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“NI UNA MENOS”: MULHERES EM LUTA PELA DESCOLONIZAÇÃO
Última alteração: 2019-07-09
Resumo
O presente artigo contextualiza a intervenção política “Ni una menos”, que é hoje parte importante da ação do movimento feminista na América Latina, e se configura como um processo mobilizador das mulheres em defesa dos direitos humanos. O feminismo tem construído uma trajetória de forte incidência social, sobretudo nos anos 1960, quando despontou como pensamento crítico e projeto político, no bojo dos segmentos da sociedade civil ditos “marginalizados”, a exemplo dos grupos étnicos e de negros. Esses grupos situam-se entre os povos latino-americanos submetidos a colonizações devastadoras, que perpetuaram sucessivas investidas de policiamento das sexualidades das mulheres. É um processo que está imbricado à expansão do sistema capitalista no mundo, e vem produzindo consequências sérias e cíclicas nos países latino-americanos e suas populações, retratadas em aculturação, exclusão social, desemprego, pobreza, miséria, desagregação social, baixa politização e desarticulação política. Este trabalho, portanto, observa como o movimento feminista luta para vencer esse abismo histórico em busca da emancipação das mulheres, dedicando-se a analisar, em especial, o movimento disruptivo “Ni una menos”, que teve início na Argentina, em 2015, mas que se espalhou por toda a América Latina como uma onda de resistência ao extermínio de mulheres. Ao analisar o movimento e sua denúncia pública dos altos índices de feminicídio, foi possível perceber a persistência dos traços da dominação patriarcal e pós-colonialista no século XXI, com a reprodução da opressão e a violência de um sujeito “universal” macho, branco e heterossexual, que ainda persiste em tentar calar as vozes das mulheres em todo o continente. O estudo adota como base a revisão bibliográfica acerca de categorias como colonialidade, colonialismo e pensamento descolonial, buscando referências em autores latino-americanos, a exemplo do peruano Aníbal Quijano (2005), um dos principais pesquisadores que compõem a corrente do pensamento descolonial, para o qual o padrão de poder mundial levado a cabo pelo eurocentrismo atingiu vários setores das populações do planeta. Nas regiões que passaram por processos de colonização, esse novo padrão implicou em um processo de “reidentificação histórica”: a partir da Europa foram atribuídas a eles novas identidades geoculturais. Também contribui para a reflexões em tela o semiótico argentino, Walter D. Mignolo (2008), que percorre sobre a concepção de “novo mundo” como invenção europeia-cristã que teve como agentes as monarquias e depois os estados-nacionais do Atlântico. Um processo de descolonização não poderia ser simples, pois são as relações intersubjetivas que mais são afetadas pelos processos de dominação (QUIJANO, 2005). Nessa perspectiva, a experiência do movimento “Ni una menos” aporta mobilizações de repercussão expressiva na sociedade, bem como a adoção e o reforço de novas narrativas que traduzem um lugar de emancipação para a mulher, na tentativa de abolir padrões colonizadores sobre o gênero feminino. Assim, à luz do estudo de caso desse movimento feminista, pretende-se também abordar questões teóricas sobre machismo, patriarcalismo, feminicídio e misoginia, por meio de autoras como Ellen Riordan (2004), Rachel Moreno (2009), Mercedes Lima (2009), Terezinha Vicente (2009) e Maria Betânia Ávila (2001).