Portal de Conferências da Unicap, IV Seminário Internacional Pós-Colonialismo, Pensamento Descolonial e Direitos Humanos na América Latina

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Uma hermenêutica da exceção: biodesconstrução da realidade do estado brasileiro na lei antiterror
Manoel Uchôa de Oliveira

Última alteração: 2019-07-13

Resumo


O objetivo desse trabalho é analisar o conceito de terrorismo na recente legislação brasileira a luz do pensamento desconstrutivista de Jacques Derrida. Em virtude das Olimpíadas de 2016, o Brasil sofreu pressões da comunidade internacional capitaneada pelos EUA. A reposta foi promulgar a lei n. 13.260/2016, denominada Lei Antiterrorismo. Diante de uma história recente sem ameaças terroristas, a lei dispõe uma tipificação do terrorismo e da organização criminosa entre outros assuntos. O problema do crime de terrorismo vai além de uma vagueza interpretativa. A legislação serve de ponta de lança para organizar o sistema normativa em função de uma virtual ameaça terrorista. Após o 11 de setembro, a tática de construir um aparato legal de repressão ao terror fez emergir uma onda de terrorismo perpetrada pelos próprios Estados que guerreavam contra o mesmo. No esteio dessa contradição, Jacques Derrida propôs uma leitura a partir da noção de autoimunidade. A nova forma de terror, como afirmada até então, não era uma negação das democracias ocidentais. Ao contrário, foram gestadas por elas como mecanismos em suas guerras. Eram defesas na guerra fria que se voltaram contra os corpos estatais. Assim, o terrorismo era outro modo de terror estatal. Nessa medida, promulgar lei antiterror consiste num recrudescimento do autoritarismo dos governos democráticos. Desse modo, esse trabalho pretende tratar de três elementos problemáticos da concepção da lei n. 13.260/2016. Primeiro, o contexto de sua promulgação. O risco da comunidade internacional considerar o estado brasileiro como Rogue State (Estado Vadio). O Segundo elemento é a tipificação do crime de terrorismo. Os atos ilícitos passam por uma decisão interpretativasobre a vaga expressão “a finalidade de provocar terror social ou generalizado”. O terrorismo não é umcrime definido por seu próprio meio, mas pelo fim que lhe é imputado. Esse expediente é própria força-de- lei que constitui o Direito para Derrida. Por fim, a criminalização dos atos preparatórios é um capítulo à parte. Em tese, apenado mais grave que a tentativa, recorre a um artifício de programação do ilícito pela possibilidade, não pela atualidade. É a marca de um futuro anterior que conduz o tempo do direito de punir. Aliás, a primeira aplicação da lei antiterrorismo, a Operação Hashtag, fez uso do dispositivo da preparação. Finalmente, é preciso compreender a excepcionalidade dessa legislação na medida em que ela deforma constitutivamente o sistema normativo brasileiro. Ela pode ser lida como um índice de uma autoimunidade, isto é, do processo em que o sistema de defesa da sociedade se volta contra ela mesma. Na pretensão de combater o terror, gera mais terror a comunidade. Uma biodesconstrução marca o jogo de remissões em que a violência autorizada pelo direito volta-se contra ele mesmo, ou seja, uma autoimunização. Para dar conta desse trabalho, é preciso desenvolver um estudo do conceito terrorismo na perspectiva dessa lógica autoimunitária desenvolvida pelo filósofo Jacques Derrida. Ao esclarecer o conceito, é preciso toma- lo enquanto instrumento teórico de análise da legislação em seus aspectos dogmáticos e pragmáticos. Tal lei expressa a exceção como regra.


Palavras-chave


Exceção; Biodesconstrução; Terrorismo;