Portal de Conferências da Unicap, IV Seminário Internacional Pós-Colonialismo, Pensamento Descolonial e Direitos Humanos na América Latina

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A propriedade privada como um direito humano: reflexões a luz do pesamento descolonial sobre a positivação do Direito a propriedade privada na Convenção Americana de Direitos Humanos e suas insuficiências
Raysa Alves

Última alteração: 2019-07-09

Resumo


A positivação do direito à propriedade privada como um direito humano encontra sua fundamentação nos pressupostos filosóficos da cultura ocidental europeia moderna dos quais destacam-se, dentre outros expoentes, John Locke e Hegel. Relevante destaque merece Hegel, ao consolidar a propriedade como um direito fundamental do homem, representando a encarnação mais elevada de sua própria liberdade. Neste feito, a propriedade privada consolida-se como uma categoria integrante da noção de boa vida do Ocidente, requerendo a positivação de sua proteção e garantia. Nas Américas, consolidou-se como um direito humanos com o advento do Artigo 21 da CADH, o qual tutela a propriedade privada, que é o direito ao uso e gozo de bens dos indivíduos. Apesar disto, a relação com terra e os processos de territorialização tecidos pela diversidade de povos habitantes das américas, de matrizes culturais não ocidental, apontam para os limites da categoria “propriedade privada”, ao descortinar aos olhos da lógica da modernidade/colonialidade experiências pautadas em outros usos e costumes relacionados a forma relacionar-se com a terra, vale ressaltar, profundamente distintas da lógica de apropriação privada centrada no indivíduo como sujeito de direitos. Este descortinar é constatável mediante a análise da jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos (CorteIDH), que nos casos envolvendo a proteção dos direitos territoriais de povos indígenas e comunidades afrodescendentes, constatou a inadequação da categoria “propriedade privada”, (re)pensando a proteção de direitos territoriais desde sujeitos pela categoria “propriedade comunal” à qual não se faz menção no texto da CADH. Assim, a partir dos pressupostos relacionados à matriz teórica descolonial de conhecimento, a interculturalidade configura-se como uma filosofia crítico-cultural, que se apresenta tanto como um elemento necessário para estabelecer um discurso de direitos humanos a partir das realidades plurais latino-americanas, como para estabelecer um diálogo equitativo entre as diferentes culturas, sem estabelecer o predomínio de uma sobre a outra. Diante disso, o principal problema desta pesquisa consiste em analisar em que medida a interculturalidade pode ser tida como uma possibilidade para a evolução da proteção da proteção das territorialidades dos povos americanos cujos modos de vida não se expressam pelas categorias cunhadas no seio da lógica cultural ocidental. O problema parte da hipótese de que se a interculturalidade é capaz de propiciar o diálogo intercultural, desmantelando a lógica-colonial moderna que é estabelecida não apenas em nível político (poder), mas também epistêmico (saber) e ontológico (ser), então é possível considerar a interculturalidade como um elemento substancial à uma proteção diferenciada dos direitos territoriais, para além das insuficiências da noção de propriedade privada, que limita a interpretação destes direitos ao conteúdo do Artigo 21 da CADH. Esta análise será realizada a partir do método hipotético dedutivo, meio de investigação bibliográfica e documental, que englobe a revisão da literatura nacional e internacional, com foco nas investigações latino-americanas acerca dos direitos humanos e das transformações de seu discurso a partir da perspectiva intercultural.