Portal de Conferências da Unicap, v. 2, n. XXIII, 2021: Semana de Estudos Linguísticos e Literários da Unicap

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Inovações e rupturas linguísticas: linguagem neutra e os discursos que a (in)formam
Dandara Oliveira, Alessa Francine Silva

Última alteração: 2021-10-21

Resumo


Partindo de uma visão de língua enquanto prática social situada histórica e culturalmente (Freitas, 2015; Bagno, 2011) e como instrumento de ação política (Abbou, 2011; Greco, 2019), este trabalho tematiza  o fenômeno conhecido como linguagem neutra de gênero e sua relação com o ativismo linguístico de pessoas não-binárias no contexto brasileiro. Nesse sentido, objetivamos estudar as ideologias linguísticas (Gal and Irvine 2019) que (in)formam  as práticas e os discursos sobre neutralização de gênero gramatical no português brasileiro — intercambiavelmente denominados linguagem inclusiva, não-binária, neutra ou neoliguagem —, assim como as inovações e rupturas gramaticais, políticas e identitárias advindas de tais processos. Aliada a uma perspectiva qualitativa e interpretativista de cunho etnográfico (Moita Lopes, 1994; Garcez e Schulz, 2015), nossa análise busca investigar aspectos extralinguísticos, como questões históricas, políticas e sociais. Nosso corpus é composto por 1500 postagens e mais de trinta mil comentários e interações em diferentes mídias sociais, como Facebook, Twitter e Medium. As investigações desenvolvidas apontam que discursos em torno da linguagem neutra demonstram que esta funciona como um catalisador de discursos racistas, classistas, capacitistas, sexistas e  transfóbicos, fornecendo, assim, uma fotografia do momento sócio-histórico atual. Ao mesmo tempo em que assegura relativa unidade linguística, a língua portuguesa é um aspecto fundamental de discriminação (Faraco, 2018). Dessa forma, conclui-se que a língua é um espaço simbólico de disputas de poder e que muitos grupos, a partir de práticas de higiene verbal (Cameron, 2012), fazem o movimento de atacar a linguagem neutra reproduzindo  argumentos que visam um purismo linguístico.

Palavras-chave


Linguagem inclusiva; Ativismo linguístico; Linguística aplicada.

Referências


ABBOU, Julie. “Double gender marking in French: a linguistic practice of antisexism”. In: Current Issues in Language Planning. London: Routledge, Taylor & Francis Group, 2011.vol 12, no 1,  p. 55-75.

BAGNO, Marcos. “O que é uma língua? Imaginário, ciência e hipóstase”. In: Lagares Xoán; Bagno, M. (org.), Políticas da norma e conflitos linguísticos. São Paulo: Parábola, 2013, pp. 355-387

CAMERON, Deborah. Verbal hygiene. London: Routledge, 2012.

FARACO, Carlos Alberto. Aspectos da História Socioeconômica e Linguística do Brasil. Diadorin, Rio de Janeiro, vol.20 - Especial, p.23-52, 2018.

FREITAS, Monique Amaral de. “O x da questão, gênero neutro como ato ético e estético”. In: Palavras e contra palavras: cortejando a vida na estética do cotidiano. São Carlos: Pedro & João Editores, 2015. p. 159-170.

GAL, Susan; IRVINE, Judith. Signs of difference: Language and Ideology in Social Life. Cambridge: Cambridge University Press, 2019.

GARCEZ, Pedro de Moraes; SCHULZ, Lia. “Olhares circunstanciados: etnografia da linguagem e pesquisa em Linguística Aplicada no Brasil”. D.E.L.T.A vol. 31, 2015, p.1-34.

GRECO, Luca. “Linguistic uprisings: Toward a grammar of emancipation”. In: H-France Salon, 2019. vol. 11, n. 14, p. 1-13.

MOITA LOPES, , Luiz .Paulo. “Pesquisa interpretativista em Linguística Aplicada: a linguagem como condição e solução”. D.E.L.T.A vol.10, n.2, 1994 p.329-338.