Portal de Conferências da Unicap, IV Seminário Internacional Pós-Colonialismo, Pensamento Descolonial e Direitos Humanos na América Latina

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O Lusotropicalismo como formador da identidade pós-colonial brasileira
Larissa Ramina, Caio Soares

Última alteração: 2019-07-10

Resumo


A presente análise insere-se no âmbito das características da identidade cultural brasileira em meio ao processo descolonial/decolonial na América Latina, contextualizando o lusotropicalismo como processo responsável por afastar o Brasil da cultura observada em outros movimentos emancipatórios na região. Por meio das perspectivas abertas pelos autores inseridos no movimento conhecido como “Abordagens do Terceiro Mundo ao Direito Internacional”, identificadas pela sigla em inglês TWAIL, como referência à “Third World Approaches to International Law”, o processo descolonial/decolonial será observado a partir da perspectiva não-hegemônica do Sul-Global. Nesse sentido, constata-se que o Brasil incorporou o papel de exemplo do luso poder civilizador e adotou valores sociais que marcaram profundamente a sua identidade cultural, afastando-o da cultura emancipatória de outros países latino-americanos e, por fim, manifestando resultados até os dias atuais. Neste contexto, o lusotropicalismo consistiria no estudo de exemplos da colonização portuguesa, caracterizando-se pela busca de traços comuns da experiência colonizadora. Gilberto Freyre, um dos mais eminentes polímatas brasileiros do século XX e autor de Casa Grande & Senzala, desenvolveu uma série de estudos que retratam o relacionamento e a estratégia colonial entre Portugal e o Brasil. Enfaticamente durante o período das descolonizações, o lusotropicalismo retrata os alicerces da identidade cultural do povo brasileiro, uma “eternidade sempre presente”, como uma realidade que tende ao místico e ao simbólico, resgata e mantém vivo o passado da colonização portuguesa e da heroica saga lusitana, declarando-os presentes e projetando-os ao futuro – afastando o Brasil da emancipação pura e simples, vinculando sua identidade à sua origem. O resultado é uma formulação teórica horizontal, a qual passa por todos os campos sociais e captura os pilares de uma “civilização luso-tropical”: o Brasil teve sua imagem instrumentalizada, em um primeiro momento, a fim de comprovar o sucesso do colonizador português em proporcionar a construção de uma nação industrializada, moderna e avançada, mistificando uma imagem irreal, cristalizando a desigualdade e levando à perpetuação de uma realidade cruel. Em um segundo momento, o Brasil passa a significar a concórdia racial, deslocando o centro das preocupações do público para o privado e defendendo o elogio à mestiçagem. Revolucionou, assim, a forma como o brasileiro via a si próprio, “transformando o que antes era acanhamento, demérito e enxovalho em dignidade, brio e orgulho”. Finalmente, o Brasil tornou-se uma metáfora para o “o modo português de estar no mundo” ou, ainda, um eufemismo para a ação colonizadora de Portugal, auxiliando suas investidas de contenção de outros movimentos descoloniais no ultramar. O foco deste trabalho, portanto, será a ilustração do peculiar caso do Brasil enquanto ex-colônia portuguesa, diplomaticamente (e voluntariamente) isolado de movimentos descoloniais, a exemplo do Movimento dos Não-Alinhados de Bandung; envolvido, mesmo após sua independência, na política externa Portuguesa; afastado da cultura latino-americana; e, por fim, inebriado pela construção de sua própria identidade nacional miscigenada, opondo-o ao fluxo de outros movimentos descoloniais/decoloniais.