Portal de Conferências da Unicap, IV Seminário Internacional Pós-Colonialismo, Pensamento Descolonial e Direitos Humanos na América Latina

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Necrotransfobia: políticas de extermínio na periferia do capitalismo brasileiro
Victor Hugo Agapito, Yordanna Lara Pereira Rêgo

Última alteração: 2019-07-09

Resumo


Sabe-se que historicamente pessoas transexuais têm suas existências sociais e físicas ceifadas pela sociedade de maneira violenta e indiferente. Judith Butler identifica que essa violência vivenciada pelas nomeadas “minorias” possui caráter estrutural. Ser portador de uma vida passível de luto, ser reconhecido como uma pessoa, ter sua cidadania reconhecida não é para todos, é necessário, então, compreender como esse enquadramento se constrói, para que uma política de afirmação da vida seja possível. Esse contexto se alicerça no que Mbembe (2015) chamou de “alterocídio”, que consiste em “construir o outro não como análogo a si, mas como objeto intrinsecamente ameaçador, hostil, do qual é preciso proteger-se, ou destruir”. O objetivo é basicamente retirar desses indivíduos a própria condição de humanidade, visto que, tendo o seu reconhecimento enquanto pessoas sujeitas de direito relativizado, são transfiguradas em vidas nuas, a exemplo os judeus que foram associados aos ratos, a comunidade gay ao veado, a comunidade lésbica a sapos e a comunidade negra a macacos e baratas como visto no caso do genocídio dos tutsis em Ruanda. A forma estrutural que essa violência acontece nos leva a questionar o lugar do Estado na manutenção desse status quo. Dessa maneira, o objetivo do trabalho é propor um tensionamento do que se entende como transfobia, diante do arcabouço analítico do conceito cunhado pelo historiador decolonial, camaronês, Achille Mbembe, de “Necropolítica” e como esse mecanismo tem se materializado na realidade dessa minoria. Com o intuito de demonstrar como a ascendência das “identidades trans” no Brasil, muitas vezes pautada a partir de um pensamento colonizador se liga à continuação ou formas renovadas de descartabilidade, na intenção de gestão e domesticação das diferenças. É possível visualizar que ao cunhar o conceito de necropolítica, um dos intuitos fundamentais de Mbembe consiste em atualizar a crítica social foucaultiana para fenômenos da periferia do capitalismo, em especial aqueles que fazem referência à Biopolítica - construção e produção da vida e da subjetividade ajustadas à forma social capitalista - para Necropolítica, ou seja, uma política focada na produção da morte em larga escala. Sendo assim, a intenção é lançar um olhar mais criterioso, pautado no metiê antropológico, sobre relação entre as políticas sociais cisnormativas, a transfobia e o racismo no processo de produção do não-lugar das pessoas trans na sociedade brasileira.