Por: Juliano Domingues

O que se viu na TV brasileira na semana do orgulho LGBTQIA+ não é algo trivial. A reação de telespectadores e patrocinadores ao apresentador Sikêra Júnior é um belo exemplo de como a pressão econômica pode favorecer o controle social da mídia contra discursos de ódio.

O apresentador de referiu de modo agressivo à população LGBTQIA+ em seu programa da RedeTV!, na sexta-feira 25, ao comentar uma publicidade da Burguer King. Em reação, o grupo ativista Sleeping Giants lançou no Twitter a campanha #DesmonetizaSikera e o Ministério Público Federal (MPF) ajuizou uma ação de indenização por danos morais coletivos. A pressão nas redes levou marcas a anunciar o fim do patrocínio ao programa, dentre elas Ford, MRV, TIM e Kicaldo.

Fatos como esse não são novidade. Preconceitos são disseminados e legitimados por meio das mais diferentes formas de comunicação, da conversação espontânea à estratégia planejada da mídia. Durante anos, programas de TV estruturaram e reproduziram discursos de representação negativa de minorias sem qualquer constrangimento, por uma razão simples: a exaltação do grotesco e o desprezo pelos direitos humanos passaram a guiar parte das emissoras em busca de audiência.

Isso levou a sociedade civil a desenvolver estratégias de fiscalização e denúncia de casos de desrespeito a direitos humanos na mídia. O marco disso é a seminal campanha “Quem financia a baixaria é contra a cidadania”, ainda nos anos 2000, à qual se somaram várias iniciativas, invariavelmente com resultados aquém do esperado. O episódio da última semana, todavia, sugere algo de novo – e positivo – no ar.

A interação pelas redes digitais canaliza em escala sentimentos de indivíduos até então dispersos no tempo e no espaço numa velocidade espetacular. Quando isso ocorre a ponto de tornar pauta um dos assuntos mais comentados no Twitter, vê-se a operação de um mecanismo causal cujo efeito é imediato. A campanha #DesmonetizaSikera, por exemplo, resultou em debandada de patrocinadores como estratégia de autopreservação de imagem diante da pauta negativa.

A teoria social nos ensina que o comportamento costuma variar em função das circunstâncias. Foi o que ocorreu: o ativismo digital aumentou o custo econômico do cinismo de determinadas empresas diante da violação de direitos humanos e promoveu o controle social da mídia. A mudança pode até demorar, mas o novo sempre vem.

Juliano Domingues é Coordenador da Cátedra Luiz Beltrão de Comunicação da Unicap, professor do Curso de Jornalismo e do Mestrado em Indústrias Criativas