Por Conceição Tomaz

Marcelo Diniz ( acervo pessoal)

Marcelo Diniz, 35, aluno do 3.º período do curso de Jornalismo, é cria da revolução. Nasceu na periferia do Recife e foi criado nas comunidades do populoso bairro de Casa Amarela, na Zona Norte do Recife. Filho de uma mulher maranhense e preta. “Sou filho de Maria Cristina Serra Diniz, uma entre tantas Marias que tiveram de sair pelo mundo em busca de meios de sobrevivência para criar seus filhos e tentar construir um futuro melhor para eles”, diz emocionado.

A mãe é uma referência forte na vida de Marcelo, hoje pai de três filhos. “Dona Cristiana, como era conhecida, foi costureira a vida toda. Veio de São Luís do Maranhão trazendo a mais velha de três filhos que já tinha, e obteve trabalho junto a algumas boutiques na capital pernambucana. Mas esse momentâneo sucesso seria interrompido quando se envolveu com meu pai, cujo nome prefiro não citar. Ele não assumiu a paternidade e a vida da minha mãe tornou-se muito mais difícil, num tempo em que creches ainda não eram uma política pública tão presente no cotidiano das mulheres pretas e periféricas”, relata

Com o abandono paterno e as dificuldades financeiras, Marcelo cresceu entre mudanças constantes de casa e alimentação escassa. Aprendeu a ler ainda em tenra idade, aos 3 anos, e aos 8 já usava sua aprendizagem precoce para fazer bicos para ajudar em casa. “Saía da escola, pegava uma bicicleta que só tinha um pedal e ia para o banco de feira de “Seu Zé do Bolo”, em Casa Amarela, fazer entregas de bolos de bacia, broas, bolos de macaxeira e outros, pelos bares da região. No começo, fazia isso escondido da minha mãe e da minha irmã. “Muitas vezes elas iam à feira me procurar, pedindo para anunciarem meu nome na rádio comercial, pedindo que os locutores me chamassem pelos alto-falantes instalados nos postes do bairro”, relembra ele. Diniz ainda manteve essa rotina de trabalho e estudos, a contragosto materno, até os 11 anos, quando a rotina da escola exigia mais dedicação e essa era a condição com sua mãe: os bicos não atrapalharem os estudos.

As condições da infância com a família parece ter despertado o gosto pela luta por uma vida melhor e, aos 12 anos, Marcelo começou a atuar em movimentos estudantis. “Fui estudar na Escola Estadual Dom Bosco, em Casa Amarela, em 1999, e a escola estava pegando fogo porque a comunidade queria eleger democraticamente a gestão escolar, então puxaram uma assembleia e fizemos a eleição na teimosia. A eleição foi cancelada, mas daí para frente eu sempre estava participando do Grêmio, mobilizando por uma alimentação escolar de mais qualidade e levando o pessoal para as passeatas”, conta. “Essa relação foi ficando mais intensa, então fui cumprindo diversas tarefas na União Metropolitana de Estudantes Secundaristas: Diretor da regional Norte, depois Diretor para Escolas Públicas, Primeiro Secretário e Secretário Geral”, completa Marcelo.

Em 2005, Marcelo mudou-se para São Paulo, eleito Diretor de Relações Internacionais da União Brasileira de Estudantes Secundaristas e obteve diversas conquistas no âmbito estudantil. “Conquistamos a obrigatoriedade do ensino de Filosofia e de Sociologia no Ensino Médio e garantimos a aprovação do FUNDEB. Voltei para Recife em 2007, entrei para a Universidade anos depois, no curso de Direito e fui Secretário Geral da União de Estudantes de Pernambuco (UEP – Cândido Pinto), além de participar de dois Diretórios Acadêmicos, o de Direito, da ASCES-UNITA e o de Comunicação Social, no Centro Acadêmico do Agreste, da UFPE”, relata o estudante. Marcelo também atua no movimento negro, e atualmente é Diretor de Comunicação da União de Negras e Negros pela Igualdade (UNEGRO-PE).

A paixão pelo Jornalismo nasceu, ele acredita, desde muito cedo, aos 6 anos, quando perdia a hora de voltar a aula após o recreio. “Às vezes a professora do primário tinha que mandar me chamar, porque me distraía lendo o jornal na biblioteca da escola. Acredito que a paixão pelo Jornalismo vem daí”, explica Diniz.

Para Marcelo, há muitas dificuldades em estudar numa universidade, principalmente para quem veio de escola pública. “O Jornalismo e o Direito são duas paixões sempre presentes em mim! Mas tem a dificuldade em conciliar trabalho (num tempo em que ele está cada vez mais difícil) e o curso. Mesmo com alguma experiência na área da comunicação (fui Coordenador do Gabinete Digital da Prefeitura de Caruaru e também já tive um blog), não podemos dizer que seja uma área onde as vagas estejam em expansão e, além disso, é preciso concluir o curso para acessar oportunidades melhores”, conclui.

“Muitas vezes eu assisto à aula no metrô, (quando a conexão com a internet deixa), ou passo a madrugada acordado para poder assistir às aulas que perdi ou concluir atividades. Tem hora que a cabeça cansa de tanta tela, mas sigo resistindo”, finaliza Marcelo.