Páscoa lembra libertação e ressurreição

Entrevista cedida ao Diário de Pernambuco em 15/4/2017

Dei uma ajudinha aí também, pra gente meditar sobre o sentido da páscoa… no DP (Diário de Pernambuco) da ressurreição!

Qual é o significado da Páscoa?

A Páscoa tem origem na religião judaica. A tradição rabínica lembra uma antiga festa de primavera, em que os pastores ofertavam a Deus um cordeiro como agradecimento pelo rebanho. Ao se tornarem também agricultores, os descendentes de Abraão consumiam toda farinha e fermento em festa no dia anterior à colheita do trigo, porque acumular alimentos é sempre começo de injustiça. Daí o primeiro pão de trigo novo não era fermentado. Quando o povo judeu foi libertado da escravidão no Egito, guiado por Moisés, esses rituais se uniram na ceia familiar de Pessach, cujos pratos principais são o cordeiro e o pão sem fermento, lembrando agora a pressa na fuga e a proteção divina na passagem para a liberdade.

Como as diferentes religiões celebram a Páscoa?

Páscoa lembra libertação e ressurreição, crenças que unem judaísmo, cristianismo e islamismo, que são as religiões mais novas e que se tornaram as maiores do mundo, desenvolvidas no Oriente Médio a partir do Êxodo, do movimento de Moisés. Elas aprofundaram uma conotação ética da religião, que já vinha fermentando no zoroastrismo e em outras crenças da Era Axial (de 800 a 200 antes de Cristo, vários movimentos proféticos surgiram na Índia, China, Irã e Mediterrâneo Oriental). Trata-se de uma fé vinculada à luta histórica pela terra (com a sedentarização deflagrada pela agricultura) e à experiência de Deus como uma “Força dos Céus” que promete a “terra onde corre leite e mel” e faz aliança para justiçar o povo e a pessoa que cumpre a sua lei de misericórdia: no Dia de sua Ira, então, Deus virá julgar os vivos e os mortos – que terão a sua “carne” pessoal ressuscitada. Mas os judeus celebram a Páscoa mais como a libertação do Egito, os cristãos como a liberdade trazida pela ressurreição de Jesus, e os muçulmanos nem a festejam propriamente: pois nas suas escrituras Deus livrou o profeta Jesus da própria cruz e todos devem aguardar a ressurreição no fim dos tempos.

Páscoa é “passagem”. O que isso quer dizer para os cristãos?

As escrituras cristãs ensinam que a pregação do profeta Jesus sobre o “Governo de Deus” e o seu cuidado com os marginalizados desagradaram autoridades religiosas, que o entregaram para ser morto pela força de ocupação romana na Palestina. Foi morto na cruz em uma sexta-feira, durante a preparação para a festa de Pessach e, na madrugada do domingo, suas discípulas descobriram que ele havia passado para outro estado de vida. Seus seguidores o experimentaram como ressuscitado em seu meio, quando partilhavam o pão e a vida, e por isso deram-lhe o título de Cristo (Ungido, em grego). Jesus Cristo é o novo cordeiro da Páscoa, que entregou sua vida por todas as pessoas, libertando-as do fechamento em si e da morte, permitindo-lhes passar para outro nível de liberdade. Ali, na esquina poluída, está ele, e nos olha: naquela prisão, hospital ou favela. Onde a carne sofre, aí está o Cristo, crucificado. Onde a carne ama, cuida e se relaciona, aí está o Cristo, glorificado.

Autor: Adolfo Perez Esquivel

Que tipo de comportamento esse período inspira nos cristãos?

Para os cristãos, Jesus de Nazaré venceu a morte no Domingo de Páscoa, depois de ser entregue por religiosos do seu tempo à crucificação dos romanos. Mas o sentido dessa experiência pode ser interpretado de várias formas na vida das pessoas. Ressurreição é muito mais que reanimar um cadáver para a vida anterior. É a plena concretização das virtualidades presentes no ser humano, diz respeito à aposta na possibilidade de se viver mais e melhor. A morte, nas suas mil faces, transforma-se então em metamorfose para um modo de ser em plenitude. Ao morrer, deixamos para trás um cadáver, um casulo que continha a crisálida. Cai o casulo e irrompe a borboleta, a vida, em sua inteira identidade: é a ressurreição.

 

Gilbraz Aragão, professor da UNICAP, coordenador do Observatório das Religiões (www.unicap.br/observatorio2)

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