Última alteração: 2019-07-09
Resumo
Justiça Restaurativa e cultura de paz são temáticas correlatas à proposta de pacificação social. Uma instrumento da outra para viabilizar a composição de conflitos entre personagens que se opõem entre pretensões e resistências. Ensejam a promoção do indivíduo à condição de agente autônomo, responsável e protagonista na resolução dos litígios nos quais se envolve, libertando-o do reducionismo trazido pelas figuraçõesmaniqueístas que induzem ao condicionamento vítima∕ ofensor. A Justiça Restaurativa é poderoso instrumento de humanização na adoção das políticas de proteção ao adolescente preto em conflito com a lei, tendo em vista que as suas práticas promovem a quebra das cadeias de reverberação da violência e dos processos de criminalização, através de mecanismos que ensejam a compreensão da realidade étnica-racial e social do adolescente, a reparação do dano e a reconstrução das relações humanas, compreendendo os componentes emocionais e sociais do conflito, além da dinâmica da sua transformação. Segundo o levantamento do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE), realizado em 2016, 59,08% dos adolescentes e jovens em restrição e privação de liberdade foram considerados de cor parda/preta; na região nordeste, 64,2%; e, em Pernambuco, 75%. Nesse contexto, o adolescente em conflito com a lei deve ser, em homenagem ao princípio do superior interesse da criança, escutado e compreendido pelo Sistema de Justiça, de maneira a construir-se um espaço propício para a resolução dos tensionamentos, como também para a superação da dominação eurocêntrica – propulsora da visão centro-periferia - que apresenta a cultura da população preta periférica como estética inferior e corrobora o imaginário de temor, tornando inviável o diálogo intercultural entre os agentes do sistema de controle social e os adolescentes pretos. Há uma cultura branca, de identidade abstrata, não embasada em dados históricos e políticos concretos, consolidada como intangível, tradicional, limpa e imodificável, ao passo que a preta permanece apartada. Os ideais de bondade, de exemplos a serem seguidos, e de eliminação dos que não se espelham no padrão imposto, mecanismos de difusão colonialista (Herrera, 2006), podem ser transpostos a partir da escuta ativa dos
adolescentes pretos nas práticas restaurativas do Sistema de Justiça. Verifica-se, portanto, que a prática forense apresenta resquícios de práticas menoristas, colonialistas, não aderindo à nova cultura emancipadora. Diante de tal conjuntura, a cultura de paz e a Justiça Restaurativa apresentam instrumentos que promovem a humanização das medidas de atenção ao adolescente preto e marginalizado em conflito com a lei. A abordagem será qualitativa em caráter exploratório, utilizando do método dedutivo para propor observações a partir de uma revisão de literatura, além da verificação de dados obtidos em pesquisas correlatas ao tema. Ao final, propõe que a Justiça Restaurativa – como instrumento da cultura de paz - compreende práticas que viabilizam a autonomia, o protagonismo, a expressão da cultura-comportamento periférico, a reflexão transformadora dos próprios agentes do Sistema de Justiça, e, por fim, a menos importante para o presente estudo, responsabilização dos envolvidos em situações de conflito; de modo que corrobora a efetivação da Doutrina da Proteção Integral no contexto da aplicação das medidas socioeducativas.