Assessoria de Relações Internacionais da Católica promove seminário sobre os 15 anos do 11 de Setembro
|A Assessoria de Relações Internacionais e Interinstitucionais da Universidade Católica de Pernambuco promoveu, na manhã desta quarta-feira (9), o seminário “O 11 de Setembro revisitado 15 anos depois”. O evento contou com a participação do professor de Direito Constitucional, Helder Oliveira, e do advogado João Vitor Paiva, que abordaram o tema “Terrorismo e Direitos Fundamentais”; do professor de Direito do Estado da Unicap, Felipe Sarinho, que tratou do tema “Do fim da história aos neoconservadores: um ensaio sobre o 11.09”; e do cientista político e assessor de Relações Internacionais e Interinstitucionais da Católica, Thales Castro, que falou sobre “As assimetrias no Direito Internacional diante do cenário internacional pós 11.09: desafios e perspectivas”. A mesa foi presidida pelo Prof. Dr. Natanel Sarmento.
O professor Felipe Sarinho começou o debate fazendo uma análise histórica a respeito dos acontecimentos anteriores ao atentado de 11 de Setembro. “A União Soviética começou a entrar em um declínio a partir da década de 70 e não consegue se reerguer. Então, pela caída desse poder, ela deixa os Estados Unidos como a grande potência mundial. Existe um livro chamado “O Fim da História” que diz que toda disputa humana deveria ser ideológica. Quando não houver mais uma disputa ideológica, nós não poderemos mais falar da história humana; o comunismo chegou ao fim e o liberalismo ocidental se tornou o único modelo que sobreviveu”.
“Quando se fala no triunfo dos Estados Unidos em ser reconhecido como uma grande potência mundial, é um equívoco dizer que isso equivale ao triunfo de uma democracia liberal. O modelo de democracia liberal implementado nos EUA não tem nada em comum com o modelo implementado na Europa; então, talvez a vitória não tenha sido de uma democracia liberal, mas sim a vitória de um país que se transformou, ao longo do tempo, em vários modelos de democracias. E essa democracia liberal não pode ser confundida com o modelo de neoliberalismo que vai ser implantado na Inglaterra e exportado para outros países. Seguindo a lógica do ‘Fim da História’, nós estaríamos agora vivendo um momento de cooperação e paz mundial; não teríamos mais nenhuma tensão entre os EUA e a União Soviética.
Nos anos 90, os EUA funcionavam como a ‘grande polícia do mundo’. Naquele momento, ele atuava nos quatros cantos do mundo e estava em uma aparente paz; havia a sensação de poder andar tranquilo pelas ruas. Enquanto isso, a Rússia conseguiu se reequilibrar. Isso não entrou no radar do mundo até pouco tempo atrás. O neoliberalismo se consolida durante o que nós chamamos de ‘Doutrina Bush’ que permitiu que George W. Bush começasse uma guerra preventiva; a ideia era atacar o inimigo antes que ele atacasse. Essa é uma das causas da crise de 2008. Os EUA se fecharam e não conseguiram perceber a criação de uma bolha imobiliária. Nesse mesmo ano, Barack Obama foi eleito presidente. Isso gerou uma superação da tensão; Obama chegou com uma imagem mais leve, tentando distensionar as relações internacionais. O modelo dele tem características do neoconservadorismo, mas ele era mais tolerante e faz com que a importância da ONU cresça”, explicou o professor Felipe Sarinho.
O professor Thales Castro falou sobre as eleições presidenciais americanas e a assimetria no Direito Internacional. “11 de Setembro… 9 de Novembro… E tem outro Novembro importante: 27 anos da queda do Muro de Berlim. Ao cair o Muro, havia uma esperança de reconciliação internacional, mas se passaram 27 anos e muros estão sendo erguidos. Uma das propostas da campanha do presidente eleito Donald Trump era de erguer um muro na fronteira com o México e que o presidente mexicano teria que arcar com as despesas do muro. Há um mês, os colombianos disseram não ao acordo de paz. O Reino Unido votou para sair da União Europeia. Nessas assimetrias, vem um sentimento de ranço, de angústia existencial. Estamos diante de muitos martírios”.
E prosseguiu: “O 11 de Setembro é um marco e Trump, eleito ontem, fecha essa vaga. É uma retórica. O slogan dele é ‘let’s make America great again’, que quer dizer ‘vamos tornar a América grande novamente’. Eu interpreto isso não como um sinal de grandeza, mas como um declínio; a eleição de Trump mostra uma nação acuada. Trump não venceu, Trump atropelou. Se você for ver os dados e números, foi um atropelo de uma pessoa de fora da política. Ele tem maioria na Câmara, maioria no Senado, vai colocar 3 ou 4 na Corte. O americano médio está na situação de uma crise existencial muito grande. Trump, com manipulação psicoemocional, conseguiu conquistar esse eleitor médio”.
