Portal de Conferências da Unicap, IV Seminário Internacional Pós-Colonialismo, Pensamento Descolonial e Direitos Humanos na América Latina

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Simbolismo Penal e o Estado de Coisas Inconstitucional: O “Pacote Anticrime” e a vingança Penal Estatal.
Ana Beatriz Eufrauzino de Araújo, Andrea Nunes Melo, João Eduardo Cândido dos Santos

Última alteração: 2019-07-13

Resumo


Na ideia clássica do Direito Penal, através da vingança, o perpetrador da violência deverá sofrer alguma perda para que haja a compensação pelos danos sofridos, esse prejuízo se dará pela aplicação de uma sanção penal, que na maioria das vezes deságua na perda da liberdade ou de direitos. Contudo, reiteradamente esse sentimento de vingança penal acaba por gerar diversas violações de direitos e garantias fundamentais dentro do que se considera um Estado Democrático de Direito. Quando um Estado se encontra diante dessas violações sistêmicas, podemos dizer que ali se configura um Estado de Coisas Inconstitucional, onde as violações às garantias fundamentais e a quebra dos parâmetros constitucionais de uma nação ocorrem sistematicamente, e muitas vezes com a lei respaldando essa ruptura democrática. O Supremo Tribunal Federal já reconheceu que o sistema penal Brasileiro, em especial o sistema carcerário, vive um Estado de Coisas Inconstitucional constante, sendo as penas privativas de liberdade aplicadas vistas como reiteradas violações às garantias constitucionais. A omissão das autoridades em não cumprir suas responsabilidades para a manutenção do sistema carcerário apenas promovem essas violações. No entanto, a existência de um Estado de Coisas Inconstitucional não se configura apenas pela omissão do Poder Público frente às violações de direitos fundamentais, mas também quando esse próprio Estado, através de suas atribuições, acaba por criar um ambiente propício para a consolidação da Inconstitucionalidade de um sistema. Isso ocorre notadamente quando, usando de leis penais emergenciais, carregadas de simbolismos criminalísticos, a organização Estatal acaba por introduzir um instrumento que de vazão para a criminalização desenfreada e, consequentemente, o encarceramento em massa. É notável que leis penais, quando formuladas não observando os parâmetros constitucionais e teoricidades do Direito, mas levando em consideração o clamor social e midiático, acabam por incorrer no chamado simbolismo penal. Uma lei, quando apenas um instrumento simbólico, é insuficiente para suprir os elementos que levaram a sua criação, quando não raramente, é inconstitucional. O chamado “pacote anticrime”, apresentado pelo Ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, consiste em um anteprojeto de lei que propõe a alteração de catorze normas em vigor no país, sob a premissa de combater aquilo que o referido Ministro classifica como o “mal” que deve ser extirpado para o bem da sociedade: a corrupção, o crime organizado e os crimes violentos. O presente artigo vem a discutir como as propostas trazidas pelo anteprojeto apresentado podem configurar o instrumento máximo de consolidação de uma quebra sistêmica de direitos. Observa-se que, carregado de uma ideia de encarceramento como única solução para a criminalidade, bem como a normatização do excesso da legítima defesa para agentes de segurança pública, o projeto do então ministro vem a violar precipuamente diversas garantias fundamentais. Com uma visão do direito penal do inimigo, ignora a força ressocializadora que deveria ser inerente à aplicação da lei penal no Brasil, engrandece uma violência sistêmica, e fortalece um Estado de Coisas Inconstitucional dentro do sistema penal Brasileiro.


Palavras-chave


Direito Penal; Simbolismo Penal; Estado de Coisas Inconstitucional; Criminologia; Direitos Humanos