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Direitos territoriais indígenas e colonialidade: o julgamento da Repercussão Geral do caso Terra Indígena Ibirama La Klãnõ
Última alteração: 2019-07-09
Resumo
Desde o julgamento no STF que confirmou a constitucionalidade da demarcação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol, em 2009, e apesar da inexistência de efeitos vinculantes, processos têm sido ajuizados por diversos atores visando anulação dos atos de demarcação de terras indígenas, muito por conta da tese do marco temporal, mas também com fundamento nas onze condicionantes estabelecidas no acórdão da PET 3388. Casos paradigmáticos são as anulações em 2014 e 2015 da TI Guyraroká, dos Guarani-Kaiowá, e da TI Limão Verde, dos Terena, ambas no Mato Grosso do Sul, oportunidade em que a Segunda Turma do STF negou a participação das comunidades na lide processual e interpretou conceitos como resistência e ocupação tradicional de forma marcadamente etnocêntrica, como a exigência de ajuizamento de demanda possessória pelos indígenas para comprovar a vontade de retorno ao território tomado. Porém, mais recentemente, observa-se uma leve guinada jurisprudencial no que diz respeito à interpretação das teses do marco temporal, do renitente esbulho e da autodeterminação indígena e a consequente participação nos processos: as ACOs 362 e 366 julgadas pelo Plenário em 2017, embora tenham mantido tais conceitos, refletiram um posicionamento mais condizente ao paradigma pluriétnico da Constituição de 1988 e às normas internacionais de proteção dos direitos indígenas. Seguindo esta tendência, em fevereiro de 2019 o STF reconheceu a repercussão geral no Recurso Extraordinário nº 1.017.365/SC, no qual se discute a ocupação tradicional dos índios La Klãnõ sobre parte de uma unidade de conservação do Estado de Santa Catarina, incluída na portaria declaratória que redefiniu os limites da Terra Indígenas Ibirama La Klãnõ. A importância deste verdadeiro leading case, que desta vez irá influenciar formalmente decisões da Justiça Federal em todo o Brasil, está na possibilidade de confirmação do marco temporal e das condicionantes do caso Raposa; na sua modificação interpretativa, mantendo-se bases eurocêntricas sobre os direitos territoriais indígenas; ou mesmo na sua total rejeição, possibilitando um debate sob outras bases epistêmicas. Assim, para além de uma discussão técnico-jurídica, estão em disputa visões de mundo e concepções sobre território, reparação e resistência, cujas contribuições do pensamento descolonial se fazem pertinentes para que uma análise do caso perceba os alcances epistêmicos envolvidos e como os povos indígenas participam desta disputa, judicial e extrajudicialmente, em verdadeira desobediência epistêmica. A partir deste contexto, esta pesquisa, que está em andamento, procura responder a seguinte pergunta: considerando os conceitos de colonialidade do poder e desobediência epistêmica, quais são as teses que estão em jogo no julgamento pelo STF da Repercussão Geral no Recurso Extraordinário nº 1.017.365/SC e suas possíveis consequências jurídicas aos povos indígenas? Como objetivos, pretende-se: a) mapear as discussões que estão em jogo no caso e os posicionamentos dos Ministros nos últimos julgados do STF; b) as formas de participação, discussão e intervenção dos movimentos indígenas e apoiadores – amici curiae, campanhas, retomadas; c) perspectivas futuras sobre os direitos territoriais indígenas a partir do julgamento.
Palavras-chave
Supremo Tribunal Federal; Repercussão Geral; Terra Indígena Ibirama La Klãnõ; Direitos Territoriais Indígenas; Colonialidade.