Última alteração: 2019-07-13
Resumo
O Estado Moderno requer o estabelecimento de centralização política sobre um território e uma população e, ao passo que se consolidava a partir de uma “colonização interna”, à América era imposta a dominação colonial, desenvolvendo-se assim a estrutura imperialista e os mecanismos típicos da colonialidade. A noção de Estado-Nação remete à homogeneidade e, para tanto, fazia-se necessária a neutralização do “outro”, sobretudoem contextos como o latino-americano, em que a população local não correspondia ao ideal de modernidade e racionalidade forjado pelo pensamento colonial com a finalidade de justificar o imperialismo europeu. Assim, para garantir de forma célere a homogeneidade necessária ao processo colonial, iniciou-se o extermínio do “outro”. É sob o etos da colonialidade que opera a realidade brasileira, perpetuando os conceitos que tornaram possível a dominação e extermínio dos povos locais. Nesse sentido a independência da colônia não representou a ruptura com o pensamento colonial, mas a rearticulação da colonialidade do poder. Não se pode falar, pois, em democratização das relações, mas em um processo de exclusão de sujeitos que, ainda que maioria, não compunham o Estado-Nação de brancos, sendo o conceito de raça o cerne do processo de dominação do outro. Nesse panorama se edifica o sistema de justiça criminal como um mecanismo de controle e de perpetuação das estruturas trazidas pela colonialidade. Com efeito, o referido sistema criminaliza sujeitos de forma seletiva e estigmatizante, (re)produzindo, através do etiquetamento, as desigualdades de raça, classe e gênero enraizadas na sociedade. Sobre essa estrutura se debruçam estudos como a Criminologia e a Vitimologia Críticas e os Abolicionismos Penais, de modo a explicitar as violações praticadas pelo sistema de justiça criminal, e, eventualmente, apontar caminhos alternativos, como a justiça resrtaurativa. Os conceitos de justiça restaurativa são difusos, no entanto, apesar da profusão conceitual, é possível apresentá-la como um modelo de justiça cujo foco está na efetiva reparação, quando possível, dos danos eventualmente produzidos pela conduta delituosa, recobrando às partes o protagonismo na solução do conflito por meio de um processo informal e dialogal. Ainda que as potencialidades sejam inúmeras, é importante cautela ao introduzir práticas restaurativas no contexto brasileiro, uma vez que as primeiras produções literárias sobre o tema, assim como grande parte das experiências práticas, são estrangeiras, tendo significativo prestígio em países europeus. Com efeito, ainda que o número de pesquisadores, mediadores, entusiastas e incentivos às práticas restaurativas venham aumentando no Brasil, é preciso prudência em um contexto que opera a partir de uma lógica seletiva e excludente, e em que os mecanismos de controle social e instituições funcionam como estruturas que possibilitam e legitimam a manutenção dessa ordem perversa, centrada na colonialidade e seus elementos. Nesse
sentido o presente trabalho busca, através de revisão bibliográfica sobre a temática da justiça restaura e da crítica decolonial, identificar riscos e potencialidades da aplicação de um modelo (alternativo) eurocentrado em um contexto como o latino-americano.