mundial. “Foi um protesto simples e elegante. Não me arrependo. Se tivesse de fazer, faria exatamente como foi feito”.
O cineasta opinou sobre o momento político pelo qual passa o Brasil. “O País está completamente insano, estranho, dividido e agressivo. Certas atitudes te transformam num líder político e eu não sou líder político de absolutamente nada. Só faço filmes. A questão é que eu tenho opinião. Mas eu não sou filiado a nenhum partido, nunca fui do PT. Já votei em candidatos do PT, mas eu não sou petista. Nunca fui comunista, nem mesmo na adolescência”.
O tom político permanceu por mais algum tempo quando Kleber foi perguntado sobre o ‘rótulo’ de cinema autoral e a parceria com a Globo Filmes. “O Brasil tem uma falta de traquejo, uma falta de treinamento democrático na forma como o brasileiro opera que é estranhíssimo quando um cineasta que faz os filmes que eu faço, esteja fazendo uma co-produção com a Globo Filmes. Na verdade, eu acho que isso deveria ser comum porque o discurso da grande mídia é sempre enlatado para ser conservador, quando numa real democracia a grande mídia deveria ser capaz de juntar discursos dissonantes”.