O advogado João Vitor Paiva continuou a discussão a respeito do terrorismo e dos direitos fundamentais da pessoa humana. “Não só o conceito de terrorismo é indeterminado, mas o próprio conceito de direitos fundamentais, direitos humanos, liberdades públicas; existe uma grande confusão, uma grande indeterminação desses conceitos. Direitos naturais são direitos ínsitos a natureza humana; o fato de sermos humanos nos garante diversas prerrogativas de direito. Esses direitos são pré-positivos, pois eles independem de positivações e veiculações desses direitos em qualquer norma, em qualquer carta de direitos ou em qualquer espaço. Já na perspectiva de direitos humanos, eles partem de uma perspectiva mais internacionalista, que é uma perspectiva de consagração em cartas e documentos internacionais, como a declaração do direito do homem e os diversos tratados que consagram esse direito. Também são direitos ínsitos ao homem, são direitos pela nossa própria natureza humana, mas que estão vinculados dentro de documentos internacionais. Então, dito isso, o que seriam os direitos fundamentais? Eles continuam sendo ínsitos a nossa natureza humana, mas a grande diferença é que para se constituir um direito fundamental, ele deve ser veiculado em um documento e esse documento é chamado constituição; estamos falando de um direito fundamental a auto-determinação do indivíduo, sendo que esse direito está localizado dentro da constituição.”
João Vitor Paiva então prosseguiu falando sobre o perfil histórico do conceito de direitos fundamentais. “Os direitos fundamentais se confundem com a própria história do constitucionalismo. O rompimento do Estado Absoluto para o Estado Liberal é um marco do que nós passamos a chamar dos direitos fundamentais de primeira geração. O rompimento liberal para o estado social seria um segundo marco dos direitos fundamentais e para os moldes do estado neoliberal. Essas novas gerações acompanham esse processo histórico. Os direitos de primeira geração são o direito da liberdade, liberdade de associação, liberdade de reunião, ou seja, o Soberano não poderá soltar e prender ao seu bel prazer, ele tem que seguir uma legalidade. Junto a consagração dos direitos fundamentais de primeira geração, surge alguns abusos aos setores mais fracos, na época da Revolução Industrial. O decurso histórico nos mostra que não basta o estado parar de interferir na vida do ser humano, mas agora o Estado tem que prover elementos para garantir que a burguesia não explore o proletariado. Os direitos fundamentais de segunda geração surgem a partir desse momento de desgaste do estado liberal, onde o estado não iria intervir na vida individual, mas agora ele deve intervir para diminuir as desigualdades e nivelar os setores humanos. O terceiro momento, da modernidade no século XX, os direitos são de fraternidade, direitos do consumidor, direitos ambientais, direitos a paz; não basta ser livre, não basta ser igual, tem que ter fraternidade, estar em ambientes de paz, de esperança e respeitar o meio ambiente.”
O professor de Direito Constitucional Helder Oliveira prosseguiu a fala de João Vitor Paiva com os conceitos e definições de terrorismo. “Podemos observar no Art. 4º da constituição um conjunto de princípios que norteiam o Estado Brasileiro nas suas relações internacionais. Os direitos fundamentais, em todas as constituições brasileiras, eram tratados em segundo plano, ficavam no final das constituições. No aspecto de prevenir a prática do terrorismo, nós temos a convenção de 1973, ratificada no Brasil em 1999, a convenção interamericana contra o terrorismo de 2003, a convenção internacional para a supressão do terrorismo em 2002 e a partir daí é possível ver que essas convenções tem muita influência dos ataques de 2001. A pergunta que se impõe, principalmente dentro dessa perspectiva dos direitos fundamentais, é o que é terrorismo? A gente tinha, em 1973, a famosa lei de segurança nacional e até pouco tempo ela era usada como parâmetro para definir o que seria o crime de terrorismo. O Art. 20 da lei de segurança nacional diz ‘seria terrorismo atacar, devastar, esfaquear, roubar’ e assim por diante, mas peço que vocês se atentem para uma parte em específico que diz: ‘seria crime de terrorismo qualquer uma dessas práticas se fosse por inconformismo político ou para a obtenção de fundos destinados a manutenção de obrigações políticas clandestinas ou subversivas’. Durante muito tempo houve a discussão sobre o que seria esse crime de terrorismo e o parâmetro que se tinha para definir isso era esse Art. 20 da lei de segurança nacional. Ao passar do tempo, os juízes deixaram de aplicar esse artigo por considerá-lo incompatível com os direitos fundamentais adotados pela constituição de 1988. Em decorrência dos tratados internacionais e do fato de que nós sabíamos que o Brasil seria sede dos dois maiores eventos desportivos do mundo, começou o debate e contestações que deram origem a lei anti-terrorismo de 2016. O Art. 2 dessa lei diz: ‘ terrorismo consiste na prática por um ou mais indivíduos dos atos previstos neste artigo, por razões de xenofobia, discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia e religião, quando cometidos com a finalidade de provocar terror social ou generalizado, expondo a perigo pessoa, patrimônio, a paz pública ou a incolumidade pública’. A questão que isso gera é o que pode ser classificado como terror social ou generalizado? Quem vai ter o condão de dizer o que é ou não terror social? Então temos um problema de interpretação da própria lei”, questionou Helder Oliveira.