Portal de Conferências da Unicap, IV Seminário Internacional Pós-Colonialismo, Pensamento Descolonial e Direitos Humanos na América Latina

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O JONGO ENQUANTO INSTRUMENTO “AFROCENTRALIZADOR”. UM ESTUDO DE CASO
Desirée Rocha Lima

Última alteração: 2019-07-17

Resumo


No Rio de Janeiro, sob ataque constante do Estado, a população favelada e negra é alvo de toda sorte de infortúnios oriundos da criminalização da pobreza e da violência institucional. Os dados do Mapa da Violência de 2017 evidenciam essa realidade.

Neste contexto, sob a vigência da Lei 10.639/2003, urge uma educação antirracista (MUNANGA, 2004), afrocentrada (ASANTI, 1988) e decolonial (WALSH, 2007). C​omo pedagoga e professora da Educação Infantil, busco construir essas práticas desde o início da minha carreira (2009), e ao iniciar os estudos na Especialização em Educação das Relações Étnico-raciais no Ensino Básico (EREREBÁ), no Colégio Pedro II, em 2018, ​passei a refletir e trazer para a escola novas possibilidades teóricas e metodológicas, transformando tais práticas em meu objeto de pesquisa-ação (FRANCO, 2016).

olhar e levar as referências do Jongo da Serrinha para dentro da escola, já que não foi possível levá-los até lá, passei a frequentar as aulas de jongo para adultos, na Casa do Jongo, e observei as aulas de jongo para as crian​ças da comunidade, tendo a oportunidade de vivenciar experiências ímpares com as mulheres que dão v​ida à Casa e ao Jongo da Serrinha, prosseguindo o legado do Mestre Darcy e daVovó Maria Joana: Suelen, Lazir Sinval, Deli Monteiro, Luiza Marmelo, e a jongueira mais antiga da Serrinha, Tia Maria do Jongo​, falecida recentemente.

A partir da pesquisa, é possível afirmar que o Jongo pode ser um instrumento pedagógico para afrocentrar as práticas dentro e fora da escola, na medida em que afirma os africanos/afrodescendentes enquanto agentes históricos e possibilita ver o mundo através de suas lentes, de seus corpos, suas músicas e seus valores, em um processo de conscientização política​: na escola da Zona Sul do Rio de Janeiro, as crianças passaram a ter as lideranças do Jongo da Serri​nha, pessoas negras, como referência em seu processo de aprendizagem, o que pude constatar em seus desenhos e brincadeiras; na Casa do Jongo, a relação das crianças ​negras com o espaço e os adultos fortalecem sua identidade, a relação com o espaço, com a comunidade, e com a ancestralidade. Eles são os herdeiros do Jongo, sabem desse pertencimento, o que garante a luta pelo espaço conquistado, e pela sobrevivência da cultura jongueira na comunidade da Serrinha, e na cidade do Rio de Janeiro.


Destarte, este trabalho analisa um projeto realizado ano passado, em uma turma de educação infantil de uma escola privada, localizada na Zona Sul da cidad​e, voltada para estudantes de classe média alta. Estabelecendo relação comos interesses da tur​ma, eu e as crianças (4 a 6 anos) escolhemos o Jongo da Serrinha, prática artística, cultural e social desenvolvid​a na comunidade da Serrinha, no bairro de Madureira, Zona Norte do Rio de Janeiro, para nortear trabalhos de dança e música. Logo o jongo transbordou essas aulas e os muros da escola, envolvendo as famílias.

Assim, uma pergunta ganhou centralidade: o trabalho pedagógico com o jongo modifica o olhar sobre os corpos negros? De que forma? Para aguçar meu