Hoje o Estatuto da Criança e do Adolescente faz 30 anos!
Que ele permaneça vivo e fortalecido no Brasil. À Luta!
30 anos do ECA! 30 anos do Cendhec!
Nota dedicada à bebê do Povo Pipipã, de Floresta (PE), morta pela Covid-19 e a Miguel, morto pelo racismo estrutural das entranhas desse país.
No dia 13 de julho de 1990, no Brasil, foi promulgado o Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA[1], que tem a Proteção Integral como doutrina norteadora, considerando todas as crianças e adolescentes como sujeitos de direitos; pessoas em condição peculiar de desenvolvimento e com prioridade absoluta.
O ECA se baseia no artigo 227 da Constituição Brasileira de 1988:
É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
O Estatuto também está fundamentado na Convenção Internacional do Direito da Criança, que foi adotada pela Assembleia Geral da ONU em 1989, e ratificada pelo Estado brasileiro em 1990.
Os Estados Partes comprometem-se a respeitar e a garantir os direitos previstos na presente Convenção a todas as crianças que se encontrem sujeitas à sua jurisdição, sem discriminação alguma, independentemente de qualquer consideração de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ou outra da criança, de seus pais ou representantes legais, ou da sua origem nacional, étnica ou social, fortuna, incapacidade, nascimento ou de qualquer outra situação (Convenção Internacional da Criança, artigo 2º, inciso 1).
Ao longo desses 30 anos de Estatuto da Criança e do Adolescente, e 32 anos da Constituição Federal, o Brasil vivenciou avanços importantes. A exemplo da redução da mortalidade infantil, da universalização do direito à educação e à saúde, com números gradativos de crianças matriculadas na escola e com direito à atenção, vida e saúde, desde o pré-natal. No entanto, embora seja uma legislação com 30 anos de existência, reconhecida, internacionalmente, como avançada na garantia de direitos de crianças e adolescentes, e com significativos avanços no país, há ainda inúmeros desafios para a sua efetivação plena.
Em tempos considerados “normais”, a agudização da política neoliberal nos países periféricos já desenhava, no Brasil, os entraves e dificuldades para efetivação plena do Estatuto. Mesmo com avanços, já eram muitos os desafios existentes no campo da educação, da saúde, da assistência social, da cultura, da segurança pública e de tantas outras políticas que atendem à garantia dos direitos da criança e do adolescente.
A partir da ascensão de governos autoritários de extrema direita no mundo, a exemplo do atual governo brasileiro – sucessivo a um golpe de Estado – a necropolítica se escancara no discurso e na prática de nossos representantes, nos diversos poderes. A incitação à tortura volta à tona, sem pudor. A Emenda Constitucional 95, da morte, corta e congela na carne de grande parte da população e das crianças e adolescentes brasileiras.
Articulação e enfrentamento já se faziam urgente e necessário, diante de tamanho retrocesso. Então, chegou 2020 e, junto, a pandemia mundial que acelerou a política de morte e projetou a real dimensão da desigualdade, racismo, machismo e demais violências existentes no Brasil. As crianças, adolescentes e jovens são atingidos por essas múltiplas violências, sobretudo quando são pobres, pretos(as), meninas, indígenas, quilombolas, de religião de matriz afro-indígena, ciganos(as), assentados(as), trabalhadores(as) infantis.
As crianças e adolescentes não são o público mais afetado diretamente pela Covid-19, mas, segundo a Unicef[2], são quem mais sofrem de maneira indireta. O isolamento social e o fechamento das escolas estão afetando ainda mais a educação e a saúde mental, além do acesso aos serviços básicos de saúde e assistência. Em meio ao isolamento, há aumento dos riscos de maus-tratos, violência doméstica e/ou sexual. Sendo a perspectiva do aumento da pobreza durante e no pós pandemia, indicador de crianças e adolescentes ficarem ainda mais expostas. Nesse contexto, a história do menino Miguel [3], em Recife, é uma das mais simbólicas dessa violência, capaz de atingir fatalmente uma criança.
O Centro Dom Helder Camara de Estudos e Ação Social (Cendhec) – Centro de Defesa dos Direitos Humanos – também completou 30 anos de luta reafirmando seu compromisso na defesa dos Direitos e do Estatuto da Criança e do Adolescente. Precisamos continuar fundamentados na militância pelos Direitos Humanos, nesse atual contexto e no tempo de pós pandemia, que se anuncia tanto quanto cruel, quando os desafios serão ainda maiores. Faz-se imperativo redobrarmos nossos esforços para a garantia dos direitos de crianças e adolescentes, em especial àqueles(as) supra citados(as), cuja identidade e/ou condição realçam ainda mais a violência histórica e cotidiana que vivem.
Seguiremos inspirados (as) em Dom Helder Camara, acreditando no poder da sociedade civil articulada e organizada, para efetividade do controle social das políticas públicas e da construção de uma sociedade com princípio democrático-popular, na qual crianças e adolescentes estejam verdadeiramente protegidos(as). Parabéns ao Estatuto!
Em Recife (PE), hoje (13), será realizado um ato no qual pediremos justiça por Miguel! Que dia! Para que não esqueçamos 13 de julho, o Estatuto e a defesa intransigente dos Direitos de Crianças e Adolescentes.
#JustiçaPorMiguel
1 Lei nº 8.069 Estatuto da Criança e do Adolescente.
2 https://www.unicef.org/brazil/