Exploração sexual em grandes eventos é tema de debate na 11ª Semana da Mulher da Católica
|O auditório do CTCH ficou pequeno diante do interesse do público em acompanhar a palestra Copa, mesa e cama: autonomia da mulher e exploração sexual em grandes eventos. A atividade, que fez parte da programação da 11ª Semana da Mulher na Católica, foi transferida para o teatro do bloco B. Os palestrantes foram a professora da Unicap Andrea Almeida Campos, doutoranda em Psicologia na área de Família e Interação Social; e o também doutorando em Psicologia Clínica pela Unicap José Orlando Carneiro Campello Rabelo, professor da Associação Caruaruense de Ensino Superior. A mediação do debate foi da coordenadora do curso de Serviço Social da Universidade, professora Odalisca Moraes.
Orlando foi o primeiro a falar. O seu discurso girou em torno da relação entre prostituição, gênero e direitos humanos. O pesquisador discorda de que a venda do corpo feminino para fins sexuais é uma questão de autonomia ou de escolha. “A prostituição tem conceito difuso, está ligado essencialmente à vulnerabilidade e exclusão social”.
Dados apresentados por ele revelam uma situação preocupante no Brasil. Em 2002, o País tinha 241 rotas de tráfico sexual. Sendo 131 internacionais, 78 interestaduais e 32 intermunicipais com destaque para ocorrências em Belém do Pará. “No interior de Pernambuco é mais comum do que se imagina encontrar pais e mães vendendo filhas para a prostituição”. Orlando mostrou também um pouco do perfil dessas vítimas usando informações do Ministério da Saúde. “Quarenta por cento das prostitutas são mulheres jovens, que estão há mais ou menos quatro anos na profissão. Quase sempre já são mães e arrimos de família”.
Para Orlando, a prostituição também é uma questão de gênero. “A sexualidade feminina ainda está submissa à masculina. Se o homem procura a prostituta, há uma tolerância. Se a mulher procurar um “boy”, ela é logo alvo de preconceito.”
E foi justamente essa estrutura patriarcal da sociedade o ponto de partida para a apresentação da professora Andrea Campos. Ela trabalhou o tema sob a perspectiva histórica, começando por citar o filósofo holandês Caspar Barlaeus, que viveu no Brasil Colônia do século XVI. “Não existe pecado do lado de baixo do Equador”, frase dita em alusão ao nudismo das índias. Para Andrea, essa visão distorcida da sexualidade da mulher brasileira persiste até hoje.
Para explicar como esse preconceito se formou, a professora contou vários exemplos ao longo da história. Um deles se deu quando Jerônimo Albuquerque, cunhado de Duarte Coelho, foi capturado pelos índios Caetés durante guerra pela colonização de Olinda. Segundo a professora, esta tribo era canibal e tinha a tradição de oferecer uma de suas mulheres para a última noite de sexo do prisioneiro. A escolhida foi a filha do Pajé, Tabira. Ela se apaixonou e pediu clemência. “Brancos e índios selaram a paz, mas o episódio não tem nada a ver com lubricidade e sim com amor”.
Ainda na época colonial, as leis portuguesas regiam o controle social no Brasil. “No século XVI, se o estupro fosse a uma escrava negra ou a uma meretriz, simplesmente não havia pena. Se fosse a uma branca, era pena de morte. Ao longo do tempo isso foi melhorando, mas até hoje há resquícios desse patriarcalismo. Imaginem se uma prostituta vai a uma delegacia denunciar o estupro. Dificilmente ela vai conseguir registrar essa ocorrência e abrir um processo”.
Andrea explicou ainda que o turismo sexual é o prosseguimento do paradigma de nossa colonização. “Homens brancos europeus de classe superior fretam aviões e desembarcam em Natal, Fortaleza e Recife com o único objetivo de ter sexo pago”. De acordo com ela, uma prática incentivada pelo Estado brasileiro durante cerca de 30 anos como forma de trazer turistas e movimentar a economia. “Com o tempo, o estado percebeu que o turista sexual gasta menos do que o que vem com a família. E ainda há outros crimes a reboque: tráfico de armas, de drogas e de pessoas. Crimes que não só atingem as meninas, mas toda a sociedade. Daí a visibilidade maior”.
A proximidade da Copa das Confederações, Copa do Mundo e das Olimpíadas é motivo de preocupação para a pesquisadora. Dados do Ministério Público do Rio de Janeiro apresentados por ela indicam que os crimes de estupro aumentam em 208% durante grandes obras e megaeventos. “Espero a redenção da mulher brasileira durante esses eventos porque somos vítimas desse sistema patriarcal que nos oprime”, concluiu.